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Estado de Minas PANDEMIA

"Sou o último da fila", diz o produtor de eventos Daniel Zago

Bem-humorado, o convidado do 'Diário da quarentena', fazendo analogia ao filme A lenda, defende a urgência da 'cura' também para a produção de shows e festas


postado em 22/05/2020 04:00


Diário da quarentena

Para não sermos A lenda

Daniel Zago
produtor de eventos

Sou eu. Sim. Eu. E não o Will Smith, que vagava acompanhado do fiel e carismático Sam por uma Nova York sem humanos, com ruas vazias e mato crescendo por todos os lados. No filme, ele era o último humano, mas não estava sozinho. Nem eu. Todo mundo que trabalha com eventos está no mato SEM o cachorro. Tentando sobreviver a uma daquelas catástrofes marcantes da história da humanidade. Apesar de as luzes estarem acesas, o wi-fi funcionando e o Rappi tocando 
a campainha.

Se há pandemia, há quarentena. Há Diário. Há distanciamento. Há preocupações. Há alguma rotina... E há fases.

No luto, as fases são cinco. Esse, eu já tinha vivido e sabia. Na quarentena de Beagá, idem. Mas aqui, como quase toda coisa mineira, elas têm seu jeitin.

"Todo mundo que trabalha com eventos está no mato SEM o cachorro"



A primeira fase é a antecipação. Belo-horizontino não pode ver uma coisa acontecendo “lá fora” que logo já quer ter aqui. Já quer participar. Decretaram lockdown antes do Zema e do Kalil. “Fica em casa!”, gritaram no Instagram. E já foram queimando a largada.

Na sequência, a preparação. Começamos invadindo supermercados e superestimando a importância do papel higiênico e da empadinha congelada. Todo mundo superanimado com a novidade que chegava por aqui. Síndicos se achando presidentes da Anvisa. Discussões sobre como pronunciar a poção mágica... É alcongel, alquingel ou alcogel? Até hoje não sei, como também não sei o que passa na cabeça de quem tentou vender um litro por R$ 76.

Depois, a lua de mel. Aplaudimos os profissionais da saúde pelas janelas e varandas antes mesmo de casos graves aparecerem nas UTIs. Pelo menos valeu pelo reconhecimento antecipado. Trocamos senhas de streamings, mais valiosas do que nudes naquela hora. Nos arriscamos a cozinhar pratos que antes pareciam restritos a funcionários do GNT. Fizemos videoconferências até com gente de quem a gente nem gostava, só pra lembrar por que a gente não gostava. Descobrimos aplicativos es-sen-ci-ais – e na mesma velocidade que os baixamos, nos desencantamos. Essencial, mesmo, só o IMDB.

Aí veio o choque. Os casos começaram. Os boletos chegaram. As séries acabaram. As mortes se multiplicaram. As panelas gritaram. A realidade era dura: escolher entre vidas e empregos. Não conseguir ser produtivo. Aniversário do pai sem abraço. Dia das Mães sem beijo. Notícias ligadas 24 horas por dia. Na TV, elas são tristes; nas redes sociais, fakes. Discussões de facções acabando com grupos de WhatsApp e com a paciência de todos, levando junto a união que um país precisa ter para sair de uma crise que ninguém nunca havia enfrentado antes.

Então, a aceitação. Aceitar que não vamos aprender línguas nem adquirir um MBA ou descobrir se a cloroquina faz mais mal do que bem. Bom, aprendi a fazer feijão. Dei-me por satisfeito. Adquiri alguns quilos, mais cabelos brancos e algum conhecimento. Invejosos dirão que é inútil, mas já acho que todo conhecimento é útil. Não troco minha noite lendo sobre o cerco de Malta por nenhum O poço da Netflix. Descobri por que a libra é esterlina. Só não descobri como irei um dia a Londres com ela custando R$ 7. Mas aceitamos a gravidade da situação.

"Aí veio o choque. Os casos começaram. Os boletos chegaram. As séries acabaram"



Fase atual: aflição. Não sabemos do que vamos viver. Se os amigos vão continuar empregados. Se vai morrer muita gente. Se vamos perder o que conquistamos com sacrifício, mais um tanto de competência, outro de sofrimento e muito suor. Seja na nossa vida ou no nosso estado e cidade.

O que sei é que como profissional de eventos, sou o último da fila. Vai todo mundo voltar à vida seminormal ainda este ano, menos eu. Como o personagem do filme que citei lá no início, seguimos buscando a cura pro nosso setor. Pra nossa vida voltar como era antes, ou quase isso. Pra não vivermos sozinhos num mundo onde há muito mais gente.

Pra não sermos A lenda.


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