Daniel Fernández Strauch, sobrevivente do voo 571, elogia a

Daniel Fernández Strauch, sobrevivente do voo 571, elogia a "autenticidade" do filme "A Sociedade da Neve"

crédito: Eitan Abramovich/AFP

Pablo Vierci nunca se esquecerá do momento em que ouviu os 16 nomes. Estavam vivos dois meses depois da queda de um avião nos Andes! Meio século depois, o filme sobre sua incrível epopeia homenageia também os 29 que morreram. 

“Faltava contar a história global”, afirma Vierci, produtor associado do filme “A Sociedade da Neve”, autor do livro homônimo sobre o famoso acidente aéreo de um grupo de uruguaios na cordilheira entre Argentina e Chile em 1972. 

“Tendemos a focar muito nos sobreviventes, porque era tão desmedido, tão épico o que eles haviam conseguido, que ficaram nas sombras os outros 29. Em um caso bastante atípico, os 16 estão vivos graças ao fato de que houve mortos”, diz Vierci, colega de escola e vizinho de muitos passageiros do fatídico voo 571. 

Doze pessoas morreram em 13 de outubro de 1972 quando um avião da Força Aérea Uruguaia, fretado para levar uma equipe de rúgbi amadora, amigos e familiares, caiu no Vale das Lágrimas, nos Andes argentinos, a quase 4 mil metros de altitude. Outros 17 morreram depois na montanha. 

Ao final de uma odisseia heroica, dois sobreviventes conseguiram chegar ao Chile para pedir ajuda e os outros foram resgatados após suportarem 72 dias de frio extremo, obrigados a consumir a carne dos mortos. 

Este “pacto de entrega mútua” na imensidão da neve comoveu o cineasta espanhol Juan Antonio Bayona, que leu o livro de Vierci enquanto filmava “O impossível”, em 2011. 

De festivais ao streaming

Ovacionado no Festival de Veneza, premiado no festival de San Sebastián e escolhido para representar a Espanha no Oscar 2024, o filme chega nesta quinta-feira (4/1) à plataforma Netflix. 

A impactante história já foi tema do longa mexicano “Sobreviventes dos Andes” (1976), de René Cardona, e da produção hollywoodiana “Vivos” (1993), de Frank Marshall, com Ethan Hawke e Josh Hamilton. Também inspirou o documentário “A Sociedade da Neve” (2007), do uruguaio Gonzalo Arijón. 

Porém, o filme de Bayona é especial porque cumpre premissas imprescindíveis: tem a anuência de todos os sobreviventes e enlutados, é falado em espanhol e mostra o “não desistir” que é parte da idiossincrasia uruguaia, segundo Vierci. 

"A Sociedade da Neve" respresenta a Espanha no Oscar 2024

"A Sociedade da Neve" respresenta a Espanha no Oscar 2024

Netflix/divulgação

Não é cinema de catástrofe, nem filme de aventura ou thriller. “É uma experiência emocional inspiradora, no limite entre a vida e a morte, e, não obstante, de esperança”, resume o escritor, de 73 anos. 

Para seu amigo Daniel Fernández Strauch, que tinha 26 anos quando ficou preso na montanha e ainda se emociona ao se lembrar da tragédia, o grande acerto de Bayona é a autenticidade. 

“Neste longa, as pessoas vão entender o que passamos”, garante o hoje engenheiro agrônomo aposentado, de 77 anos. 

“Até a sensação de frio volta. É de um realismo total. A história é bastante dura, mas está muito bem contada”, acrescenta Fernández Strauch, que, com os primos Eduardo e Adolfo Strauch, organizava o alimento, “a tarefa mais horrível de todas”. 

Este homem magro, que ainda conserva a jaqueta e os óculos do piloto falecido no acidente, ressalta a obsessão de Bayona pelos detalhes, “desde a etiqueta de um sapato até a reconstrução do aeroporto de Carrasco”. 

Strauch destaca as conversas com Francisco Romero, o ator argentino que o interpretou, algo que não ocorreu nas outras reconstituições. 

A filmagem de “A Sociedade da Neve” levou 141 dias não consecutivos, com locações na Espanha, Argentina, Chile e Uruguai. Foi dificultada pela pandemia. Contudo, o mais inesquecível foi a projeção especial do longa para os sobreviventes, suas famílias e todos os enlutados, em 1º de setembro do ano passado, em um cinema da capital uruguaia. 

Fernández Strauch não esconde a emoção ao recordar este momento. “O abraço final de todos era como se a cordilheira tivesse vindo para Montevidéu. Estávamos todos lá”, afirma. 

“A SOCIEDADE DA NEVE”

Espanha, Uruguai, EUA e Chile, 2023. Direção de J.A Bayona. Com Agustin Pardella, Francisco Romero e Simon Hempe, entre outros. Em cartaz a partir desta quinta-feira (4/1) na plataforma Netflix.