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Estado de Minas

''É preciso um acordo plural'', defende Sérgio Abranches

Especialista defende entendimento que envolva a oposição e a sociedade civil para sair da crise


postado em 29/05/2017 08:13 / atualizado em 29/05/2017 08:25

''É preciso que a gente para de olhar para o retrovisor, de ter essa concepção de desenvolvimento baseada em indústrias, que vão desaparecer, como petróleo, siderurgia, mineração, essa velharia da economia fóssil
''É preciso que a gente para de olhar para o retrovisor, de ter essa concepção de desenvolvimento baseada em indústrias, que vão desaparecer, como petróleo, siderurgia, mineração, essa velharia da economia fóssil" - Sérgio Abranches (foto: Viola Júnior/Esp. CB/D.A Press)
A era do imprevisto é o nome do novo livro do sociólogo e cientista político Sérgio Abranches, mas poderia ser muito bem um resumo do que o país vive hoje. Apesar de a publicação não ser especificamente sobre o Brasil e sim sobre um processo de transição global de longo prazo, que, a rigor, não se aplica a nenhum país específico, mas ao mundo todo, Abranches analisa sob a ótica do imprevisto e desse momento de transição mundial, a crise que o Brasil atravessa e que se agravou com denúncias envolvendo o presidente Michel Temer, que corre o risco de ser afastado do cargo pouco mais de um ano depois do impedimento da presidente Dilma Rousseff. Para Abranches, há oportunidades para o Brasil sair dessa encruzilhada, mas os caminhos não são fáceis e passam pela construção de um grande acordo nacional, que envolva a oposição e a sociedade. Nesta terça-feira (30), ele estará em Belo Horizonte para o lançamento do livro no auditório da Cemig, pelo projeto Sempre um papo.

Você arrisca a prever o que será de nós?

É possível que, a curto prazo, a decisão de Michel Temer de resistir o transforme em um presidente fraco, refém do Congresso, incapaz de exercer sua autoridade e controle sobre o governo em um sistema que o enfraquecimento do presidente não fortalece o parlamento, porque não tem a figura do primeiro-ministro. A França, por exemplo, é um regime semipresidencialista, ou seja, quando o presidente tem maioria e força no parlamento, ele manda. Quando perde essa força, essa maioria, o primeiro-ministro manda. Lá tem esse jogo. No Brasil, não. Estamos em um vácuo de poder que faz prever mais confusão, mais conflito e uma crise mais complicada. Mas eu diria que há oportunidades.

Quais oportunidades?
Se o TSE cassar a chapa Dilma-Temer, há uma chance de saída mais rápida de Temer e aí a questão é a escolha do sucessor. Mas não é também uma questão trivial encontrar pessoas com capacidade de chegar à Presidência via eleição indireta do Congresso. Alguém que esteja fora da Lava-Jato, com capacidade de liderança, que forme consenso, que se disponha a fazer uma travessia ordenada e tranquila e eficiente daqui até 2018, que comande o processo de redefinição das regras de financiamento de campanha para as eleições de 2018 e coordene como árbitro essas eleições. Não vejo ninguém com esse perfil de imediato. Estamos em uma encrenca.

Será que o Brasil vai conseguir aproveitar esse momento de transição para alterar suas estruturas?
Essa é a minha esperança e minha aposta. Mas não é uma questão que se resolva a curto prazo com a conjuntura atual, nem na sucessão do Temer nem nas eleições de 2018, como não foi na eleição americana, na alemã. É um processo de mais longo prazo e não envolve uma pessoa para capitanear essas mudanças. Não é uma questão de liderança pessoal, de escolhas coletivas, um movimento de sociedade. O Brasil tem muito talento desperdiçado que pode fazer essa mudança, muitos recursos que pode usar, recursos humanos, de biodiversidade, cruciais no século 21, um século do conhecimento da genômica, da biologia. Essas transformações o Brasil tem que aproveitar, a revolução científica tecnológica para dar um salto civilizatório, que ele tem condições de dar.

Mas o que é preciso para fazer essa transição?
É preciso que a gente pare de olhar para o retrovisor, de ter essa concepção de desenvolvimento baseada em indústrias, que vão desaparecer, como petróleo, siderurgia, mineração, essa velharia da economia fóssil. A nova economia que está se formando é muito diferente, é do conhecimento, compartilhamento, globalizada, ágil, aberta, baseada na inovação. Para isso, a gente tem que se preparar. Na verdade, está todo mundo experimentando, não sabe como vai ser o novo mundo ainda. Mas o Brasil tem muita chance.

As eleições diretas seriam um caminho para solucionar essa crise?

Eleições diretas agora seriam muito complicadas, porque implica em mexer na Constituição em um momento que o Congresso está paralisado, não há liderança política clara no país, as lideranças estão em decadência. Fazer uma eleição direta agora seria extraordinariamente difícil. Criaria muito conflito, não seria uma boa mudança. Por outro lado, é uma saída muito demorada. Até aprovar a reforma constitucional, preparar as eleições etc, seria lá pelo fim do ano. Estaremos muito próximo das eleições de 2018. Então, o ideal seria fazer eleição indireta, negociada de forma ampla. Não pode ser um desses oligarcas decadentes enrolados nesse sistema de corrupção, ou um Rodrigo Maia (presidente da Câmara), sem liderança, sem projeção pessoal para construir um consenso no Congresso e na sociedade, para fazer uma transição tranquila para 2018.

Como conseguir consenso em tempos tão polarizados?

No meu livro digo que, nesses tempos de transição, de insegurança, é muito difícil formar consenso, que se tornou praticamente impossível no mundo inteiro em cada um dos países. No Brasil, é mais difícil por causa da conjuntura e desse processo de mudança estrutural. Não vamos conseguir nem devemos perseguir esse consenso unânime, mas deve buscar um acordo básico, majoritário, geral. Um consenso que seja plural, que não deixe de considerar a oposição e a sociedade, para que haja um apoio social suficiente que legitime esse novo governo e dê a ele as condições básicas para fazer essa ponte até 2018. Se isso não acontecer, a gente corre o risco de entrar em um processo de desorganização institucional, conflito político irresolúvel, que vai nos levar para uma crise muito mais grave. Aí, sairemos da crise, mas por meio de rupturas que não são desejáveis. Perseguir um consenso muito amplo, geral, acho pouco provável e acho que não é desejável, mas sim buscar um acordo que dê condições básicas e que seja plural, que me parece mais possível e desejável.


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