"Estância", coreografia criada por Rodrigo Pederneiras sob encomenda da Orquestra Filarmônica de Los Angeles, estreou nos EUA e depois foi apresentada em BH

crédito: José Luiz Pederneiras/Divulgação

Para as artes cênicas produzidas em Minas Gerais, 2023 foi um ano de tomar fôlego e apertar o passo para seguir adiante e recuperar o tempo perdido. Após o estrago causado pela pandemia e pelo governo Bolsonaro, quando o cenário cultural brasileiro ficou à míngua, companhias teatrais e de dança reativaram seus processos criativos e viram o público retornar em peso às casas de espetáculos.

Em sua 48ª edição, a Campanha de Popularização do Teatro e da Dança de Belo Horizonte, que abriu o calendário cultural da cidade, no dia 5 de janeiro, foi indicativa dos bons ventos que soprariam para o segmento. Ela vinha de duas edições comprometidas pela pandemia. Em 2021, o Sindicado dos Produtores de Artes Cênicas de Minas Gerais (Sinparc) realizou apenas uma pequena edição on-line. No ano passado, a Campanha voltou ao formato presencial, mas ainda acossada por um cenário epidemiológico desfavorável.

Com 112 espetáculos compondo a programação, a 48ª edição superou as expectativas mais otimistas: ao longo de pouco mais de um mês, foram vendidos mais de 100 mil ingressos. Tanto montagens que integraram a Campanha pela primeira vez – como "E ainda assim se levantar", da Cia. Luna Lunera, e "Desmonte", do Grupo Girino – quanto velhas conhecidas do público – - "Acredite, um espírito baixou em mim" ou "Defunto bom é defunto morto", entre elas – atraíram públicos numerosos, segundo a coordenação do evento.


FORÇA TOTAL

Companhias consagradas do estado voltaram à carga com força total. O Grupo Galpão apresentou, no início de junho, sua nova peça, "Cabaré Coragem", que cumpriu uma exitosa temporada ao longo daquele mês. Inspirado em Brecht e sob direção de Júlio Maciel, o espetáculo celebrou, no Galpão Cine Horto, "o fim dos anos opressores em que artistas foram desprezados no Brasil", na definição da própria trupe.

O Galpão teve que se reinventar durante a crise sanitária, apostou em produtos audiovisuais, trabalhou remotamente e, em 2022, retomou as atividades presenciais, em meio às comemorações de seus 40 anos. A montagem inédita, contudo, só veio depois de um ano de experimentações. O grupo também promoveu, ao longo do mês de agosto a quinta edição de sua Mostra de Monólogos, com apresentações de nove solos em sua sede.

Já o Grupo Giramundo, com mais de meio século de história, esteve empenhado, ao longo de 2022 e também este ano, em reconstruir e levar de volta aos palcos espetáculos que marcaram sua trajetória. Um dos resultados desse investimento foi uma pequena mostra retrospectiva apresentada na primeira quinzena de novembro, no Centro Cultural Unimed-BH Minas, com as montagens de "Pinocchio", "Os orixás" e "A bela adormecida".


INCERTEZAS DA PANDEMIA

A Cia. Luna Lunera também chegou a 2023 com espetáculo novo no embornal: "Aquela que eu (não) fui", que estreou no CCBB-BH no dia 25 de agosto e cumpriu temporada de um mês, dentro das comemorações pelos 10 anos do equipamento cultural. A montagem tem texto inspirado pelas incertezas da pandemia e lida com as possibilidades não vividas de 10 personagens, interpretados pelos atores Cláudio Dias e Marcelo Soul, fundadores da Luna Lunera, e pelas atrizes convidadas, Joyce Athiê e Renata Paz.

Estruturada em capítulos, dirigidos por Vinícius Arneiro (RJ), Marina Arthuzzi (BH), Lucas Fabrício (BH) e Isabela Paes (BH), a peça transita em torno de fragmentos das trajetórias desses personagens – que podem aparecer novamente ou não a cada capítulo – , que se deparam com situações nas quais se instala algum tipo de ruptura, de mudança, pequena ou grande, determinada pelos desejos íntimos de cada um ou mesmo alheia às suas vontades.

Quem também escolheu trabalhar com diferentes diretores em sua nova empreitada foi o Grupo Quatroloscinco. Para celebrar seus 15 anos de trajetória, a trupe levou aos palcos no entorno da praça da Estação – Funarte, Teatro Espanca e Centro Cultural UFMG – , em agosto, o "Encontro comum", projeto de três experimentos cênicos em parceria com os diretores Eid Ribeiro, Ricardo Alves Jr. e Sara Rojo.


CORPO EM DESTAQUE

No campo da dança, o destaque do ano foi o Grupo Corpo, que abraçou um projeto grandioso e inédito em seu percurso de quase cinco décadas. No dia 18 de julho, a companhia estreou "Estância" no Hollywood Bowl, anfiteatro com capacidade para 18 mil pessoas, em Los Angeles.

No palco monumental do espaço a céu aberto havia mais de 100 pessoas, entre bailarinos e instrumentistas da Orquestra Filarmônica de Los Angeles, sob regência do prestigiado maestro venezuelano Gustavo Dudamel.

Foi ele quem encomendou a Rodrigo Pederneiras a coreografia para o balé do argentino Alberto Ginastera (1916-1983). Depois dos Estados Unidos, a montagem chegou a Belo Horizonte, no início de agosto, quando os bailarinos do Corpo se apresentaram ao lado da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, sob a batuta de seu regente titular, Fabio Mechetti. Foram quatro concorridas sessões na Sala Minas Gerais.

A companhia, por meio de seu braço social, o Corpo Cidadão, também ofereceu ao público da cidade o espetáculo "Colheita", com jovens talentos que integram o Grupo Experimental de Dança, criado no bojo do projeto. Com coreografia assinada por Mário Nascimento, atualmente à frente do Corpo de Dança do Amazonas, a montagem foi apresentada no final de novembro, no Cine Theatro Brasil Vallourec.