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Estado de Minas

Norte e Nordeste de Minas enfrentam uma das piores secas da história

EM percorre municípios na região. Pelo caminho, encontra uma população acuada pela estiagem que começou cedo demais e já consumiu quase toda a reserva de água, fazendo Lavoura e gado definharem.


postado em 20/05/2012 06:56 / atualizado em 20/05/2012 08:54

Evangelista de Andrade caminha pelo leito da lagoa que evaporou(foto: Jackson Romanelli/EM/DA Press)
Evangelista de Andrade caminha pelo leito da lagoa que evaporou (foto: Jackson Romanelli/EM/DA Press)
Espinosa, Mamonas, Monte Azul e Porteirinha – O sertanejo é antes de tudo um forte. A constatação de Euclides da Cunha não deixou de ser verdade, mas nem a resistência que chamou a atenção do autor de Os sertões tem sido capaz de vencer o desânimo frente a uma das maiores secas de todos os tempos no Norte e Nordeste de Minas. No seus 78 anos, Celestina de Andrade, moradora da comunidade de Cabeceiras, na zona rural de Mamonas, calejada pelas dificuldades, jamais viu coisa igual. Estiagem houve outras. Muitas. Mas nada, nenhuma, como agora. “Antigamente, a gente perdia os mantimentos (plantações), mas o rio corria. Agora secou. Não tem mais água”, diz a aposentada. A barragem do Rio Cabeceiras está lá, no fundo da casa, para provar. Antes responsável por fornecer água para abastecimento da cidade, está vazia. Com isso, para os 6,3 mil habitantes do município, água, só a que brota dos caminhões-pipa. E ela é pouca.

O drama em Mamonas é apenas uma das consequências daquela que já é apontada pelos meteorologistas como uma das maiores estiagens da história do estado. A mancha de sede que ela espalha pelo mapa de Minas só faz crescer: já engoliu 96 municípios, todos em estado de emergência, a grande maioria no Norte e no Vale do Jequitinhonha. No seu rastro, a lavoura teve perda que supera 70%; quando não morre, o gado mingua com fome e sede; prefeituras escavam o solo atrás de água para a população, mas pouco encontram. Quando acham, em muitos casos o líquido que chega à superfície é salobro. Banho virou luxo, mantido graças a água de aspecto duvidoso, buscada cada vez mais longe.

Divisão

Especialistas tentam explicar o que o sertanejo sente na pele, sol após sol. “Na verdade, isso já é consequência do aquecimento global. As regiões semiáridas tendem a sofrer mais com os efeitos do fenômeno, vivendo contrastes, com muita chuva concentrada em determinado período, tendo, logo depois, estiagem rigorosa”, diz o meteorologista Ruibram dos Reis, do Instituto Climatempo e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas).

Já o professor Expedito José Ferreira, coordenador do Centro de Estudos de Convivência com o Semiárido, da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) em parceria com o governo de Minas, afirma que diversos fatores estão ligados ao longo período de estiagem. “O mais provável é que seja influência do fenômeno La Niña (resfriamento das águas do Oceano Pacífico)”, informa. Segundo ele, apesar de uma corrente atribuir o rigor da seca ao aquecimento global, ainda não há consenso na comunidade científica sobre isso.

Para quem vive no sertão mineiro, a verdadeira explicação pouca diferença faz, frente à aridez do cotidiano. Escassez de chuvas não é novidade no Norte de Minas. Mas, desta vez, a seca chegou bem mais cedo. Em outros tempos, maio era apenas o início da estiagem. Rios ainda corriam, plantações eram colhidas e havia pasto verde para espalhar o gado. A situação só apertava de verdade entre agosto e setembro. Neste ano, maio recebeu os moradores da região com o chão esturricado e poeira em leitos de cursos d’água. No campo, lavouras se perderam e produtores correm para vender rebanhos a qualquer preço, para não deixar os animais sucumbir à fome e à sede.

A equipe do Estado de Minas percorreu alguns dos municípios mais castigados. Lugares em que o volume de chuvas de outubro/2011 a março/2012 foi de pouco mais de 400 milímetros, metade da média histórica (800 a 900 milímetros). Só choveu mesmo até o início de janeiro. Tão pouco que muitos rios e córregos nem chegaram a correr. Nesta semana, foram registradas chuvas esparsas pela região. Em Montes Claros, chegaram até a causar danos ao asfalto, mas, no extremo Norte, área mais afetada, o pouco que pingou do céu não alterou em praticamente nada o cenário de desolação. Por isso, além da aridez já instalada, o que mais apavora o sertanejo é saber que chuvas “de verdade” só devem voltar à região em outubro ou novembro, como estimam meteorologistas.

“Será o fim do mundo?”, pergunta-se Celestina de Andrade, que encontramos em Mamonas. Ela conta que a família sobrevive graças à água captada na nascente em uma serra perto de casa. É a mesma que sustenta outros moradores do lugar, que rezam por mais um pouco de chuva que mantenha viva a última fonte.

Um deles é o agricultor Evangelista de Andrade Câmara, de 42 anos. “Em março, a nascente quase secou. Tive que trazer água na cabeça, de um poço.” Em anos anteriores, esta era a época de plantar alho em área de um hectare, perto da barragem do Rio Cabeceiras. Neste ano, ele preparou a terra, mas, com a barragem seca, o terreno ficou nu. Sem pasto, o agricultor também teve que vender parte do seu pequeno rebanho. Restaram seis reses, e nem elas ele sabe se vai conseguir manter até o fim da estiagem. “É a primeira vez que vejo uma seca deste tipo. Deus ajude que seja também a última.”
Moradores acordam cedo para ir aos poucos poços que restam(foto: Jackson Romanelli/EM/DA Press)
Moradores acordam cedo para ir aos poucos poços que restam (foto: Jackson Romanelli/EM/DA Press)


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