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Estado de Minas Padecendo

Aprendendo a viver no isolamento social

Foi como se tivéssemos passado um longo período em outra dimensão depois de passarmos quatro meses vivendo o mesmo dia, repetindo as mesmas coisas


(foto: Arquivo pessoal)
(foto: Arquivo pessoal)

Desde o dia 14 de março, quando o primeiro caso de na escola do meu filho foi confirmado, ficamos em isolamento social. Sem sair de casa para nada.

No primeiro mês meu marido ainda saía para trabalhar, então apareceu o primeiro caso na empresa onde ele trabalha e todos foram trabalhar em casa. Ele passou a sair apenas para fazer supermercado. Mas no último mês passamos a fazer supermercado on-line.

Tínhamos uma rotina cheia de atividades, íamos e voltávamos a pé para o colégio todos os dias, são mil e duzentos metros de casa até a escola. Dois dias por semana caminhada para o inglês que fica a 900 metros.

Nos fins de semana andávamos de bicicleta, visitávamos parques e museus. Todas as atividades ao ar livre foram suspensas por tempo indeterminado. Com as aulas on-line, o tempo de tela que era de uma hora diária, passou para oito horas.

Em quatro meses, a criança que fez 11 anos durante o isolamento e teve festa on-line, perdeu oito dentes de leite, cresceu muitos centímetros e passou a comer muito mais do que comia antes.

O sono também foi prejudicado. Nas últimas semanas de aula antes das férias comecei a receber notificações do colégio sobre atividades que ele deveria ter feito, mas não fez.

Eu só tenho um filho, ele já está numa fase bem independente, meu escritório é em casa onde também faço almoço, limpo, lavo.

Eu não consigo acompanhar as aulas on-line. Impossível controlar tudo que a criança está fazendo enquanto assiste aula no computador.

Imagine as mães que têm mais filhos, que têm filhos menores, que não têm marido. Que perderam o emprego. É enlouquecedor.

Será que neste momento as escolas devem cobrar tanto dos alunos? Será que deve sobrar tanto para os pais nessas aulas on-line? Que tipo de conteúdo é realmente relevante quando não se pode encontrar os amigos? Quando um parente está doente. Quando temos que lidar com o luto.

As férias escolares chegaram e nos demos ao luxo de passar uma semana com meus pais que moram na zona rural. Tem tantas coisas que as crianças podem aprender longe da cidade, longe do celular, do computador, da TV, do tablet.

Numa caminhada, nós passamos por uma plantação de abobrinha e berinjela, vimos o sistema de irrigação, vimos como eles plantam. Como é a flor da abobrinha e a flor da berinjela, e como aquelas flores vão dando origem aos frutos.

Colhemos mexerica no pé. Salvamos aranhas do afogamento na piscina. Pegamos ovos no galinheiro. Jogamos fubá para os canarinhos da terra que vivem soltos em bandos por lá. Pegamos a flor do cipó-de-São-joão para chupar o melzinho que tem dentro.

Andar de bicicleta na estrada de terra. Passear montado num cavalo. Fazer massinha com farinha de trigo sem se preocupar com a sujeira. Dar milho para as galinhas. Ouvir o canto do pássaro preto.

Observar o fogo no fogão de lenha. Derreter marshmellow. Subir em árvore. Se balançar na rede. Observar as nuvens, as estrelas, o pôr do sol. Ver como cada passarinho faz um ninho diferente. Ouvir o canto das siriemas.

Quando voltamos para casa, a sensação era que tínhamos ficado na roça por muito mais que uma semana, porque o tempo passa mais devagar por lá. Foi como se tivéssemos passado um longo período em outra dimensão depois de passarmos quatro meses vivendo o mesmo dia, repetindo as mesmas coisas.

Quando foi que a gente começou a achar bonito morar amontoado? Empilhados em apartamentos, espremidos nas cidades, respirando esse ar poluído, correndo para lá e para cá? Olho pela minha janela e vejo essa quantidade de prédio e só consigo pensar que estou louca, viver assim não faz sentido!

As aulas on-line vão voltar, a rotina será a mesma, os dias serão todos iguais. A convivência com os amigos ainda é inviável. A escola é importante, não só pelo conteúdo, mas também pela convivência com outras crianças.

Aprender a escrever, a calcular. Aprender geografia, história e biologia. Mas neste momento de pandemia, com tantas incertezas, a saúde mental agradece se a gente conseguir um tempinho para aprender a viver.


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