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Estado de Minas

Mariana tem 90% dos seus 25 templos católicos em risco

Cidade que pleiteia reconhecimento mundial pela Unesco, mas os patrimônio está doente. O segundo templo mais visitado, de São Francisco de Assis, está interditado


postado em 14/06/2012 06:00 / atualizado em 14/06/2012 07:35

Do lado de fora, a Igreja do Rosário, no distrito de Padre Viegas, tem fachada encardida e com plantas(foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Do lado de fora, a Igreja do Rosário, no distrito de Padre Viegas, tem fachada encardida e com plantas (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Mariana – A primeira cidade e capital de Minas não consegue mais ocultar as chagas do seu patrimônio barroco. Muito menos curá-las. Igrejas de quase 300 anos, na sede e distritos, estão com rachaduras profundas para desespero dos fiéis, casarões correm risco de desabamento afugentando visitantes, o coreto da praça sofreu interdição e um ato de vandalismo destruiu uma luminária histórica bem diante da Catedral da Sé. Os problemas só deixam mais distante o tão sonhado título de Patrimônio da Humanidade, ainda não concedido pela Unesco a Mariana, que entrou com processo em 2007 reivindicando o reconhecimento mundial dado em Minas a Ouro Preto, Diamantina e ao Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas. A dimensão dos estragos na cidade pode ser mensurada: o departamento de Patrimônio da Prefeitura estima que 90% dos 25 templos católicos históricos sofrem algum tipo de ameaça.

Para piorar, o município esteve prestes a devolver, este mês, cerca de R$ 3 milhões referentes a recursos do antigo Programa Monumenta, administrado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Ministério da Cultura, por falta de prestação de contas e projetos não executados no período de 2004 a 2010. O caso está sob investigação do Tribunal de Contas da União (TCU) e o dinheiro daria, conforme especialistas, para salvar pelo menos duas igrejas dos tempos coloniais e ícones das Gerais.

O Estado de Minas visitou a cidade e constatou problemas urgentes. O ponto de partida foi a Igreja Nossa Senhora do Rosário, no distrito de Padre Viegas, a 20 quilômetros do Centro. A joia ainda desconhecida pelos visitantes está com a fachada encardida e a torre direita servindo de canteiro para uma gameleira. A árvore está frondosa e as raízes atravessaram a parede do coro. Quando foi cortada, ela cresceu rapidamente, segundo o comerciante Ércio da Silva, de 46 anos, que mora em frente à construção. Para ele, a igreja é o orgulho dos moradores de Padre Viegas, um distrito surgido no século 18, onde nasceram o inconfidente Cláudio Manoel da Costa e o padre José Joaquim Viegas de Menezes, o “precursor da imprensa”, conforme a placa de sinalização turística.

De portas abertas, a chefe do Departamento de Patrimônio da Prefeitura, historiadora Érika Meyer, aponta para um dos problemas mais sérios da igreja, que já teve seu interior restaurado. Uma escada de pedra leva até o coro. A madeira usada no lugar foi trocada, mas por peças de eucalipto verde em vez do tratado. “Com isso, a madeira ficou retorcida. Com o tempo, os danos poderão ser maiores”, disse Érika.

No turístico distrito de Cachoeira do Brumado, famoso pela queda d’água e por tapetes de sisal, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, do século 18, pede socorro. A cobertura está em péssimo estado, faltam telhas na fachada e na torre direita a pinha (ornamento) entortou.

Tapumes

Já dentro de Mariana, na Praça Gomes Freire, o coreto construído em 1938 está escondido por tapumes. Ele fica em um espaço arborizado, cercado por casarões, e é um famoso ponto de encontro entre gerações da cidade. O piso e o teto estão caindo. Érika Meyer disse que as obras começariam na segunda-feira. “O jardim passou por obras de requalificação há alguns anos, mas o coreto, tão frequentado pelas crianças, está neste estado lastimável”, mostrou a chefe do patrimônio.

Talvez o pior exemplo seja o da Igreja de São Francisco de Assis. Ao lado da Igreja de Nossa Senhora do Carmo e da Casa de Câmara e Cadeia, na Praça Minas Gerais, foi eleita uma das sete maravilhas da Estrada Real e está dentro do Centro Histórico tombado pelo Iphan desde 1938. Mas nada impediu que o templo fosse interditado pela Prefeitura de Mariana após laudo do Iphan constatando comprometimento da cobertura e estrutura da igreja, além de rachaduras nas cimalhas, que põem em risco a vida dos visitantes. A igreja é o segundo monumento mais visitado pelos turistas na cidade, ficando atrás da Catedral da Sé. Para recuperá-la, foi elaborado um termo de referência com tudo que deve constar na obra, que está em análise pelo instituto nacional, para depois captar os recursos. Atrás de São Francisco de Assis está a Casa do Conde de Assumar, também interditada.

Em nenhum dos prédios do patrimônio, a beleza e a história deixaram de existir. Dentro do templo ameaçado, o presidente da Ordem Terceira de São Francisco (proprietária da Igreja de São Francisco de Assis e da casa anexa), professor João Vicente de Souza, apresenta, entusiasmado, mostra as maravilhas e curiosidades. “Vejam só: do lado direito estão os santos que curam ‘as dores do corpo’ – São Luís de França, São Lázaro, São Sebastião, São Manoel e São Roque – e, do esquerdo, os ‘da alma’ – Santa Clara, São Vicente Ferrer, Santo Antônio, Santa Rita, Santa Rosa de Viterbo e Santa Isabel de Portugal.

Além de toda a degradação, no fim de maio, dois estudantes da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) depredaram o pelourinho de pedra sabão do século 19 com luminárias e 3,5metros de altura na Praça Cláudio Manoel, em frente à tricentenária Catedral da Sé, no Centro Histórico. O monumento está sob posse da prefeitura para ser restaurado. A área é tombada pelo Iphan há 70 anos.

Política

Nos últimos três anos e meio, Mariana teve sete prefeitos. O atual é Roberto Rodrigues (PTB), que assumiu o cargo pouco antes do Carnaval, num momento de tensão, pois a Justiça acabara de proibir a folia no Centro Histórico. Na semana passada, Roberto esteve com a secretária municipal de Cultura e Turismo, Walkíria Carvalho, na sede do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em Brasília. Para evitar a devolução dos R$ 3 milhões de recursos do Programa Monumenta, ele se comprometeu a prestar contas dos serviços executados entre 2004 e 2010. A Prefeitura também pediu uma auditoria para entender o que aconteceu nos seis anos. “Vamos resolver esta questão. Encontramos a prefeitura sucateada e o patrimônio cultural mais ainda. O quadro é grave e pedimos uma auditoria”, diz a secretária.


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