A argentina Alejandra Rodríguez, de 60 anos, foi eleita Miss Universo -  (crédito: MARCOS GOMEZ/AFP)

A argentina Alejandra Rodríguez, de 60 anos, foi eleita Miss Universo

crédito: MARCOS GOMEZ/AFP

 

Na mesma semana em que comemoramos o fato de que o Miss Universo, ao eliminar a restrição etária, possibilitou que a argentina Alejandra Rodríguez, de 60 anos, se inscrevesse e se tornasse a primeira mulher madura a vencer uma etapa da competição, somos surpreendidos com uma outra notícia, essa não tão boa. O concurso para eleger a Miss Alemanha, que não é diretamente ligado ao Miss Universo, teve como vitoriosa a arquiteta de origem iraniana Apameh Schonauer, de 39 anos, no entanto, após a vitória, as redes sociais da ganhadora foram inundadas com comentários pouco elogiosos sobre sua origem, aparência e idade.


O Miss Alemanha, ao contrário de outros concursos de beleza, não se volta unicamente para a análise dos caracteres físicos das candidatas. O objetivo é escolher mulheres que, além de sua aparência, mostrem personalidade e compromissos com causas sociais. Apameh Schonauer, que é casada e mãe de dois filhos, foi escolhida pela defesa dos direitos das mulheres e por ajudar imigrantes na adaptação à vida na Alemanha. No entanto, nas redes sociais a vencedora foi comparada à bruxa do filme A Branca de Neve e teve sua vitória contestada por não se enquadrar nos padrões de beleza dominantes.


Antes de Apameh Schonauer, no ano de 2022 a modelo brasileira Domitila Barros, de 37 anos, foi eleita Miss Alemanha. Ela se tornou a primeira imigrante negra a vencer o concurso, que, a partir de 2020 foi reestruturado para permitir que mulheres maduras participassem e que fosse levado em consideração outros atributos que não apenas o físico. Domitila foi escolhida como vencedora por várias razões, mas uma das principais foi a sua atuação em projetos sociais, dentre eles a criação de um método de ensino da leitura e da escrita associado à música e à dança.


Contudo, ela também não ficou de fora dos comentários ácidos das redes sociais, e o mesmo aconteceu com a Miss França, eleita em dezembro de 2023, que foi ofendida por ter cabelos curtos e ser excessivamente magra, segundo seus críticos. A Miss Universo Portuguesa também foi severamente criticada nas redes por ser transsexual e a Miss Japão, de ascendência ucraniana, recebeu inúmeras mensagens de ódio por não ter feições asiáticas.


Esses eventos são uma mostra preocupante de como os padrões de beleza tradicionais ainda dominam grande parte da percepção pública, mesmo naqueles concursos que tentam modernizar e ser mais inclusivos. As críticas que essas mulheres enfrentaram após suas vitórias demonstram como nossos preconceitos e estereótipos continuam arraigados, influenciando negativamente a forma como as pessoas veem e tratam os indivíduos que não se encaixam nos moldes tradicionais.


Essa constatação lança um desafio para os organizadores de tais eventos, que precisam encontrar meios de proteger suas candidatas, garantindo que o espaço seja seguro e acolhedor para todas. Mas de outro lado, lança também um desafio para o legislador: o de disciplinar o mundo virtual para que nele uma ofensa seja tão grave quanto aquela praticada cara a cara, uma vez que o mal que ela faz transcende às redes e atinge diretamente o sujeito.


Os concursos de beleza têm nos mostrado que é urgente uma discussão mais ampla sobre respeito e inclusão; e que é necessária uma legislação que coíba a discriminação e o cyberbullying, garantindo que nossas conquistas não sejam diminuídas por comentários hostis e preconceituosos, vindos de pessoas que muitas vezes nem sabemos quem são.