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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

A camisa do Cruzeiro é como uma segunda pele para Minas Gerais

Uma nação inteira ostenta no corpo o uniforme azul celeste como aliança de amor eterno. Ela é nosso manto sagrado


10/03/2021 04:00

Na camisa cruzeirense, tão exaltada pelos mineiros, a homenagem a uma de suas maiores torcedoras: nossa eterna Salomé(foto: Divulgação/Cruzeiro - 6/6/20)
Na camisa cruzeirense, tão exaltada pelos mineiros, a homenagem a uma de suas maiores torcedoras: nossa eterna Salomé (foto: Divulgação/Cruzeiro - 6/6/20)


Alguns se apaixonaram por sua beleza. Outros a encaram como representação física da tradição de alegria e títulos. Quase todos a tomaram como laço de identidade com o clube. Uma nação inteira a ostenta no corpo como aliança de amor eterno.

Minha relação com essa senhora aglutina todas essas razões. E mais, carrego por ela uma devoção inquebrável, pois foi gestada num dos períodos mais dramáticos de uma família popular, e ao nascer, acabou por tornar-se o mais lindo capítulo de resistência a um governo ditatorial, ao preconceito de raça e à xenofobia praticada pela oligarquia de Belo Horizonte em meados da década de 1940. Sim, estou prestando aqui meu testemunho com relação à “Camisa do Cruzeiro”.

Durante o período palestrino, nosso uniforme trazia cores referentes à Itália: verde, vermelho e branco. Proibidas pela ditadura de Getulio Vargas, quando esse, por interesse econômico, lançou o Brasil à Segunda Guerra como inimigo de italianos, alemães e japoneses. Assim, o escudo, em 1942, e a camisa, no ano seguinte, passaram a ter as cinco estrelas do Cruzeiro do Sul e a cor azul. Por conta do eufemismo relativo ao céu? Não! O azul veio da resistência! Da luta! Do orgulho à nossa origem de Palestra Italia. Por não abaixar a cabeça ao autoritarismo decidido a nos matar como instituição. O azul da Camisa do Cruzeiro é uma homenagem ao uniforme da Seleção Italiana, a Squadra Azurra.

Manto sagrado. Farda. La camiseta. Segunda pele. Ítem de apreço por Minas Gerais, quando vista em qualquer paragem para além de nossas montanhas. Daqui a dois dias será lançado o modelo comemorativo ao Centenário do Palestra/Cruzeiro. Não sou afeito ao fato publicitário, mas ele me trouxe o gatilho de rabiscar sobre a forma como essa Camisa está aconchegada na minha vida de cruzeirense interiorano.

No álbum de fotografias, num retrato já sem a vivacidade das cores, a mostra no corpo de um menino de cabelo claro, pernas grossas e sorriso fácil, ensaiando seus primeiros passos pelas ruas de calçamento “pé de moleque” da cidade de Mariana.

Ao completar 11 anos, em agosto de 1987, em plena Copa União, corri com o dinheirinho na mão até a Praça da Sé, respirando ofegante e coração disparado. Um medo terrível de a única camisa azul da Adidas, propaganda vermelha da Coca-Cola e número 2 do Balu às costas, ainda disponível para venda, caísse nas mãos de outro menino cruzeirense. Quando cheguei à loja e a vi esticada no cabide, só consegui apontá-la. Chorando de alegria, esperei a vendedora retirá-la e colocá-la nas minhas mãos magrelas.

Veio a década de 1990. O patrocínio ficara branco e a fornecedora era a então desconhecida Finta. Rapidamente, se revelou uma predestinada a nos vestir com o manto sagrado na retomada dos títulos a partir da Supercopa Libertadores de 1991. Uma promoção no jornal prometia o autógrafo de um ídolo a quem comprasse um exemplar. Dias depois, o carteiro me estendeu a caixa. Dentro dela, a número 5 com a assinatura de Ademir.

Vieram barba na minha cara e outros tantos modelos, como as lindas coleções da Puma e da Umbro. Na última, da Adidas, antes de colocá-la em meu corpo velho e gordo, imortalizei às costas o nome e a idade (quando de sua morte) da personagem mais importante de nossa história: Salomé.

Ainda sigo firme na utopia de um dia a diretoria ou o Conselho Paquiderme Deliberativo tornarem obrigatória  – via novo estatuto – a segunda camisa como sendo a do Palestra Italia. Mas esse apreço por nossa origem não diminui meu amor pelo manto azul com cinco estrelas soltas no peito, pois essa combinação está para Minas Gerais assim como as montanhas, a sua culinária, o Clube da Esquina, o Skank, o Grupo Galpão, as cidades barrocas e os demais símbolos de mineiridade facilmente reconhecidos por qualquer pessoa em outro estado ou no estrangeiro.

Se palestrina, azul, branca ou comemorativa ao Centenário, não importa. A Camisa do Cruzeiro tornou-se um patrimônio histórico, artístico e cultural do estado de Minas Gerais.


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