

O economista necessário ganhou o Nobel
"É só olhar para quem dá certo de forma sustentável no mundo que se descobre que tipo de economista o país tem, ou precisa"
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Não é por causa da economia que muitos economistas cresceram em sucesso e influência no mundo. Mas porque aprenderam a aplicar o método de investigação e análise da economia para explorar e explicar quase todos os aspectos da sociedade, incluindo comportamentos, estruturas, relações e instituições sociais.
Um exemplo curioso desse interesse por quase todas as coisas é o estudo publicado em 2006 por Liran Einav e Leeat Yariv, dois economistas radicados na Califórnia. A pesquisa aparentemente estranha investigou como as iniciais dos sobrenomes influenciam as carreiras acadêmicas no campo da economia, analisando professores dos 35 principais departamentos de economia dos EUA.
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Os autores observaram que docentes com sobrenomes que começam com letras do início do alfabeto têm mais chances de conquistar estabilidade nos 10 principais departamentos. E de receber medalhas e prêmios como o Nobel.
Numa análise muito bem fundamentada, Einav e Yariv mostram que os resultados se mantiveram consistentes mesmo após o controle de variáveis como país de origem, etnia e religião. A fim de comparação, o estudo explorou o mesmo efeito em departamentos de psicologia, onde a ordem alfabética para coautores não é a norma, e não encontrou relação entre as iniciais dos sobrenomes e o sucesso na carreira. Os autores concluem por sugerir que essa “discriminação alfabética” deve estar ligada à prática comum na economia de listar coautores em ordem alfabética.
Pois bem, agora em outubro, um potencial beneficiário do efeito descrito acima foi finalmente agraciado com o Nobel de Economia: Daron Acemoglu. Professor catedrático do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), ganhador do Nobel de Economia, Acemoglu é um dos 10 economistas vivos mais citados em publicações acadêmicas no mundo. Dentre os 10, Acemoglu, com 57 anos, é um dos mais novos e era um dos poucos ainda sem o prêmio.
Mas não só pela letra A que a obra produzida por Acemoglu tem notável impacto. Sua alta qualidade foi construída com alguns coautores, entre eles os britânicos Simon Johnson e James Robinson, laureados com o Nobel juntamente com o turco Acemoglu.
Os três acadêmicos radicados nos EUA são expoentes da vertente econômica que se debruça sobre a importância das instituições para o desenvolvimento dos países. Descartar a roupagem formal matemática de gráficos e tabelas necessária para angariar respeitabilidade dentro das ciências econômicas foi obra pioneira de Douglass North lá nos idos dos anos 1970.
Vale a pena, então, lembrar o que são as “instituições” para North: elas são as “regras do jogo” nas diferentes arenas em que interagem os seres humanos – sejam os mercados, a política, ou os círculos de amizade e intimidade, e por aí afora. E por “regras”, entende-se tanto as escritas quanto as tácitas.
Pois bem, fica claro que o institucionalista Acemoglu se beneficia também dessa instituição de ter o sobrenome começado com “A” e é logo seguido por um “C”. É muito comum que nos artigos publicados no campo do desenvolvimento econômico e áreas afins Acemoglu encabece a lista de referências ao final dos trabalhos. Por alguma razão psicológica inusitada, as pessoas tendem a achar mais importante quem vem listado primeiro, mesmo sendo a ordem alfabética.
Por mais que isso seja um fator completamente de “sorte” – ou seja, ter seu sobrenome iniciado por “A” ou outra letra próxima a “A” –, o fato é que isso tem um impacto real na fortuna do autor, para além de suas qualidades intrínsecas que possua.
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O que é também curioso é que Acemoglu fez sua carreira justamente contra o argumento de que o crescimento econômico é causado por “sorte”, ou aleatoriedade e contingência, o qual representa uma vertente clássica e relevante, ainda que pouco compreendida, das explorações sobre a causa da riqueza e da pobreza das nações. Acemoglu é da tradição que enfatiza a preeminência das “diferenças institucionais”, e não do acaso ou da geografia como causa do desenvolvimento.
No inspirador artigo de 2005, “Instituições como a Causa Fundamental do Crescimento de Longo Prazo”, Acemoglu, Johnson e Robinson se debruçam sobre experimentos históricos “quase-naturais”, como a divisão da Coreia e a colonização europeia, mostrando o papel crucial das instituições em moldar os incentivos e as restrições para os agentes econômicos. A abordagem mostra como escolhas por diferentes caminhos são influenciadas pela distribuição do poder nas instituições políticas formais e nas econômicas dos grupos de poder de fato.
É só olhar para quem dá certo de forma sustentável no mundo que se descobre que tipo de economista o país tem, ou precisa.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.