(none) || (none)

Continue lendo os seus conteúdos favoritos.

Assine o Estado de Minas.

price

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e segurança do Google para fazer a assinatura.

Assine agora o Estado de Minas por R$ 9,90/mês. ASSINE AGORA >>

Publicidade

Estado de Minas DEMÉTRIO MAGNOLI

Esses liberais que adoram o Brexit

Liberais britânicos giraram 180 graus e se transformaram em seita anti-Europa%u2019


postado em 02/11/2019 06:00 / atualizado em 02/11/2019 08:23

Boris Johnson, o primeiro-ministro conservador, definiu sua campanha como um levante do
Boris Johnson, o primeiro-ministro conservador, definiu sua campanha como um levante do "povo", pelo Brexit, contra a "elite" (foto: DANIEL LEAL-OLIVAS/AFP %u2013 12/9/19)


Um Reino Unido atordoado vai às urnas em dezembro. Boris Johnson, o primeiro-ministro conservador, definiu sua campanha como um levante do "povo", pelo Brexit, contra a "elite" que impede uma ruptura radical com a União Europeia (UE).

Os liberais britânicos – isto é, a maioria do Partido Conservador e o Partido do Brexit, de Nigel Farage – transformaram-se numa seita anti-Europa. É mais um sintoma da degradação do pensamento liberal.

Os liberais britânicos giraram 180 graus. Entre 1985 e 1994, quando o francês Jacques Delors conduziu as negociações que concluíram a arquitetura do Mercado Único Europeu, eles ocuparam a linha de frente na batalha contra as resistências protecionistas nacionais. Hoje, renegam o que fizeram, entrincheirando-se num nacionalismo de nítida coloração populista.

No Foro da Liberdade, meses atrás, escutei as razões de um fanático do Brexit, o economista Andy Duncan. Ele acusava a então primeira-ministra Theresa May e o líder opositor Jeremy Corbyn de subserviência à "elite europeia". E, desafiando o que sugere o registro histórico, assegurava que Margaret Thatcher teria completado sem demora o serviço do Brexit. Tive, então, que recordar à plateia brasileira o primeiro plebiscito sobre o Brexit, realizado em 1975, quando a conservadora Thatcher defendeu a adesão à Comunidade Europeia e o trabalhista Corbyn adotou posição contrária.

O economista ultraliberal reproduziu os discursos de campanha de Farage, que classificou como seu "herói". Estados grandes representariam, invariavelmente, ameaças às liberdades dos cidadãos. A Europa ficaria melhor se fragmentada em microestados como Andorra, Liechtenstein ou Monaco. A UE seria um superestado opressor, uma burocracia "globalista" determinada a suprimir as liberdades britânicas.

Duncan se situa numa franja extrema do espectro partidário, mas seus argumentos esclarecem a gramática política que impulsiona o Brexit. A "liberdade" dos modelares microestados de Duncan é a liberdade de circundar impostos: os três são paraísos fiscais.

O Brexit veicula a utopia reacionária de rebaixar os padrões sociais e ambientais britânicos, pela ruptura com as regras comuns europeias. Na sua nova encarnação, os liberais sonham com uma Inglaterra bucaneira: um Chipre com armas nucleares.

Os grandes Estados europeus são diversos e relativamente abertos à imigração. A campanha do Brexit concentrou-se na ideia de retomar o controle das fronteiras, abolindo o livre trânsito de cidadãos europeus e erguendo uma muralha frente aos fluxos imigratórios. A "liberdade" de Farage e Johnson é a liberdade de definir a nação à base do sangue. O Brexit veicula a utopia nativista de um retorno aos tempos dourados de uma Pequena Inglaterra exclusivamente branca e anglicana.

A proteção das liberdades públicas e políticas foi a mola que, lá atrás, quando assentava a poeira da guerra mundial, impulsionou o projeto europeu. Na origem da UE encontram-se os imperativos de evitar o ressurgimento do nacionalismo alemão e de traçar uma fronteira geopolítica diante do bloco soviético.

A Europa fragmentária idealizada pelos maníacos do Brexit é o cenário estratégico perfeito para a Rússia, o maior dos Estados europeus. Em 2014, Farage nomeou Vladimir Putin como "o líder mundial que mais admiro". Há um claro motivo político para o voto pró-europeu de Thatcher em 1975.

O Reino Unido navega rumo a águas turbulentas do Brexit, um ato voluntário de autoagressão poucas vezes visto na história das nações. Os liberais convertidos ao nacionalismo xenófobo pilotam o navio, mas partilham a responsabilidade com os trabalhistas, que se recusaram a tentar mudar o curso. É que Corbyn, o líder esquerdista do partido, votou pelo Brexit em 1975 por enxergar o projeto europeu como uma monstruosidade inventada pelos liberais...

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)