Charge do começo do século passado sobre o carnaval de rua de BH -  (crédito: Mannu Meg/EM/D.A Press)

Charge do começo do século passado sobre o carnaval de rua de BH

crédito: Mannu Meg/EM/D.A Press

O carnaval de rua de Belo Horizonte atraiu a atenção de foliões de todo o Brasil e virou notícia até no exterior em 2024. Desde a inauguração oficial da capital mineira, em 1897, o carnaval de BH passou ao menos por quatro momentos de auge e quatro de esvaziamento das ruas antes da mais recente onda de ocupação das vias da cidade, iniciada em 2009.

Consultamos o arquivo do Estado de Minas para construir uma linha do tempo das várias fases do carnaval de rua de BH desde o começo do século passado. São reportagens e crônicas selecionadas com a ajuda da responsável pela Gerência de Documentação e Informação do EM, Irene Campos, que revelam como os moradores da capital mineira viviam a folia de Momo e como a festa movimentava ou não a cidade.

 

Anos 1920: o despertar da festa

BH era uma jovem capital, mas a festa de rua dos carnavais da época já era conhecida e disputada pelos moradores que ainda se acostumavam com o crescimento do antigo Arraial do Curral del Rei. Pela edição do Estado de Minas de 1º de fevereiro de 1929 é possível saber a relevância que as festas de rua tinham para a cidade. No começo do século passado, as batalhas de confetes e serpentinas ditavam a folia.

“Os grandes preparativos para os três dias de alegria. A filmagem que ‘O Estado de Minas’ fará do carnaval e dos blocos carnavalescos”, destaca a manchete da edição da sexta-feira do primeiro dia de fevereiro daquele ano. Em 14/2/1929, a quinta-feira logo após o feriado, o registro de que, mesmo com as fortes chuvas na capital, a população foi às ruas. “Embora grandemente prejudicado pela chuva, estiveram animados os festejos de Momo este anno. O carnaval de 1929 foi filmado pela ‘Libertas film’ sob o patrocínio do ‘O Estado de Minas’.”

Edições do Estado de Minas documentam o carnaval em BH desde os anos 1920

Edição de 1931 destacava que nem a crise econômica atrapalharia o carnaval de rua de BH

Mannu Meg/EM/D.A Press

Anos 1930: corsos nas avenidas

A década começou animada, com várias notícias circulando de que os carnavais de 1931, 32 e 33 seriam históricos para a cidade. Em 7 de fevereiro de 1931, a página 8 do Estado de Minas destacava: “A cidade vae vibrar hoje na batalha de confetti da Avenida Paraúna (atualmente Getúlio Vargas) – As batalhas de amanhã na praça da Liberdade e Floresta.”

Os corsos, que eram um tipo de agremiação carnavalesca que desfilava sobre carros abertos, se destacavam nas ruas de BH na década e deram grande contribuição para aumentar o número de pessoas que curtiam o carnaval na cidade.

Edições do Estado de Minas documentam o carnaval em BH desde os anos 1920

Batalhas de confetes prometiam tomar as ruas do Centro de BH em 1939

Mannu Meg/EM/D.A Press

 

A década marcou proliferação desses blocos, que se esforçavam para criar nomes que chamasse a atenção nas páginas do EM. Na edição de 15 de fevereiro de 1931, a crônica carnavalesca da época mostrava uma mudança de ares na folia: “Quem foi que inventou que Bello Horizonte é uma cidade triste?”.

Abaixo, algumas agremiações que iriam às ruas naquele ano: Anjinhos do Céu (Calafate), Bro'co das Pobre Suberba (Barro Preto), Choro Marabá (Santo Antônio) e os Marinheiros Futuristas, sem bairro identificado, mas que, apesar do nome, homenageavam o “football”.


Anos 40: das ruas para os clubes

As disputas de confetes e serpentinas movimentavam o comércio de BH, com lojas dedicando seções inteiras à folia. E muitos anúncios, como o da Casa Mômô, na Avenida Afonso Pena, 580, que vendia todo tipo de adereços e se orgulhava de destacar em suas publicidades um aviso: “Attenção. Cuidado com as falsificações. Nós lhe vendemos o legítimo”.

Porém, o começo da década trouxe o primeiro grande esvaziamento das ruas. “O carnaval Belorizontino saiu da rua e foi para os clubes”, destacou a edição do Diário da Tarde em 16 de fevereiro de 1942.

 

Leia também: 1940, nasce o Leão da Lagoinha, o primeiro bloco de rua de BH

 

A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) também contribuiu. Em 1944, Belo Horizonte não teve festa nas ruas, mas, passado o conflito, as pessoas voltaram a ocupar as ruas e o carnaval ressurgiu. “A maior festa popular já realizada na capital. Enorme multidão aplaudiu as sereias cariocas”, informava a edição de 14 de fevereiro de 1947 do EM.

E foi assim até o fim da década. “O maior espetáculo do carnaval mineiro. A batalha real alcançou sucesso sem precedentes”, dizia o jornal em 25 de fevereiro de 1949 e, dois dias depois, “O carnaval tomou conta da cidade. Grande animação nas ruas e nos clubes.”

Edições do Estado de Minas documentam o carnaval em BH desde os anos 1920

Nos anos 1950, o belo-horizontino trocou o carnaval de rua pelos salões

Mannu Meg/EM/D.A Press
 

 

Anos 1950: do recorde à queda

Começou bem, como informava a edição do EM de 14 de fevereiro de 1950. "Todos os foliões da cidade na 'Batalha Real'. Nunca houve tanto interesse, como esse ano, pelo maior acontecimento do carnaval.” Porém, a festa histórica daquele ano, que atraiu 100 mil pessoas para o Centro de BH – quase um terço dos cerca de 352 mil moradores da época, segundo o IBGE – foi seguida de muitos registros policiais e atendimentos médicos.

Não demorou para parte do público trocar as ruas pelos bailes fechados em clubes e agremiações. “Em franca decadência o carnaval de rua em Belo Horizonte. Acentua-se o declínio da folia a céu aberto”, destacou o EM em 28 de fevereiro de 1952.

 

 

Anos 1960: “me dá um dinheiro aí”

A famosa marchinha “Me dá um dinheiro aí!”, composta em 1959 pelos irmãos Homero Ferreira, Glauco Ferreira e Ivan Ferreira, e gravada por Moacyr Franco, poderia ter sido o hino do carnaval de BH no início da década de 1960. “Carnaval mineiro decai por falta de estímulo”, dizia o Estado de Minas de 28 de fevereiro de 1960. A falta de investimento na festa de rua fez ela quase desaparecer. Quase.

Os blocos e escolas de samba mantiveram a chama da festa de rua viva, como fizeram em quase todos os momentos de esvaziamento da folia popular. “30 blocos e oito escolas de samba hoje na Batalha Real. Avenida Afonso Pena será cenário da maior festa carnavalesca da capital”, destacou a edição de 9 de fevereiro de 1961. “Em ação os blocos e escolas de samba”, informava o EM dois dias depois.

 

Anos 1970: triunfo das escolas e blocos caricatos

A década foi importante para consolidar a força das escolas de samba de BH e os blocos caricatos, referência de festa popular numa capital na qual a população fugia para outras cidades de Minas ou do litoral durante o feriado.

Na segunda metade dos anos 1970, a importância das agremiações ocupava destaque nas páginas do Estado de Minas e do Diário da Tarde. “Corso, lança-perfume, batalhas: vamos recordar o bom da folia” (DT 3/2/78) e “Blocos caricatos, uma velha tradição do carnaval de Belo Horizonte” (EM 4/2/78). Neste mesmo dia, o jornal contava a história das 17 escolas de sabam de BH e detalhava os sambas-enredos.

 

Anos 1980: bailes populares

Os desfiles das escolas de samba e dos blocos caricatos mantinham a festa de rua viva na cidade. Entre as agremiações, uma fez história na primeira metade da década de 80. “Escola de Samba Cidade Jardim, a grande campeã”, informava o EM em 18 de fevereiro de 1983. Façanha repetida no ano seguinte. “Cidade Jardim, a grande campeã do carnaval de Belo Horizonte.” (EM 9/3/84).

Nas regionais de BH, os bailes populares fizeram sucesso das famílias no fim da década e no começo dos anos 1990, com exceção de 1989, quando a festa de rua foi cancelada.

 

Anos 1990: o apelo das ruas

“Sem verba. BH fica sem carnaval de rua”, assim começou a década, segundo informou o Diário da Tarde de 8 de janeiro de 1991. Enquanto isso, nas regionais a festa popular se dividiam entre os bailes grátis em locais fechados e as ruas. “Bailes populares continuam sendo a principal atração do Carnaval em BH”, informou o Estado de Minas de 22 de janeiro de 1993.

No ano seguinte, a crônica carnavalesca resgatou uma tradição. “Carnaval “Prapular” não é novidade em BH. Nos bairros da capital, as bandas arrastam há anos milhares de pessoas para as ruas”, destaca o EM de 13 de fevereiro de 1994.

 

Leia também: Internautas resgatam vídeo sobre Carnaval de BH nos anos 90

 

Os últimos anos da década de 1990 trouxe um apelo pelo retorno do carnaval de rua em BH. Na edição de 18 de fevereiro de 1998 o Estado de Minas questionava: “Por que parou? Parou por que? Polêmica sobre a importância do carnaval em Belo Horizonte divide autoridades e sambistas”.

Quatro dias depois, outra reportagem destacava o sentimento de parte da população de resgatar o carnaval de rua da capital. “As cuícas e tamborins silenciaram. Saudade é a palavra de ordem para as pessoas que viveram em tempos áureos, na época em que o carnaval fervilhava em Belo Horizonte.”

 

Anos 2000: semente plantada

A década começou sem muitas mudanças no cenário da festa de Momo. O abre-alas da Banda Mole no pré-carnaval era a deixa para a temporada de grande movimento; na rodoviária de BH. A debandada da cidade no feriado era uma rotina e boa parte dos foliões buscavam as animadas festas em cidades históricas como Ouro Preto, Mariana, Diamantina ou São João del-Rei.

Foi assim até quase o fim da década. No carnaval de 2008, o Estado de Minas fez uma reportagem mostrando um comparativo do carnaval de BH de 2008 com o de 2018. No primeiro, a Praça Sete, local de maior movimento da capital mineira, estava completamente vazia em 4 de fevereiro, uma segunda-feira de folia. Sem pedestres e sem carros. Uma década depois, em 12 de fevereiro, também uma segunda-feira de carnaval, uma multidão tomava o local para acompanhar os blocos de rua.

O carnaval de 2009 é apontado como o ponto de retomada da festa dos blocos de rua na cidade. Uma semente de alegria e retomada dos espaços públicos que levaria ao crescimento do carnaval de BH como conhecemos atualmente.

 

Mapa dos blocos de BH

Veja data, local e horário de desfile dos blocos de rua do carnaval de BH 2024 neste mapa interativo atualizado diariamente. Baixe o mapa dos blocos de carnaval de BH para acompanhar as centenas de desfiles grátis nas ruas da capital mineira.