Minissérie "Washington Black" mostra grandiosa trajetória de um homem negro
Na produção recém-chegada ao catálogo do Disney+, protagonista que nasceu escravizado se torna livre, abraça a ciência e se entrega ao amor
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George Washington (1732-1799) está entre as figuras mais importantes da história dos Estados Unidos. Liderou tropas durante a Guerra de Independência e foi presidente do país por oito anos. Não seria surpresa que alguém que levasse o mesmo nome estivesse destinado à grandeza.
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Esse é o caso de George Washington Black, protagonista da minissérie do Disney+ “Washington Black”, lançada neste mês. A obra é uma adaptação do romance homônimo da autora canadense Esi Edugyan, publicado em 2018.
Wash, apelido do garoto, é um menino negro de 11 anos, que nasceu escravizado. A narrativa o acompanha em dois momentos: ainda na infância, em 1830, como escravo em uma plantação de açúcar em Barbados, e em 1837, já como um adulto livre, em Halifax, na Nova Escócia. Nas duas fases, o protagonista tem uma rotina pacata, até se encontrar, primeiro, com a ciência e, depois, com o amor.
Fuga de balão
Em Barbados, interpretado por Eddie Karanja, o protagonista é servo de Erasmus Wilde (Julian Rhind-Tutt). Um dia, o irmão abolicionista Christopher Wilde (Tom Ellis), conhecido como Titch, chega à fazenda e percebe em Wash o potencial para a ciência. Os dois se tornam amigos, até que o garoto é acusado de matar o terceiro irmão Wilde, Philip (Chris Patrick-Simpson), e eles precisam fugir juntos no balão dirigível que estavam construindo.
Nessa odisseia de mentor e pupilo, Wash conhece o mundo ao estilo das histórias de Júlio Verne. Ele voa, desenha, aprende a ler e escrever, encontra piratas, descobre o mar e a neve, e conhece novos animais. Na perspectiva de um menino inocente, as cenas são em planos abertos, com cenários coloridos e trilha sonora clássica de fantasia, assinada por Cameron Moody.
Apesar de a maioria das experiências ser vivida ao lado de Titch, quem ensina o protagonista a nadar é um dos piratas, um homem negro. Barrignton (Miles Yekinni) e Wash compartilham um momento semelhante ao de Juan e Little em “Moonlight: sob a luz do luar” (2016), no qual o ato de ensinar um menino negro a nadar se torna sinônimo de paternidade. “Ele me ensinou a nadar”, diz Barrington, ao abandonar o barco para acompanhar um companheiro exilado.
A alternância entre cenas de aventura e de preconceito racial dinamiza a obra, mas dificulta o impacto dramático. Isso porque é do interesse da série destacar o drama vivido por pessoas negras, seja durante a escravidão, seja nos primeiros anos após a abolição, quando ainda havia forte resistência da sociedade branca. No entanto, a rápida transição entre momentos de rejeição e viagens paradisíacas é contraditória.
Nome falso
No início da vida adulta, George Washington Black adota o nome falso Jack Crawford, para despistar os caçadores que querem vingar a morte de Philip. Agora interpretado por Ernest Kingsley Junior, o protagonista trabalha descarregando os navios que chegam a Halifax, mas tem o sonho de construir o próprio avião.
Nessa fase, ele conhece a jovem mestiça Tanna (Iola Evans), filha de um integrante da liga de cientistas da Nova Escócia. Apaixonado, Wash mantém o mesmo espírito fantasioso de quando era criança, acreditando em um final feliz para o casal, embora assuma um tom mais sóbrio a partir do que sofreu.
O tempo da série não é cronológico, e as idas e vindas servem tanto para contextualizar quanto para ocultar algumas informações do espectador. No entanto, os flashbacks da infância de Wash seguem até o último episódio, e informações importantes sobre essa fase são postergadas, comprometendo o desenvolvimento e a compreensão completa do personagem.
Wash é um garoto esperançoso e ingênuo, cuja trajetória exige do espectador certa dose de credulidade. Em todas as fases da vida, conta com o apoio de terceiros para alcançar seus objetivos e até mesmo para sobreviver. A maioria dos adultos simpatiza com ele como um ato de boa-fé e uma aposta em um futuro melhor.
Ele teve a rara oportunidade de sobreviver aos campos de açúcar e crescer sem o jugo da escravidão, ainda que em um ambiente por vezes hostil. Representa, para os muitos personagens que o ajudam ao longo da jornada, um futuro melhor. Está livre na terra, no céu e no mar.
“WASHINGTON BLACK”
A minissérie, com oito episódios, está disponível no Disney+.
*Estagiária sob supervisão da editora Silvana Arantes