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Estado de Minas

Seguro-desemprego vira descanso pago

Governo e centrais divergem sobre explosão do benefício, que quintuplicou justamente em cenário de pleno emprego


postado em 05/11/2013 06:00 / atualizado em 05/11/2013 07:35

Ana Clara Almeida admite que recusou duas propostas porque preferia
Ana Clara Almeida admite que recusou duas propostas porque preferia "descansar mais um pouco a receber o mesmo salário trabalhando" (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Mesmo depois da reunião de três horas, ontem, o governo e as centrais sindicais continuam a divergir sobre o que fazer a respeito da explosão das despesas com o seguro-desemprego. Em 10 anos, entre 2002 e o ano passado, a conta passou de R$ 5,7 bilhões para R$ 25,7 bilhões. "Queremos identificar se a evolução (desses gastos) está sendo em benefício dos trabalhadores ou se por trás disso tem aumento de rotatividade, problemas de fraude por empresários que demitem para pagar por fora", afirmou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que chamou para o encontro, em São Paulo, representantes de centrais sindicais. "Que existe fraude nós sabemos, mas não sabemos qual a magnitude", disse Mantega.

Para o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, que participou do encontro, não há irregularidades, mas, sim, excessos na demissão de trabalhadores. Ele defendeu, durante a reunião, a ratificação pelo Brasil da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que, em linhas gerais, dificulta a dispensa sem justa causa.

O Brasil conta hoje com cerca de 45 milhões de trabalhadores com carteira assinada, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). A estimativa do instituto é que 20 milhões de vínculos de empregos sejam rompidos ao longo do ano. Desse total, de 7 a 8 milhões de pessoas acessam o seguro-desemprego, benefício recebido por até cinco meses consecutivos.

O diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, afirma que, por volta do ano 2000, o número de trabalhadores com carteira assinada girava em torno de 24 milhões. “Com o número maior de empregados formais, a rotatividade tende a ser maior. E o trabalhador sabe que vai achar emprego melhor que o anterior”, diz Lúcio.

Parece contraditório, mas o quadro de pleno emprego do país abre espaço para que trabalhadores se desliguem das empresas e vivam por mais tempo do seguro-desemprego. “Muitas pessoas pedem para ser demitidas para receber o dinheiro do FGTS. Isso acontece principalmente em épocas de pleno emprego, em que a chance de o trabalhador ser recontratado é grande”, afirma Osmani Teixeira de Abreu, presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Ele ressalta que as estatísticas sobre a dispensa do trabalhador sem justa causa nem sempre correspondem à realidade. “Na maioria dos casos, as pessoas fazem acordo para serem demitidas”, observa.

Descanso


A operadora de caixa Ana Clara Almeida, de 22 anos, está há sete meses sem trabalhar. No dia 1º ela recebeu o seu último seguro-desemprego, no valor de R$ 678. Agora, ela diz que vai começar a buscar trabalho com mais empenho. “Como tenho experiência, acho que não vai ser difícil me recolocar”, diz. Ela afirma que ganhava R$ 890 como operadora de caixa, seu último emprego, onde permaneceu por um ano e quatro meses. Enquanto recebia o seguro-desemprego, ela conta que teve duas propostas de trabalho, mas não se interessou por elas. “Eles queriam assinar a minha carteira de imediato. Nenhuma empresa quis esperar que eu recebesse o seguro. Preferi descansar mais um pouco a receber o mesmo salário trabalhando”, afirma.

Felipe Mateus da Penha também só pretende procurar trabalho nas próximas semanas, já que amanhã recebe a última parcela do seguro(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Felipe Mateus da Penha também só pretende procurar trabalho nas próximas semanas, já que amanhã recebe a última parcela do seguro (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Felipe Mateus Araújo da Penha, de 24, já tem no currículo cinco empregos com carteira assinada. Ele já foi empilhador, embalador de supermercado e balconista. Felipe está desempregado há três meses e conta que quis sair do último trabalho, como balconista de padaria. “Estou querendo buscar uma coisa melhor”, diz ele, que ganhava salário mínimo por mês, mesmo valor que recebe no seguro-desemprego. “Ainda não estou buscando trabalho. Vou pegar a última parcela de seguro-desemprego neste mês. Depois vou procurar colocação”, afirma. “Já surgiu oferta para atuar como balconista, mas eu não quis, pois estou recebendo o seguro”, diz.

Conta do FAT não fecha


Em sua página eletrônica, a CUT afirmou ontem que havia conseguido "convencer o ministro da Fazenda a discutir direitos dos trabalhadores, e não custos". Guido Mantega nega que o objetivo fosse esse. "Longe de nós querer reduzir benefícios dos trabalhadores", disse. Foi marcado um novo encontro, desta vez entre técnicos do governo e representantes das centrais, para quinta-feira.

Na avaliação dos sindicalistas, os gastos do seguro-desemprego não representam problema, pois vêm sendo compensados pelo aumento no número de empregos formais. Mas o FAT, de onde saem os recursos, tem sofrido com a queda de receitas por contas de desonerações que o governo promoveu. Segundo as centrais, apenas 10% da queda foi ressarcida pelo governo ao fundo.

O economista Mansueto de Almeida, especialista em contas públicas, atesta que o gasto com benefícios é compensado pelo aumento da receita com novas contratações. Mas ele discorda que isso represente equilíbrio. "Em lugar nenhum do mundo é normal o que está ocorrendo no Brasil: a desocupação diminuir e os gastos com seguro-desemprego aumentarem", criticou.
Mansueto afirma que a solução passa por mais obrigações a quem participa do programa, incluindo a exigência de frequentar cursos de capacitação, o que impediria essas pessoas de, ao mesmo tempo, se beneficiar do seguro e trabalhar na informalidade. "Não acredito que o governo aumente as exigências em ano eleitoral. Mas é bom que comece a planejar uma solução a ser aplicada em 2015", ponderou.

Rotatividade


Além das demissões forjadas, há um problema real de alta frequência de demissões e contratações nas empresas, especialmente para quem está chegando ao mercado. Com base nos dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) concluíram que os trabalhadores mais jovens perdem o emprego com mais frequência do que os mais velhos. O estudo “A rotatividade dos jovens no mercado de trabalho formal brasileiro” aponta uma taxa de separação — razão entre o número de trabalhadores que saem de seus postos de trabalho por demissão voluntária ou involuntária em relação ao estoque de trabalhadores — de 72,4% no mercado brasileiro. Ou seja, sete em cada 10 trabalhadores, em média, desligam-se de seus postos de trabalho ao longo de um ano. (PPS, AT e GC)


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