No Km 300 da BR-265, carretas ocupam as duas pistas da estrada na tentativa de fugir dos buracos -  (crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press)

No Km 300 da BR-265, carretas ocupam as duas pistas da estrada na tentativa de fugir dos buracos

crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press

Mesmo que a maior parte dos 84 quilômetros de estrada entre Lavras e São João del Rei estejam em condições ruins ou péssimas, situação corroborada por dados do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a conclusão de que o Km 300 é o trecho mais crítico da BR-265 não é difícil.

 

Difícil é para os motoristas de carretas, algumas com até 30 metros de comprimento, manobrar entre os vários buracos da pista – sem acostamentos – para evitar acidentes e prejuízos com a manutenção dos veículos. A falta de sinalização e o mato alto agravam os perigos da estrada.

Essa situação caótica não se restringe a este quilômetro da rodovia. Ao longo da estrada, os motoristas precisam frear ou reduzir a velocidade constantemente para evitar buracos com profundidade o suficiente para estourar os pneus, o que, na melhor das hipóteses, vai apenas causar prejuízos financeiros.

 

O Estado de Minas revisitou nos dias 5 e 6 de março o trecho, um ano após a publicação da reportagem “BR-265, a rodovia do caos entre Lavras e São João del-Rei”. Desta vez, a reportagem do EM testemunhou um acidente que poderia ter tido consequências muito piores por conta da péssima condição da estrada. Já adiantando a leitura, sim, o caos continua na rodovia.

 

Falta de conservação

Os buracos na BR-265 são tantos que parecem fazer parte da estrada. É difícil passar mais do que um minuto sem precisar desviar-se de algum. Como fizemos a nossa viagem de dia, eles até eram bem visíveis, justamente por conta do tamanho, mas estavam cheios de água, devido às chuvas dos dias anteriores. À noite, a situação é mais complicada, já que a visibilidade reduzida dificulta as manobras.

 

Um ponto importante é que só é possível desviar dos buracos pela contramão, afinal, a estrada não tem acostamento. Caso um motorista precise parar o veículo porque o pneu estourou, não há espaços nas laterais na maior parte do caminho. A estrada em geral é muito estreita, tendo pouco mais do que 7 metros de largura.

 

Os buracos e as curvas fazem com que a viagem entre Lavras e São João del Rei leve entre 1h30 e 2h. Isso dá uma velocidade média entre 42 km/h e 56 km/h, incompatível com o que se espera de uma rodovia federal.

Os buracos são constantes ao longo de toda a BR-265

Os buracos são constantes ao longo de toda a BR-265

Leandro Couri/EM/D.A Press

 

Mapeando os problemas

O Mapa de Condição da Manutenção, publicado em janeiro pelo Dnit, mostra que a maior parte do trecho entre Lavras e São João del-Rei está em condições péssimas (ICM maior do que 70) ou ruins (ICM entre 50 e 70). No Índice de Condição de Manutenção (IMC), quanto mais perto de 100, pior é a situação da via pública. As cidades são, respectivamente, a segunda e a terceira maior cidade do Campo das Vertentes.



A análise das condições das rodovias é feita pela autarquia a partir de diversos indicadores, como o número de buracos, remendos e áreas trincadas na estrada.

 

“A metodologia envolve, ainda, a análise da conservação da rodovia, com avaliação da altura da vegetação marginal, presença e condição dos dispositivos de drenagem e presença de dispositivos de sinalização horizontal e vertical”, explicou o Dnit em nota para uma reportagem do Estado de Minas, publicada em fevereiro deste ano.

 

 

Falta parte dos guarda-corpos da ponte sob o Rio Grande, em Itutinga

Falta parte dos guarda-corpos da ponte sob o Rio Grande, em Itutinga

Leandro Couri/EM/D.A Press

 

A ponte que cai

Nos poucos trechos em que a BR-265 pode ser considerada “melhor”, a situação ainda está longe do ideal. Onde não há buracos – há remendos, ondulações e rachaduras. O que continua em falta são os acostamentos.

 

Em Itutinga, a ponte sobre o Rio Grande é precária. Em uma das margens há alguns comércios, como um restaurante e um posto de combustíveis. Na outra ponta fica o núcleo urbano do município, há pouco mais de 2 km dali.

 

Atravessar a pé pela ponte é uma decisão que expõe os pedestres ao perigo real de atropelamento. A pista é estreita. Dois caminhões que estejam lado a lado ocupam quase toda a faixa de rolamento. Não há calçadas ou espaços para pedestres. Boa parte do guarda-corpo não existe mais. Há uma curva imediatamente ao final da ponte, o que força os motoristas de veículos grandes a esperar pela sua vez.

 

Um motociclista morreu em janeiro na construção, ao cair nas águas do Rio Grande, violentas devido à represa de uma usina hidroelétrica instalada perto dali.

 

Os buracos no Km 300 atrasam consideravelmente a viagem

Os buracos no Km 300 atrasam consideravelmente a viagem

Leandro Couri/EM/D.A Press

 

O trecho mais crítico

Seguindo a nossa viagem, logo chegamos ao problemático Km 300, pouco antes do trevo de Nazareno. Ficar parado ali por cinco minutos já é suficiente para presenciar mil e uma manobras feitas numa tentativa de fugir dos buracos.

 

Todos os motoristas, ao chegar ali, param os veículos completamente. Não apenas para avaliar qual estratégia adotar, como qual buraco fugir e qual dá para encarar, mas também para avaliar o que os colegas do sentido oposto vão fazer. Neste jogo de observação e paciência, o objetivo é não ter as peças do veículo devoradas pelas crateras na pista.

 

“Aqui você tem que tomar cuidado toda hora. É carro estourando pneu toda hora. Caminhão, se você passar [nos buracos], você quebra as molas”, afirma o caminhoneiro Claudinei Ferreira de Assis, de 51 anos, que roda neste trecho há 32 anos.

 

“Se você passar fora do buraco, desviar, você arrebenta os pneus, porque desloca eles. E o custo de um pneu desse é R$ 2 mil”.

Claudinei Ferreira de Assis, caminhoneiro

 

É preciso paciência e estratégia para superar o Km 300

É preciso paciência e estratégia para superar o Km 300

Leandro Couri/EM/D.A Press

 

Jogo de estratégia

Quem está num veículo pequeno, consegue fugir dos buracos, invadindo a contramão, num zigue-zague constante nesse trecho da BR-265. Quem conduz veículos grandes e pesados precisa manobrar com muita calma. Alguns caminhoneiros optam por atravessar a pista, desviando dos buracos pela contramão. Outros tentam passar por cima, com os buracos entre as rodas.

 

Há aqueles mais ousados, que tentam improvisar um acostamento no desnível entre a estrada e a lateral da pista. Alguns caminhoneiros optam por ir ali, deixando seus veículos inclinados, o que pode provocar um tombamento.

 

 

Enquanto estávamos gravando essas manobras, não foram poucos os motoristas que acenaram para a reportagem, mostrando o polegar para baixo, em sinal de reprovação para a condição crítica do trecho. Entre aqueles que verbalizaram, ouvimos que “está muito ruim” e que “é buraco demais”.

 

 O caminhoneiro Claudinei Ferreira de Assis, de 51 anos, roda no trecho entre Lavras e São João del-Rei há 32 anos

O caminhoneiro Claudinei Ferreira de Assis, de 51 anos, roda no trecho entre Lavras e São João del-Rei há 32 anos

Leandro Couri/EM/D.A Press

 

Duas estradas num mesmo trecho

O caminhoneiro Claudinei já perdeu muitos pneus por conta dos buracos na BR-265. Ele explica que à noite é a vez de os condutores de veículos pequenos sofrerem no trecho. “No caminhão, a gente vê o buraco de cima. O cara do carro, não. Dá de cara com o buraco, estoura pneu e direto a gente vê famílias ao lado da pista”, diz.

 

O caminhoneiro desabafa e comenta não entender porque a estrada é tão ruim até o trevo de Nazareno e melhora, depois, na sua sequência até Barbacena.

 

“Sou motorista há muito tempo e, quando passo por aqui, fico sem entender. Para um lado, a estrada é ruim e, para o outro, é boa? Porque não pode ser tudo, mesmo que não seja tudo bom, mas que tudo seja mais ou menos. Porque do jeito que está, é triste”, afirma.

 

Cruz em beira da rodovia BR-265

Cruz em beira da rodovia BR-265

Leandro Couri/EM/DA Press
 

 

Testemunhas de um acidente

Logo à frente do Km 300, a caminho de São João del-Rei, presenciamos um acidente que mostrou o perigo da BR-265, mesmo após o motorista passar pelo ponto mais crítico da estrada e os buracos cessaram.

 

Próximo ao Km 290, há curvas muito sinuosas e extensas. Numa delas, uma picape que estava 50 metros à nossa frente derrapou ao iniciar a curva à direita e girou três vezes na pista molhada devido à chuva de minutos antes. Neste momento, tivemos de sair às pressas do carro da reportagem para sinalizar aos motoristas que se aproximavam e evitar colisões. Mais a frente do local do acidente que presenciamos, vimos mais três cruzes.

Pouco a frente do Km 300, presenciamos uma picape derrapar na curva e rodar três vezes na pista

Pouco a frente do Km 300, presenciamos uma picape derrapar na curva e rodar três vezes na pista

Denys Lacerda/EM/D.A Press

 

O que diz o Dnit

O Dnit informou, em nota, que, no ano passado, contratou obras emergenciais de tapa-buracos e recapeamentos para o trecho entre a rodovia Fernão Dias (BR-381) e a cidade de Nazereno.

 

"Neste momento o Dnit realiza serviços de tapa-buraco e roçada, aguardando a liberação do licenciamento ambiental da usina de asfalto para dar início aos serviços de maior relevância, os quais devolverão boa trafegabilidade aos usuários do trecho. As obras serão de fresagem e recomposição, remendo profundo e recapeamento, além de manutenção da sinalização horizontal e vertical e dos dispositivos de drenagem, bem como controle da vegetação às margens da pista", informou a autarquia.