Um por cento das pessoas afirmou ou afirmaram?

Natália formou-se em estatística porque lhe pareceu um curso distante das normas gramaticais pelas quais nutria demasiada antipatia. “Sou péssima em português” e “português não faz sentido” eram frases constantemente proferidas por ela. Mas, se a Última flor do Lácio era o problema, a matemática era a solução.

– Fale-me de alguma coisa que não possa ser calculada estatisticamente, Cíntia.

– O amor.

–  Claro que pode. Segundo pesquisas, 31,4% dos casamentos acabam em divórcio no Brasil. E os outros 68,6 % da população AFIRMAM que...

– Seu português não é tão ruim, está vendo?

– O que eu falei?

– Os outros 68,6% AFIRMAM. Certíssimo. Como você colocou modificadores, OS e OUTROS, a concordância necessariamente ocorre com eles.

– Não entendi. Tá vendo como português é chato?

– Preste atenção, porque você trabalha com pesquisa de perfil de consumidores, né?

– Então! Você acha que o seu chefe não sabe concordância de porcentagem? É claro que sabe.

– Tá bom...

– É muito simples: 1% das pessoas AFIRMOU ou AFIRMARAM, porque podemos concordar com o número ou com o substantivo. Você sabe que pessoas é substantivo, né?

– Claro! Não sou tão analfabeta.

– Ótimo. Se vier um modificador antes...

– O que é um modificador?

– São as palavras que vão completar ou modificar o substantivo de alguma forma, como MUITOS, VÁRIOS, OS.

– Tá.

– Então, se vier um modificador antes, o verbo concordará com esse modificador. Por exemplo: OS 80% do povo VOTARAM. Apesar de povo ser singular, você vai concordar com o modificador OS. Entendeu?

– Sim... E CERCA DE? CERCA DE 10% votou ou votaram?

– Quando ocorrem as expressões CERCA DE, PERTO DE, MAIS DE, o verbo concorda com a porcentagem: CERCA de 10% da população VOTARAM.

– Fácil de entender, difícil de decorar.

– Coloque uma colinha no seu celular ou no seu computador. Você vai memorizar de tanto consultar.

– É importante, né?

– Claro! São palavras que fazem parte do seu dia a dia profissional! Uma vergonha você não saber.

– Como você faz para decorar tantas regras de gramática, Cíntia?

– Segundo pesquisas, aprendemos mais com professores divertidos. Hahaha! A minha professora de português do colégio era hilária. E o seu de matemática?

– Divertido e gato, amiga.

– Então OS 100% do conteúdo FOI ou FORAM aproveitados?

– FORAM aproveitadíssimos, professora. Que homem!

– E você, adolescente, pegava-se imaginando o cateto discente com a hipotenusa estudantil, mas tudo isso daria uma inequação à décima potência. Assim, achou melhor deixar essa função logarítmica de lado e foi procurar um número primo, né?

– Quê?

– Ah, deixa pra lá. Era só uma história entre o cateto e a hipotenusa!