Caratinga – Apoiado no alpendre de sua casa simples, em Patrocínio, distrito de Caratinga, no Vale do Rio Doce, o produtor rural Luiz Henrique Horsth, de 71 anos, parece uma rocha. As marcas do tempo, da lida na roça de café e do manejo do gado lhe valeram rugas, mãos endurecidas e uma fisionomia séria quase indecifrável. Mas até para os homens e mulheres forjados pela dureza da vida no campo a febre amarela deixou marcas e, num lampejo, ainda que breve, os olhos azuis desse descendente de alemães se afundaram no vermelho marejado da tristeza. “A febre levou meu filho, um dos sete que tinha. Ele morava numa casa aqui perto e ajudava na roça. Ficou doente sofrendo sozinho por uns dois dias. Levaram ele para o hospital em Caratinga, depois para Ipatinga, onde ele não aguentou mais e morreu”, lembra Horsth, que mata a saudade do filho, o lavrador Edson Horsth, de 42, revisitando fotografias antigas do álbum de família.
Na casa do produtor rural Luiz Horsth, a família não se conforma com a morte de Edson. “Ele era forte, trabalhador de sol a sol. Não adoecia por nada, nem me lembro um dia que não trabalhou ou reclamou de alguma coisa. A gente não sabia o que fazer com ele, levamos para o posto, lá deram a vacina para ele, mas não adiantou nada. Não pude ir visitá-lo e só o vi depois, morto. Aqueles dias nunca mais vão sair do meu pensamento”, desabafa.
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde de Caratinga, foram atendidos 238 doentes suspeitos de terem a febre amarela, entre os quais ocorreram 19 óbitos e mais de 30 exames confirmados. A Secretaria de Estado de Saúde (SES) confirmou apenas quatro mortes, 21 doentes confirmados e 129 em investigação. No município, foram aplicadas vacinas a 80 mil pessoas desde dezembro. “Conseguimos vacinar 144% da população, porque além de imunizar todas as pessoas vacináveis ainda aplicamos o medicamento em pessoas de municípios vizinhos que estavam desesperados por causa do surto”, afirma o secretário municipal de Saúde e vice-prefeito de Caratinga, o médico Giovanni Corrêa.
Conseguimos implantar um mutirão de vacinação para abranger toda a população. Agora, felizmente vivemos uma fase de declínio, mas continuamos a fazer o bloqueio de vetores (mosquitos) para que não ocorra mais infecções na zona rural. A população chegou a entrar em pânico. Iam para as filas por volta de meia-noite, 2h para ser vacinado às 8h. Para reduzir isso fizemos também o trabalho de busca ativa por pessoas que precisavam da vacina nas áreas rurais”, conta Giovanni Corrêa. “Ressaltamos também que foi vital a parceria do estado com o município. Tudo aqui que reivindicamos e até os aportes financeiros foram concedidos. A União, também, não deixou faltar vacinas, não tivemos falta em nenhum momento, toda a logística que é complicada foi cumprida em tempo recorde devido ao envolvimento e ao esforço de todos”, diz.
A febre continua a rondar a região, com casos em municípios limítrofes, segundo o secretário de Saúde de Caratinga. “Estão surgindo casos em Umbaporanga, Imbé de Minas e Santa Bárbara. Por isso, mesmo estando num momento mais tranquilo, nossa assistência epidemiológica continua com o mesmo esquema, com toda a equipe preparada”, afirma.