O próximo sábado, Dia de Todos os Santos, marca mais um capítulo nas relações de amor e ódio entre Minas dos tempos coloniais e Lisboa, então sede do reino português. Em 1º de novembro de 1755, a cidade foi quase totalmente destruída por um terremoto seguido de tsunami. Não era a primeira vez que Lisboa enfrentava um abalo sísmico, mas, agora, a destruição ganhava contornos monumentais.

Imaginem o cenário ocorrido naquela manhã, há 270 anos, quando as ruas estavam cheias e as igrejas abarrotadas de fiéis, por ser um dia festivo. O primeiro tremor atingiu nove pontos na escala Richter, causando pânico e destruição. Ondas de água doce misturadas à força do Oceano Atlântico, vindas pelo Rio Tejo, derrubaram prédios centenários, igrejas, teatros e palácios – morreram cerca 15 mil pessoas ou 10% da população na época. Não bastasse, incêndios transformaram Lisboa em ruínas e cinzas.

Do lado de cá do Atlântico, moradores da região do ouro sofriam com a pressão da Coroa portuguesa para ajudar na reconstrução. “Sem a riqueza de Minas Gerais, Lisboa jamais teria se reerguido dos escombros”, afirma a professora de história da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Adriana Romeiro, autora de vários livros sobre o período colonial brasileiro.

Assim, entrou em vigor a cobrança do “donativo voluntário” ou “subsídio voluntário”, penalizando ainda mais Vila Rica, atual Ouro Preto, e outras regiões. De voluntário, não havia nada, a não ser o nome. O donativo ou subsídio era um imposto criado por Portugal, em caráter excepcional, e cobrado várias vezes ao longo do século 18, como na época do casamento dos príncipes, em 1729, quando foram enviadas 125 arrobas de ouro para Lisboa. Todas as câmaras do Império português foram obrigadas a contribuir dessa forma.

Importante saber que, em meados do século 18, a exploração do ouro em Minas estava em declínio, mas a economia se reerguia com a agricultura. Na capitania, de modo geral, não houve resistência ao tributo, embora no fim da década de 1760 os vereadores das câmaras das vilas tenham informado ao governador da capitania que não mais o arrecadariam, por considerar a cobrança abusiva.

Seis anos depois, o governador Conde de Valadares procurou se articular com os homens principais da capitania e negociar a continuidade do tributo por mais 10 anos. Em troca, a Coroa portuguesa deixaria a cargo das câmaras municipais a cobrança de outros tributos. O resultado foi que a elite local aceitou os termos do acordo e a cobrança pôde ser prorrogada por mais 10 anos, indo até 1804. “É bom notar que, por volta de 1766, havia grande insatisfação em relação à cobrança de tributos, vistos como opressivos e abusivos, o que gerou revoltas”, explica Adriana Romeiro.


MARQUÊS DE POMBAL

Uma das figuras centrais na reconstrução de Lisboa foi o primeiro-ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, marquês de Pombal (1699-1782), que, de imediato disse ser preciso “enterrar os mortos e cuidar dos vivos”. Com papel decisivo no reinado de dom José I (1714-1777), ele defendia uma política econômica que articulasse os interesses da Coroa aos dos grupos mercantis, cooptando-os para a esfera do Estado.

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Dessa forma, para a reconstrução de Lisboa, Pombal se valeu de estratégias para atrair os homens ricos – grande parte deles residente em Minas – e obter recursos necessários mediante empréstimos a juros à Coroa “em troca de privilégios, como a concessão de contratos de arrendamento e mercês régias, que puseram nas mãos dessa elite os negócios mais lucrativos da capitania”, diz a professora. Por meio dessa política, uma fatia privilegiada da população pôde enriquecer e ascender socialmente, ao mesmo tempo que contribuía para a reconstrução de Lisboa. Foi graças à contribuição desses homens que Pombal pôde empreender as obras.


NOVAS CELEBRAÇÕES

O terremoto teve outra repercussão em Minas. Um alvará régio de 1756 estabeleceu duas novas celebrações religiosas em todo o Império português: uma pelo Patrocínio de Nossa Senhora – “como protetora nossa assim no passado como no futuro contra os terremotos”; e outra por São Francisco de Borja, “invocado e venerado como patrono e protetor de seus reinos, e domínios, contra os terremotos”.


PERTO DE COMPLETAR 150 ANOS EM OLIVEIRA...

Com muitas histórias e tradições, Oliveira, no Centro-Oeste de Minas, vai restaurar duas joias do seu acervo cultural e religioso. Perto de completar 150 anos da chegada à cidade, provenientes do Porto, em Portugal, as imagens de Nossa Senhora das Dores e Nosso Senhor dos Passos, presentes nas cerimônias da Semana Santa, sofrem com acelerado processo de degradação no suporte e na policromia. Foram alvo de ataque de cupins e apresentam perdas, fissuras, descolamentos generalizados, manchas, desgastes e alterações cromáticas, diz o tesoureiro da Confraria das Dores, Antônio Carlos Barcelos. Esculpidas pelo português João d’Fonseca Lapa, as peças estão desde 1876 na Capela dos Passos, vinculada à Paróquia Nossa Senhora de Oliveira.


...IMAGENS BARROCAS SERÃO RESTAURADAS

A restauração das imagens de Nossa Senhora das Dores e Senhor dos Passos está orçada em R$ 33,7 mil, recurso obtido por meio de emenda parlamentar estadual, conta Antônio Carlos Barcelos. “O dinheiro já está numa conta específica da Prefeitura de Oliveira. Articulei com o deputado estadual Lucas Lasmar e consegui a destinação do valor para o restauro das peças sacras”, afirma Barcelos, que é tesoureiro da Confraria das Dores e vereador em Oliveira. A restauração será feita pelo especialista Carlos Magno de Araújo, de São João del-Rei. Com vasta experiência na área, Carlos Magno participou dos serviços executados na Matriz Nossa Senhora de Oliveira, em 1990. Por medida de segurança, o local do serviço não será divulgado.


PAREDE DA MEMÓRIA

BH de outros tempos. Vejam os detalhes deste retrato da capital em 24 de abril de 1970. Fusquinhas, jipe, Aero Willys, Karmann Ghia e uma lambreta estacionados, casal “na moda” da calça boca de sino, um senhor de chapéu, o viajante certamente saindo da rodoviária e a mulher se equilibrando sob as compras, enquanto a jovem anda apressadamente. A cena ocorre diante da então Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, na Praça Rio Branco, no Centro. O prédio teve sua construção iniciada há 100 anos para ser alfândega, e ficava bem ao lado do Mercado Municipal, já demolido. Tombada pelo Iepha-MG em 1988 e pelo Conselho Deliberativo Municipal do Patrimônio Cultural, em 1995, a imponente construção já sediou a Secretaria de Estado de Turismo (2000) e, há 10 anos, sedia a 1ª Região Integrada de Segurança Pública da Capital (1ª Risp).


PRESENTE PARA O PAPA

Na sua recente visita ao Vaticano, o governador Romeu Zema presenteou o papa Leão XIV com um terço feito com delicadas flores de palma barroca. A peça, única e carregada de simbolismo, foi confeccionada por um grupo de cinco artesãs sabarenses: Dirleia Neves Peixoto, Hercilia Herculano, Luciana Ferreira, Neuza Chagas e Simone Pita, a convite da Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais. No encontro com o sumo pontífice, Zema destacou a qualidade e a tradição do artesanato da tricentenária cidade. Tendo como matéria-prima papel e tecido, e usada originalmente em celebrações religiosas, a palma barroca é uma herança do período colonial mineiro.


EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

No mês das crianças e dos professores, escolas mineiras festejam alunos e docentes e promovem atividades envolvendo a educação patrimonial, tanto em sala de aula como ao ar livre. No Serro, há oficinas, visitas guiadas e outras ações coordenadas pela Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Patrimônio. Como objetivo, fortalecer os laços da comunidade com a história local, a identidade e os bens materiais e imateriais. Com os mestres, a garotada conheceu mais sobre os monumentos, aprendeu sobre os antepassados e viu que, com respeito e zelo, é possível deixar um legado valioso às futuras gerações.


ARQUIVO PÚBLICO

Na comemoração dos seus 130 anos, o Arquivo Público Mineiro (APM), em BH, recebeu homenagem do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG). No sábado (25), houve solenidade especial com palestra e participação de associados e convidados. Criado em 1895 e vinculado à Secretaria de Estado de Cultura e Turismo, o APM tem a responsabilidade de planejar, executar e promover políticas de gestão, guarda, preservação e difusão de documentos públicos e privados de interesse histórico e social. Com vasto acervo que abrange do período colonial ao século 21, ele se consolidou como referência nacional em pesquisa histórica, arquivologia e gestão documental.

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