Pensar demais está te adoecendo?
Entenda como o overthinking impacta sua saúde emocional
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Às vezes, pensar demais é o que nos adoece. Não porque pensar seja um problema, mas porque nem tudo se resolve na cabeça. Há dores que pedem tempo. Há decisões que pedem silêncio. E há momentos em que insistir em entender tudo é apenas uma forma de adiar o sentir.
Quando a mente não para, nem sempre é porque existe algo a ser resolvido. Muitas vezes, é uma tentativa de controle. E quanto mais você tenta organizar tudo apenas pelo pensamento, mais distante fica da resposta que realmente importa.
Vivemos em uma época em que pensar virou quase uma exigência permanente. Planejar, antecipar, prever riscos, analisar cenários. A mente é constantemente convocada a estar à frente, como se o presente nunca fosse suficiente. Em meio a esse movimento contínuo, um termo ganhou espaço nas conversas sobre saúde emocional: overthinking. Apesar do nome em inglês, a experiência que ele descreve é antiga e profundamente humana.
Overthinking pode ser traduzido como “pensar em excesso”, mas essa definição é limitada. Não se trata de refletir com profundidade ou analisar com cuidado. Trata-se de um estado em que a mente não descansa. Os pensamentos se repetem, retornam aos mesmos pontos, revisitam decisões passadas e criam cenários futuros, sem produzir clareza ou movimento. Há intensa atividade mental, mas pouco avanço interno.
Na psicologia, esse padrão aparece associado principalmente a dois processos. A ruminação, que mantém a pessoa presa ao passado, revisitando erros, falhas e arrependimentos. E a preocupação excessiva, que projeta a mente para um futuro incerto, tentando antecipar problemas que ainda não existem. Esse movimento costuma estar ligado à intolerância, à incerteza, à dificuldade de aceitar que o futuro é, por natureza, imprevisível. Pensar demais surge, então, como uma tentativa de reduzir o desconforto diante do que não pode ser controlado.
Pesquisas conduzidas por Susan Nolen-Hoeksema, referência nos estudos sobre ruminação, demonstraram que esse padrão está fortemente associado à depressão, à ansiedade e ao prolongamento do sofrimento emocional. Pensar demais, ao contrário do que se acredita, não protege. Agrava. A mente tenta resolver pelo excesso aquilo que não se resolve pela força do pensamento, mas pela elaboração gradual, pelo tempo e pela presença. Há questões que pedem digestão emocional, não análise infinita.
Na raiz do overthinking, quase sempre há medo. Medo de errar, de perder o controle, de escolher mal, de se arrepender. A mente entra em estado de vigilância, acreditando que antecipar tudo é uma forma de se preparar. O problema é que essa tentativa de controle cobra um preço alto. O corpo sente. A respiração encurta, os músculos se tensionam, o sono piora. A pessoa se cansa, mesmo sem ter feito muito. O desgaste não vem do que se vive, mas do que se sustenta mentalmente sem pausa.
Pensar é uma função essencial. Ruminar não é pensar melhor, é pensar sem saída. Pensar organiza. Ruminar confunde. Pensar direciona. Ruminar aprisiona no “e se”. Em muitos casos, o overthinking funciona como um mecanismo de defesa sofisticado. Enquanto a mente está ocupada tentando entender tudo, o sentir é adiado. O pensamento excessivo cria uma distância segura do contato emocional, como se compreender fosse mais tolerável do que sentir.
Mas aquilo que não é sentido não desaparece. Apenas muda de lugar. Emoções não reconhecidas encontram outras vias de expressão, no corpo, no humor, no cansaço constante, na irritabilidade, na ansiedade difusa. O excesso de pensamento, nesse sentido, não resolve o desconforto, apenas o mantém circulando. A mente fala sem parar para que o corpo não precise ser escutado.
Abordagens mais recentes, como o modelo metacognitivo de Adrian Wells, mostram que o problema não está apenas no conteúdo dos pensamentos, mas na relação que estabelecemos com eles. A crença de que preocupar-se é necessário, útil ou protetor mantém o ciclo ativo. Para mudar esse padrão, é preciso aprender a observar os pensamentos com algum distanciamento, questionar sua utilidade e interromper a tendência automática de segui-los como verdades absolutas.
Sair do overthinking não exige mais respostas. Exige mais presença. É interromper o piloto automático mental e retornar ao agora, perguntando: o que está, de fato, sob controle neste momento? Qual é o próximo passo possível, e não o cenário perfeito? Muitas vezes, a clareza não vem antes da ação. Ela surge depois, enquanto caminhamos.
Talvez maturidade emocional não seja entender tudo, mas reconhecer quando é hora de parar de pensar e começar a escutar: o corpo, o tempo, os próprios limites. Em um mundo que valoriza o excesso, aprender a pausar talvez seja um dos gestos mais profundos de cuidado consigo. Como nos alertou Sêneca: “Sofremos mais na imaginação do que na realidade.”
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.
