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Estado de Minas

Estação Ferroviária histórica sofre com abandono no Norte de Minas

Edificação de Lassance, de 1907, tombada como patrimônio e marco da passagem de Carlos Chagas pela cidade, é um dos 3.704 bens de valor histórico abandonados em Minas Gerais


postado em 26/07/2011 06:00 / atualizado em 26/07/2011 07:05

Lassance – Mais que um terminal de encontros e despedidas, como tantos em Minas, a Estação Ferroviária de Lassance, no Norte do estado, carrega a “culpa” de um dos acasos mais importantes para a ciência no século 20. Em 1907, o cientista Carlos Chagas chegou à cidade com a missão de combater uma epidemia de malária que paralisava as obras de prolongamento da ferrovia Central do Brasil. Mas acabou tropeçando na descoberta de um mal implacável que comprometia o coração da população da região e até hoje atinge pessoas mundo afora: a doença de Chagas. Mas a parada de trem que entrou para a história da ciência corre o risco de ficar só na memória.


A edificação está entre os 15% dos 3.704 bens de valor histórico, cultural, arquitetônico e ambiental que se encontram em mau ou péssimo estado de conservação, de acordo com levantamento do Ministério Público Estadual, divulgado nessa segunda-feira pelo Estado de Minas. Sem telhado, paredes destruídas, tinta descascada e mato em seu interior. Esse é o cenário que o turista interessado em conhecer a história da descoberta de Carlos Chagas vai encontrar em Lassance, que tem 5.115 metros quadrados tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), incluindo a estação e uma casa de saúde.


O terminal ferroviário está sem telhado e com as paredes destruídas(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press. )
O terminal ferroviário está sem telhado e com as paredes destruídas (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press. )
Era junho de 1907. Carlos Chagas foi designado por Oswaldo Cruz, que chefiava o Instituto de Manguinhos, atual Fiocruz, para acabar com uma epidemia de malária que derrubava operários da rede ferroviária em Minas Gerais, na Região do Rio das Velhas, entre Corinto e Pirapora. Em São Gonçalo das Tabocas, chamada mais tarde de Lassance, ele montou um pequeno laboratório num vagão de trem, que também servia como dormitório. Enquanto combatia a doença, coletava espécies da fauna brasileira, interessado em protozoologia. Além da busca de parasitas, Chagas ficava de olho nos artrópodes que pudessem ser vetores – invertebrados que carregam o agente infectante e os transmitem em picadas.


Foi assim que observou um percevejo, conhecido na região como barbeiro, que picava o rosto de suas vítimas enquanto dormiam, habitando choupanas de pau a pique. Da Estação de Lassance, Chagas partiu para uma longa e detalhada pesquisa no Rio de Janeiro, descobrindo o Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas. Mas a descoberta que tornou Lassance conhecida no mundo acadêmico parece ter sido esquecida pelas administrações municipais e autoridades dos âmbitos estadual e federal responsáveis pelo patrimônio histórico. Segundo a prefeitura local, a estação, desativada há mais de 40 anos, só passou por reforma uma vez. A antiga administração (2005-2008) teria, sem auxílio de técnicos em bens históricos, iniciado uma revitalização, descaracterizando parte da construção.


“Estamos fazendo projetos para reforma da estação, que pretendemos transformar em museu interativo. Mas dependemos de aprovação do Iphan e de verba”, diz o secretário municipal de Turismo, Rafael Magalhães dos Santos. Segundo o Iphan, em 2007 foi aprovado um projeto de restauração da edificação, mas que venceu em 2010, sem ter saído do papel. A atual administração tem 60 dias para apresentar nova proposta, que incluiria a reforma de uma casa de saúde, erguida na mesma época. A prefeitura está autorizada, no entanto, a fazer intervenções emergenciais, como a limpeza do entorno do prédio e rebocos. Ainda de acordo com o Iphan, a estrutura não “apresenta risco iminente” de desmoronar.


Museu

A cidade já conta com um museu sobre a doença de Chagas, onde o cientista teria morado em parte de sua passagem por Lassance. Segundo o secretário de Turismo, semanalmente passam por lá cerca de 150 alunos de escolas da região. A ideia da prefeitura é montar na estação um museu mais moderno, que atraia mais turistas para o município. “Há muitos estudiosos curiosos em conhecer a cidade da descoberta da doença de Chagas. Não queremos mais que eles vejam a estação destruída”, diz.

O mesmo é esperado pelo jardineiro Vicente de Paulo Bruno, de 57, que viu a estação funcionando, quando era pequeno. Para ele, nem mesmo os moradores da cidade dão tanto valor ao patrimônio, já que o veem abandonado. “É preciso guardar cada pedacinho da história de Minas. Memória é algo que vai embora com a morte dos mais velhos. Queremos uma lembrança material.”

 

Saiba mais

uma referência científica

Cientificamente confirmada em abril de 1909, a doença de Chagas é uma infecção causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi e transmitida pelo inseto conhecido como barbeiro. Os sintomas aparecem lentamente, começando com inchaços e chegando à insuficiência cardíaca e desordem do sistema digestivo. Torna-se um mal crônico e pode ser fatal. Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, estima-se que haja 300 mil pessoas portadoras da doença no estado e 1,5 milhão no Brasil. Depois de descobri-la, Carlos Chagas foi admitido na Academia Nacional de Medicina e ganhou, entre outros prêmios, o Schaudinn, concedido de quatro em quatro anos pelo Instituto de Doenças Tropicais de Hamburgo, da Alemanha, ao melhor trabalho em protozoologia.


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