"Bebê Rena", disponível no catálogo da Netflix, conta uma história de fato vivida por seu protagonista

crédito: Netflix/Divulgação

 

 

A nova série da Netflix “Bebê Rena” viralizou. Donny Dunn, o personagem na série, é Richard Gadd (também diretor e roteirista), comediante escocês em sua história real sendo perseguido por uma stalker (termo em inglês que define alguém que persegue outra pessoa de maneira obsessiva, seja na internet ou fora dela).

 


Quando o trailer de “Bebê Rena” foi lançado, no início de abril, parecia que seria uma mistura comum de drama e comédia, uma história alegre de um comediante com uma stalker. Só que não. É um trabalho sobre o sofrimento e o abuso de uma pessoa vulnerável. A análise que o próprio personagem faz de si mesmo em relação à sua colaboração ou seu vacilo em não cortar certos avanços é muito interessante. Mas não irei além.

 

 


Apenas esclareço que, hoje, o que chamamos de stalker significa perseguidor e consideramos na psicanálise que é grande e grave sofrimento psíquico. Clérambault, psiquiatra francês, entendia como loucura de amor ou erotomania, classificando-a entre os delírios passionais.

 


As pessoas que sofrem de erotomania perdem a capacidade de lidar com a realidade e acreditam no delírio com uma certeza absoluta. Porém, quando a prova da realidade se impõe, as reações podem ser agressivas e violentas.

 

 

Exemplos

 

Temos dois exemplos clássicos na psicanálise: Aimée (1924) atentou contra uma das atrizes mais famosas do público parisiense na época. Munida de uma faca de caça, Aimée aproxima-se da atriz e pergunta se ela é ela mesma. Após ouvir a confirmação, lança-se sobre a atriz com a faca em punho e com o olhar injetado de ódio.

 


Do atentado, a atriz saiu com dois tendões da mão seccionados ao tentar se defender. Dominada pelos presentes, Aimée é conduzida à delegacia. Convocada a explicar seu ato, responde projetivamente que há muitos anos é a atriz que faz “escândalos” contra ela. Zomba dela, ameaçando-a.

 


Também o crime das irmãs Papin, 1933, domésticas que matam a família a quem serviam e depois deitam-se abraçadas esperando a polícia. Eram filhas de um pai alcoólatra e uma mãe sem vocação para a maternidade.

 


As duas primeiras filhas foram criadas num orfanato e, quando a terceira completou 13 anos, levou-a com a segunda filha para uma casa de família como domésticas. Este tipo de delírio é também um exemplo dramático do retorno do que havia sido reprimido por pessoas sistematicamente segregadas.

 


A reação do público à série foi forte e também passional. Algumas pessoas passaram a procurar a possível perseguidora na vida real, que hoje afirma ser ela própria a vítima e ameaça defender-se judicialmente, e o mesmo fizeram com outro personagem, causando problemas.

 


Gadd interveio e declarou que estas pessoas não compreenderam a mensagem da série e estão, elas também, agindo como stalkers.

 


Esta reação mostra como a série causou grande impacto emocional e invasão nas redes sociais, que muitas vezes pode ser facilitada pelo excesso de exposição da vida privada.