A conscientização pública sobre a doença de Parkinson desempenha um papel relevante na melhoria da qualidade de vida das pessoas afetadas e suas famílias -  (crédito: atlascompany/ freepik)

Mesmo com os avanços científicos, como identificação de algumas proteínas e alterações metabólicas nos pacientes, ainda não se sabe exatamente quais são os motivos que levam a essa perda progressiva de neurônios

crédito: atlascompany/ freepik

Ser diagnosticado com a doença de Parkinson não é nada fácil, mas o paciente pode ter qualidade de vida significativa se o quadro clínico for descoberto no tempo correto e, dessa forma, iniciar o tratamento adequado o quanto antes. Neste mês de abril, é comemorado o Dia Mundial de Conscientização da Doença de Parkinson e, só no Brasil, estima-se que 200 mil pessoas sofrem com a enfermidade. A data foi estabelecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1998, com o objetivo de esclarecer à sociedade sobre as possibilidades de tratamento para que o paciente e a sua família tenham uma melhor qualidade de vida. Segundo dados da OMS, aproximadamente 1% da população mundial com idade superior a 65 anos tem a doença.

Guilherme Torezani, coordenador de doenças cerebrovasculares do Hospital Icaraí e coordenador da Neurologia do Hospital & Clínica de São Gonçalo, esclarece que, diferentemente do que é pensado, nem todo paciente com Parkinson apresenta tremor — que, quando presente, normalmente se apresenta em um dos membros em repouso e nas extremidades do corpo. Os sintomas principais da doença são, na verdade, rigidez muscular e lentidão nos movimentos — além de progressiva perda de equilíbrio (instabilidade postural).

“O início dos sintomas motores pode ser sutil, com lentidão em uma das mãos, que leva à diminuição da letra ao escrever (chamado de micrografia) ou, ainda, muito comumente, a redução do balançar de um dos braços durante a caminhada.”

Há, também, outros sintomas não motores, como a diminuição do olfato, os distúrbios do sono, a prisão de ventre (constipação) e, até mesmo, a depressão. Quanto ao sono, tem sido muito estudado um tipo específico, chamado distúrbio comportamental do sono REM. Essa fase do sono deriva da expressão em inglês “rapid eye movement” — em português, “movimento rápido dos olhos” — e se caracteriza pela ocorrência dos sonhos. Acontece que o nosso cérebro produz uma paralisia de todo o corpo nesse período, mas que, nesse distúrbio, a paralisia se faz ausente.

Como resultado, o paciente apresenta movimentos complexos, como se vivenciasse seus sonhos. Em estudos, a presença dessa alteração, que pode anteceder o surgimento dos sintomas motores em muitas décadas, relacionou-se com risco bem elevado de se desenvolver doença de Parkinson e outras doenças “similares”.

Tratamento

A doença deve ser tratada por um neurologista. Mesmo com os avanços científicos, como identificação de algumas proteínas e alterações metabólicas nos pacientes, ainda não se sabe exatamente quais são os motivos que levam a essa perda progressiva de neurônios. Em geral, a doença é dita como idiopática, ou seja, não há um fator claro que tenha produzido o Parkinson. No entanto, há algumas formas genéticas que podem acometer famílias, ainda que sejam formas mais raras. Outro fator muito ligado ao risco de se desenvolver essa comorbidade é a exposição a certos tipos de agrotóxicos, muitos deles banidos em diversos países.

A luta contra a liberação desses pesticidas é ainda um ponto em que o Brasil precisa evoluir. Em comunidades rurais, a incidência de Parkinson costuma ser maior que em áreas urbanas. “Com o envelhecimento, é natural que tenhamos a morte progressiva dos neurônios que produzem dopamina, que é responsável pelo aprendizado motor, sistema de recompensas e outras várias funções cerebrais complexas. Porém, no caso dos pacientes com Parkinson, essas células são perdidas com mais rapidez, reduzindo os níveis de dopamina”, explica o especialista.

E complementa que essa perda preferencial de neurônios de dopamina pode ter a ver com o fato dessas células possuírem muito mais conexões (sinapses) que outras em nosso cérebro, deixando-as mais sensíveis ao processo de neurodegeneração.

De acordo com Guilherme, na década de 1960, com a descoberta do uso da levodopa no tratamento, houve uma drástica mudança na história natural da doença. O resultado era tão potente que se apelidou de “efeito milagroso”. “A levodopa, que persiste sendo o principal tratamento dos sintomas até o presente dia, é uma forma de dopamina que consegue ser ingerida e chegar até o cérebro. Pensa-se como se fosse uma reposição contínua dessa substância que o paciente não consegue mais produzir de forma eficaz”, explica.

Saber administrar a dose e os efeitos colaterais com um neurologista, que tenha experiência com Parkinson, é muito importante para o sucesso do tratamento. Haja vista que o paciente, adequadamente tratado, pode exercer muitas atividades diárias e ter uma vida praticamente normal por muitos anos. Para o neurologista, o tratamento não para somente nos medicamentos. Deve-se aliar à prática da fisioterapia motora contínua, terapia ocupacional e atividade física, o que ajuda na melhora do equilíbrio, da força física e do resgate da autonomia e autoestima.

Leia também: Síndrome do pôr do sol: entenda o que é e como lidar

“Em casos em que não há melhora com o uso destes medicamentos, também é possível realizar — quando adequadamente indicado — um procedimento cirúrgico, chamado ‘Estimulação Cerebral Profunda’ (ou DBS). O método já possui muitos anos de estudo e tem sido cada vez mais empregado no tratamento, com resultados muito favoráveis no controle de tremor, rigidez muscular e lentidão de movimentos. No entanto, deve-se buscar um grupo de neurocirurgia funcional e neurologistas especializados em Neuromodulação, para que seja verificada a precisa indicação (ou não) da cirurgia. De nada adianta passar pelo procedimento cirúrgico se o processo de triagem não foi feito de forma adequada”, alerta.

Guilherme lembra também que muito tem sido comentado sobre o tratamento com derivados da Cannabis e que ainda que pareça promissor, é preciso mais estudos para melhor entender o papel desses medicamentos no tratamento. “Na Cannabis, encontramos mais de cem substâncias químicas diferentes, e ainda estamos começando a entender a função delas. O Canabidiol, por exemplo, se por um lado não tem sido muito promissor no controle dos sintomas motores, por outro já foi correlacionado em estudos à piora da cognição na doença de Parkinson. Creio que ainda vamos precisar esperar grandes ensaios clínicos, que sejam feitos de forma muito criteriosa, para prescrevermos derivados da Cannabis com segurança e embasados em dados científicos”.