Adolf Eichmann foi um oficial da SS, um burocrata no aparato de extermínio nazista. Responsável por coordenar a identificação, o agrupamento e, principalmente, a deportação de centenas de milhares de judeus, ciganos, homossexuais entre outros inimigos do estado totalitário de Hitler, fugiu em 1946, quando, no pós-Segunda Guerra Mundial, ficou sob a custódia dos EUA. Eichmann foi cassado e capturado pelo Mossad em 1960, na Argentina.

Levado a julgamento perante o tribunal em Jerusalém, documentos descreveram algumas das tarefas sob a sua coordenação: acompanhava horários de trens; calculava a capacidade dos vagões; e cobrava eficiência no cumprimento de metas. A “carga”? Passageiros deportados para Aucshwitz, Treblinka, Sobibor e outros campos de concentração.

As preocupações com as suas tarefas relatadas por Eichmann nesses documentos eram emblemáticas: atrasos no embarque da “carga”; gargalos burocráticos; e conflitos administrativos entre órgãos do Reich. Jamais questionou a finalidade da operação logística que organizava. “Minha função era técnica”, justificou ele durante o julgamento.

Diante da prática do mal sem ódio, sem sadismo, sem reflexão, levou Hannah Arendt a cunhar a expressão “banalidade do mal”. Tantas décadas e lições da história depois, segue por toda a parte. Em Gaza, na África, na periferia do mundo esquecido. Tal é a natureza das ideologias construídas para alimentar o ódio e desumanizar o outro. Serviram a genocídios promovidos por estados, representados em pessoas que, como Eichmann, não olhavam os corpos assassinados, mas a logística para as execuções.

Separadas por pouco mais de duas décadas, talvez esta seja uma das grandes diferenças entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Enquanto na Primeira Guerra Mundial, estados dinásticos e liberais, com concepções semelhantes de soberania, diplomacia e da economia capitalista se confrontaram por territórios em um novo equilíbrio geopolítico global; a Segunda Guerra Mundial se caracteriza pelo confronto entre projetos totalitários de organização da sociedade e do Estado. A ideologia foi também causa, meio e fim.

Talvez por isso a Segunda Guerra Mundial não vivenciou nada parecido à grande trégua natalina nas trincheiras de 1914, poeticamente retratada em “Feliz Natal”, filme lançado em 2006, com direção de Christian Carion. A película reproduz aquele dezembro do primeiro ano do conflito mundial, em trincheiras nas proximidades da cidade belga de Ypres, que demarcavam um longo corredor batizado de “Terra de Ninguém”.

Naquele trecho, tropas inglesas e francesas de um lado; alemãs de outro, desesperadas pelo conflito que se alongava, trocavam tiros e mortos a uma distância não maior do que de 30 metros. E eis que naquela véspera natalina, em meio à carnificina, um clima festivo entre combatentes adversários se disseminou ao longo do front ocidental que se estendia do mar do Norte aos Alpes suíços. Sob um cessar fogo não oficial, soldados de lado a lado cruzavam a “Terra de Ninguém” para confraternizar, trocar comida, charutos, bebidas e cantar.

Na era da tecnopolítica, as guerras híbridas cumprem a função de rasgar tecidos sociais, instigar divisões e ódios, que estão muito além de disputas passíveis de serem revolvidas pela política. Por uma razão simples: o conflito gira em torno de palavras de ordem e falsas ideias disseminadas lado a lado. Com o propósito de promover a instabilidade e o caos social, enfraquecer democracias para substituí-las por regimes “fortes”, os algoritmos se infiltram entre velhos amigos, pais e filhos, irmãs e irmãos.

Destilam fatos alternativos, “explicações” estapafúrdias, promovem a cultura que antecede e justifica golpes, conflitos, guerras civis. Não há base de diálogo, porque grupos inteiros se apegam a dimensões informacionais construídas para promover o caos. Como ficam todos, cara a cara, à mesa? Resistiremos a mais um natal?

Se a esta altura ainda é possível desejar algo, diria que não importa se você quer virar a maratona ao final de 2025 com um pé, com dois pés ou sem tocar o chão, levitando. Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é, diria o cantor. Desejo a todos um pouco da poética de Alberto Camus, que, em “Retorno a Tipasa”, registra: “No meio do inverno, aprendi enfim que havia em mim um verão invencível”.


Simples Nacional

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) apresentou ao STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) para impedir que mudanças da reforma do Imposto de Renda atinjam empresas que fazem parte do Simples Nacional. A Ordem busca preservar a isenção aos contribuintes do regime voltado à proteção de micro e pequenas empresas, incluindo escritórios de advocacia. A reforma do IR prevê a isenção total a pessoas físicas que recebam até R$ 5 mil ao mês. A norma prevê outros instrumentos arrecadatórios para compensar o impacto fiscal, entre eles a taxação de grandes fortunas de pessoas físicas, bem como de lucros e dividendos empresariais.


Briga judicial

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) suspendeu liminarmente, nesta terça-feira, a homologação do resultado da licitação para a construção do Complexo de Saúde Hospitalar Padre Eustáquio (HoPe), na Gameleira. A decisão atende ao pedido da segunda colocada no edital, OPY Healthcare e pode ser revista após o plantão de fim de ano do Judiciário. A OPY tenta desqualificar na Justiça o Consórcio Saúde Hope argumentando que o atestado técnico apresentado pela primeira colocada não atenderia às exigências do edital.


Pós-pandemia

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve a condenação de empresas e uma associação de médicos pela divulgação irregular de medicamentos do chamado “tratamento precoce” contra a COVID-19. Foi mantida a decisão do juiz da 5ª Vara Federal de Porto Alegre (RS), de 2023, que condenou os réus ao pagamento de R$ 55 milhões a título de indenização por dano moral coletivo. Os desembargadores acolheram os argumentos do Ministério Público Federal (MPF) contra a peça publicitária intitulada “Manifesto pela Vida”, divulgada em veículos de comunicação durante a pandemia. A peça publicitária, paga por uma empresa do setor farmacêutico, promovia o uso de remédios sem comprovação científica para o tratamento da doença, como a ivermectina, no chamado “kit covid”. O MPF apontou que a propaganda não tinha qualquer indicação sobre efeitos adversos sobre o uso dos remédios apresentados. Além disso, eram contrários à legislação e ao ato normativo que trata da propaganda e publicidade de medicamentos.

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Licença

O vereador Lucas Ganem (Podemos) apresentou, nesta terça-feira, um pedido de licença de 121 dias do mandato à Câmara Municipal de Belo Horizonte, a contar de 23 de dezembro. Será convocado o primeiro suplente, o ex-vereador Rubem Rodrigues de Oliveira, o Rubão – atualmente secretário Municipal de Esportes e Lazer da Prefeitura de Belo Horizonte –, também autor da ação que resultou na condenação eleitoral de Ganem por fraude ao domicílio. Lucas Ganem justificou o afastamento para tratar de assuntos de natureza privada.

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