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Populistas e defensores de juro alto se aproveitam do aumento dos preços

Motivos da disparada dos preços têm data para acabar. O maior poder de compra da maioria da população foi reduzido à metade a partir de setembro até o fim do ano, com o corte do auxílio emergencial para R$ 300. Quanto à depreciação cambial, a expectativa é de que o Banco Central se mostre mais ativo, no mercado cambial


13/09/2020 04:00 - atualizado 12/09/2020 22:49

Com os fartos reajustes dos preços do arroz neste ano, alguns supermercados de BH limitaram a compra do produto por cliente(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Com os fartos reajustes dos preços do arroz neste ano, alguns supermercados de BH limitaram a compra do produto por cliente (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

 

O buchicho sobre a disparada do preço do arroz e outros produtos da cesta básica, com o presidente Bolsonaro cobrando “patriotismo” de supermercados, empresários convocados pelo ministro da Justiça a dar explicações, me fez lembrar de uma charge, acho que do Ziraldo, sobre uma das cenas mais patéticas do combate à inflação no país.

 

Na derrocada do Plano Cruzado, em 1986, quando o congelamento de preços fazia água, o desabastecimento era geral, embalagens de um quilo vinham com 900 gramas, a Polícia Federal no governo Sarney recebeu ordens para caçar bois no pasto e fazer a carne reaparecer nos açougues. A charge pintava um touro com jeito malandro, fazendo xixi nos pés do chefe da PF, Romeu Tuma, e do ministro da Fazenda, Dílson Funaro, ambos com binóculos procurando o bicho.

 

O que começou com populares fechando supermercado ao som do Hino Nacional terminou em zombaria. A farsa do cabresto na inflação foi tentada mais três vezes. Todas fracassaram, humilhando o presidente e o ministro da hora, até que a reforma monetária que criou o real em 1994 pôs ordem na casa, apesar do serviço incompleto. Faltaram a reforma da governança do Estado, hoje inadiável, e a desindexação total de quaisquer contratos, de aluguéis ao crédito bancário.

 

A questão que se coloca é se há motivo para nos preocuparmos com o risco de recidiva do processo descontrolado de reajustes de preços. Altas isoladas não configuram risco. O que justifica os aumentos de preços do arroz, da carne, do óleo de soja, além de matérias-primas e insumos industriais, então?

 

A brutal depreciação do real em relação ao dólar desde meados de 2019 é um dos vilões. Outro foi o aumento da renda disponível para 67 milhões de pessoas que recorreram ao auxílio emergencial de R$ 600 (ou R$ 1,2 mil no caso de mulheres chefes de família). Para a maioria, o auxílio foi maior que a renda habitualmente recebida, implicando aumento do consumo de alimentos, o item mais relevante no orçamento das famílias, seguido de produtos para a casa.

 

Ambos os eventos são datados. O maior poder de compra da maioria da população foi reduzido à metade a partir de setembro até o fim do ano, com o corte do auxílio emergencial para R$ 300. Quanto à depreciação cambial, a expectativa é de que o Banco Central se mostre mais ativo, já que não há escassez efetiva de divisas no país.

 

Cautela com os cenários

 

O noticiário está tomado de avisos sobre o risco de insolvência do Tesouro Nacional, dividindo espaço nos últimos dias com a inflação – que segue baixa, no conjunto da obra. O IPCA acumula alta em 12 meses até agosto de 2,44% e as projeções de mercado compiladas pelo boletim Focus, do BC, seguem ancoradas em tranquilos 2% e 2,88% para 2020 e 2021, respectivamente. O que deve chamar a atenção?

 

Primeiro, a divulgação dos cenários mais pessimistas de maneira acrítica, especialmente quanto ao déficit orçamentário e à dívida pública. Ambos exibiam trajetória ruim antes da pandemia, devido à estagnação do crescimento a partir do governo Dilma, e o provável é que retornem a essa tendência, passada a recessão.

 

A relativa rapidez da recuperação da atividade econômica, ao lado das projeções de aumento do PIB (Produto Interno Bruto) ao redor de 3% ano que vem, deve ser avaliada com cautela. A base de comparação com o PIB de 2020 será extremamente baixa. Além disso, boa parte da retomada em processo se deve ao pagamento do auxílio emergencial e a outros programas emergenciais que vencerão no fim de dezembro.

 

Dólar caro foi tiro no pé

 

A apreensão com o que virá com o fim da chamada economia de guerra também toma as atenções do BC e deve pautar a próxima decisão sobre o curso da Selic na reunião do Copom desta quarta-feira. É possível que mantenha a taxa atual de 2%, sem descartar outro corte adiante.

 

A velocidade da recuperação da atividade, acompanhada do emprego e da retomada da economia informal da qual a maioria pobre da força de trabalho tira o seu sustento, é o fator determinante do laxismo monetário, sobretudo pela restrição do teto de gasto orçamentário (congelado ao realizado em 2016 e apenas corrigido pela inflação).

 

A verdade a ser encarada pelo BC é que ruiu a hipótese do ministro Guedes, anunciada no início do ano, de que a “nova combinação” da política econômica reunindo câmbio alto e juro baixo impulsionaria o crescimento, ao ajudar a alavancar as exportações industriais e encarecer as importações. As exportações têm avançado, mas graças à maior demanda da China por commodities agrícolas. Nesse setor, como na mineração, não há exportação gravosa nem com dólar a R$ 4.

 

Modelo atual se esgotou

 

Já a demanda por manufaturados se ressente na veia com o real no rés do chão. Não há bem industrial intermediário ou final sem naco substantivo de componentes eletrônicos que o país não produz. Se a importação encarece, o custo represado pela recessão fica evidente.

 

O câmbio irreal, porque não há carência de divisas, o déficit das contas externas é pequeno (US$ 13 bilhões na previsão do BC para o final do ano) e o país dispõe de um folgado colchão de reservas de US$ 356 bilhões, desvia excedentes de alimentos para a exportação (o que bate na inflação) e reduz a lucratividade da indústria (que perde razões para investir e empregar). O que fazer? O BC intervir nas operações com câmbio futuro e peitar as apostas especulativas.

 

Furar o teto (como querem os ministros próximos de Bolsonaro e seus novos “aliados” do centrão), rebaixar o piso do teto (como o ministro Guedes defende, o que exige reformas constitucionais que estão no Congresso) ou um pouco das duas coisas são as opções. Mais que isso, só com outra equipe econômica, muita ajuda externa e nova coalizão política. O modelo atual se esgarçou e não tem conserto.

 

 

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