O cavalo Caramelo foi resgatado de um telhado na cidade de Canoas, no Rio Grande do Sul -  (crédito: TV Globo/Reprodução)

O cavalo Caramelo foi resgatado de um telhado na cidade de Canoas, no Rio Grande do Sul

crédito: TV Globo/Reprodução

Recordes de temperatura em todo o planeta, tempestades e inundações nunca vistas, e secas prolongadas agora fazem parte da rotina dos noticiários matinais. Novidade?! Nenhuma! Tudo previsto e exposto há décadas pela ciência. Mas, ignorado pelos gigolôs do Jardim do Éden.

 


Segundo o Institute for Economics and Peace, foram registrados 39 desastres naturais no mundo em 1960. Em 2019, esse número chegou a 396, ou seja, 10 vezes mais. Dados do Comitê Internacional da Cruz Vermelha revelam que 3,6 bilhões de pessoas pelo mundo são consideradas altamente vulneráveis às mudanças climáticas.

 

 

Além das 250 milhões que já sofrem com as inundações atualmente, 380 milhões de pessoas passarão a ficar expostas no mundo até a segunda metade do século. Cerca de 132 milhões de pessoas podem ser jogadas para a pobreza extrema diante das mudanças climáticas até 2030.

 


Por outro lado, a seca, que atinge 800 milhões de pessoas atualmente, com um aumento de 2°C nas temperaturas globais, a falta de água pode passar a atingir 3 bilhões de terráqueos.

 


Em janeiro, um relatório do Fórum Econômico Mundial alertou que, até 2050, as mudanças climáticas poderão causar mais 14,5 milhões de mortes e US$ 12,5 trilhões em perdas econômicas em todo o mundo.

 


De repente, um Cavalo subiu no telhado. A princípio, disseram que era uma Égua. Não, não, era um Cavalo mesmo. Tempos difíceis, as pessoas confundem cada coisa! Ganhou nome e compaixão do mundo. O Cavalo Caramelo subiu no telhado e lá permaneceu aos olhos televisivos para que todos pudessem entender o recado: não há para onde fugir.

 


Antes dele, famílias inteiras já haviam subido no telhado. Algumas foram heroicamente resgatadas em meio a vento e tempestade. Outras, mais de uma centena, não tiveram a mesma sorte e mergulharam para sempre nas águas barrentas dos rios do Sul. Quantas exatamente, não se sabe.

 


Nossos olhos viram uma mãe descendo pela correnteza. Mas é semana das mães. O galho de uma árvore estendeu-lhe a mão e um herói anônimo evitou a orfandade de seus seis filhos. A mãe natureza está cansada de nos mandar recados e busca desesperadamente o galho de uma árvore ou um telhado para se salvar.

 

 


Com o coração apertado pelos meus amigos do Sul, mandei recado para o Gabriel Narvaez e o casal Adão Machado e Loriane. A resposta deles descreve cenas de “O Ensaio sobre a Cegueira”, de Saramago: “…mas o drama é imenso. Porto Alegre virou uma cidade distópica, com helicópteros circulando o tempo todo, ruas vazias e inundadas, com o lixo boiando, lembrando barcos a esmo. Supermercados com prateleiras vazias e um desespero silencioso, tenso…”, assim descreveu o Narvaez.

 


Adão descreveu assim: “O Hospital de Clínicas, o Moinhos de Vento e outros hospitais estão sem receber água encanada desde sexta-feira passada, pois a estação de abastecimento da região ainda não foi colocada em funcionamento. Os caminhões-pipa da cidade são insuficientes para dar conta das necessidades dessas e outras instituições de saúde, trabalhando num ir-e-vir contínuo.

 


Os condomínios residenciais que tentam conseguir caminhão-pipa não encontram disponibilidade, e já existem golpes inescrupulosos: o pretenso entregador de água oferece um caminhão, mas exige pagamento adiantado. Paga-se e o precioso líquido nunca chega…

 

 


Muito preocupante é o desabastecimento de insumos para os hospitais e clínicas: Porto Alegre está praticamente isolada, e fornecedores de medicamentos (inclusive antibióticos), nutrição enteral e parenteral, equipos, sondas, enfim, todo tipo de insumo, não estão conseguindo entregar os produtos ou, pior ainda, foram atingidos diretamente pela enchente e estão com depósitos e produção afetados. Além disso, a mão de obra assistencial está reduzida, porque muitos colaboradores perderam tudo na enchente ou não conseguem chegar ao trabalho devido aos bloqueios. A solidariedade é extraordinária, nos emociona e mobiliza, mas estão sendo dias bem difíceis.”

 


Enquanto isso, o Cavalo continuava no telhado. Teve gente que não dormiu pensando no trágico destino daquele pobre animal. No dia seguinte, veio o resgate heroico. Depois de sedado, foi salvo para alívio de todos.

 


Uma pergunta não quer calar: quem acordará o Cavalo Caramelo desse pesadelo? Ele será o mesmo depois desse trauma?! Eu acredito que sim! Superará fácil, até o dia de virar salame e ser servido no sanduíche de alguém. Afinal, a natureza de Cavalo o fez assim. Obra lógica, instintiva e bela de Epimeteu. Os deuses adoraram! Já o livre arbítrio proposto por Prometeu para os homens, não foi bem recebido. Tenho que concordar com os deuses gregos.

 


Enquanto isso, a vasta literatura sobre o Armagedom que nos abraça, continua entrando num ouvido e saindo pelo outro dos negacionistas climáticos. Os mesmos das vacinas, lembram?! Da gripezinha, do mimimi, do “gente morre mesmo e daí?!”.

 


Pois é, burros e jumentos se afogaram aos montes. Já o Cavalo Caramelo, subiu no telhado e virou símbolo. Meus amigos estão a salvo em seus “Monte Megido” do Rio Grande do Sul.