Direito gamer e a polêmica das bets: advogada esclarece dúvidas
Sobre a polêmica das bets, a advogada alerta para os riscos que esse modelo de negócio pode representar, sobretudo para o público jovem
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Por Leo Lima e Tamara Santos
O universo dos jogos eletrônicos é muito diversificado, mobilizando milhões de reais por ano. E como o Direito está presente em nosso cotidiano, não poderia ser diferente no universo dos games. Ele abrange desde as empresas desenvolvedoras dos jogos, as empresas que os comercializam, os jogadores profissionais, e até mesmo o consumidor final, como eu e você, que apenas quer se divertir.
O universo gamer navega pelo Direito Civil, que vai regular os contratos realizados entre patrocinadores e jogadores; pelo Direito do Consumidor - CDC, quando forem realizadas microtransações dentro dos jogos; pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, quando envolver a contratação de atletas gamer no âmbito profissional.
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Em entrevista ao podcast especial Direito Simples em parceria com o Glitch Clube, a advogada Luana Mendes Fonseca de Faria destacou que essas frentes jurídicas formam o que hoje se chama de Direito Gamer, uma área multidisciplinar que exige conhecimento técnico sobre a estrutura dos jogos, plataformas e contratos digitais.
No ano de 2024, os games tiveram a promulgação de uma legislação própria, a Lei nº. 14.852/2024, também conhecida como "Marco Legal dos Games", que vai estabelecer as diretrizes para a indústria de jogos eletrônicos no país. Esta lei visa regular a fabricação, importação, comercialização, desenvolvimento e uso comercial de jogos eletrônicos, além de promover a proteção de crianças e adolescentes no contexto dos jogos.
Luana reforçou no podcast que o Marco Legal representa um avanço importante por regularizar questões de produção, criação e distribuição de jogos no Brasil. No entanto, ela alertou que ainda há lacunas jurídicas, especialmente em relação à atuação de times e profissionais de esportes, que seguem dependendo de interpretações baseadas em outras áreas do Direito.
E no caso de crianças e adolescentes, é necessário elucidar a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº.8.069/1990), em razão da vulnerabilidade existente em relação a esse público.
E aqui vale mencionar um acontecimento recente, mas que não deixa de servir de alerta para os pais. Uma criança de 10 anos de idade gastou quase R$ 12 mil no cartão de crédito da mãe, sem a sua autorização, em um jogo eletrônico, o Roblox. O Roblox é uma plataforma de criação de jogos baseados normalmente em mundo aberto e simulação que permite criar do zero seu próprio mundo virtual chamado de 'experiência' ou 'place' onde os milhares de jogadores da plataforma podem interagir.
E como essa, muitas outras crianças já realizaram compras em jogos on-line, chegando a valores exorbitantes, sem a autorização dos pais. De acordo com CDC, no caso de compras on-line, existe o direito de arrependimento, oportunidade que o consumidor pode desistir da compra no prazo de 7 dias. Ultrapassado esse prazo, a coisa fica um pouco mais complicada, vez que existem decisões dos Tribunais Superiores negando o cancelamento da compra, em razão da responsabilidade dos pais da criança, ante o dever de cuidado e vigilância.
Sobre esse caso, Luana explicou no podcast que, apesar da responsabilidade objetiva das plataformas, o Judiciário vem reforçando o papel dos pais na vigilância digital. Ela também destacou que, quando há negligência no bloqueio de pagamentos ou ausência de ferramentas de controle parental, pode haver responsabilização solidária das empresas.
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Por outro lado, temos as bets, que nada mais são que apostas. A legislação brasileira legalizou as apostas esportivas, também chamadas de apostas de quota fixa, através da Lei nº. 13.756/2018, e que foi regulamentada pela Lei nº. 14.790/2023.
A partir da promulgação das referidas leis, o Ministério da Fazenda recebeu a competência de regular o setor de apostas de quota fixa e criou, em 2024, a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA-MF). Sua prioridade é fazer o setor atuar de forma regulada e controlada, e coibir a prática do crime de lavagem de dinheiro que permeia o setor.
Veja, estamos falando de apostas em eventos reais, como jogos de futebol, onde é possível prever um resultado, diante de uma análise da performance dos times em campo.
Apostas sem previsibilidade de resultado, em que a sorte é o escopo, ainda são proibidas no Brasil, como é o caso dos cassinos on-line e o jogo do tigrinho.
Durante o podcast, Luana esclareceu que as casas de apostas esportivas precisam obrigatoriamente ter autorização do Ministério da Fazenda e representação jurídica no Brasil. Caso contrário, os consumidores ficam desprotegidos em eventuais litígios. Ela ainda alertou que essas apostas não devem ser vistas como investimento e que a publicidade será fiscalizada pelo CONAR, sobretudo quando atingir públicos vulneráveis.
É importante saber que no site do Ministério da Fazenda existe uma lista das empresas que estão regulamentadas e autorizadas a realizarem apostas esportivas de quota fixa.
Já os jogos de azar são tidos como atos ilícitos, e estão previstos na Lei de Contravenções Penais (Lei nº. 3.688/1941), podendo o agente ser punido com prisão simples, de três meses a um ano, e multa. É o caso do jogo do bicho, caça-níquel, jogo de roleta, bingo, entre outros.
Como ressaltou Luana no episódio, o Direito Gamer é uma área em expansão que acompanha o crescimento da indústria de jogos e das apostas digitais. O conhecimento jurídico especializado tem sido essencial para garantir o equilíbrio nas relações entre empresas, jogadores e consumidores.
Sobre a polêmica das bets, Luana alertou para os riscos que esse modelo de negócio pode representar, sobretudo para o público jovem. Ela destacou que, embora a regulamentação seja um passo importante, ainda é preciso avançar na conscientização da população sobre os perigos dos jogos de azar. Em casos extremos, segundo a especialista, pode ser necessário discutir até mesmo a proibição de determinadas práticas, como medida de proteção social.
Não se engane, apostas são perigosas e você poderá perder todo o seu dinheiro. Fique atento!
Tamara Santos é advogada especialista em ciências penais
Leo Lima é jornalista
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.