“Todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais do que outros.” A frase de George Orwell, escrita para falar de fábulas de poder, ajuda a compreender o ambiente na Câmara Municipal de Belo Horizonte neste fim de ano. Em poucos dias, dois vereadores eleitos em 2024 tiveram os mandatos cassados pela Justiça Eleitoral em primeira instância. Formalmente, os casos guardam semelhanças relevantes. Politicamente, porém, a reação do Legislativo expõe um contraste difícil de ignorar.
Lucas Ganem (Podemos) e Leonardo Ângelo (Cidadania) encerram 2025 sob a mesma condição jurídica. Ambos recorrem, ambos permanecem no cargo até o trânsito em julgado e ambos podem perder definitivamente o mandato. A igualdade, no entanto, termina aí. Dentro da Câmara, o destino político de cada um passou a ser tratado de forma distinta. Ganem foi isolado. Ângelo, administrado. Um virou problema a ser afastado. O outro, uma crise a ser amortecida.
O contexto ajuda a entender o peso simbólico desse desfecho. A Câmara chega ao recesso após um segundo semestre marcado por votações polêmicas, projetos sob questionamento jurídico e críticas crescentes sobre os limites institucionais do plenário. As decisões da Justiça Eleitoral, ainda sem efeito imediato, funcionam como um fechamento incômodo de ciclo. Não representam um ponto final, mas um aviso claro de que o sistema entrou em zona de tensão.
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Nos bastidores, o clima é de exaustão. Há cansaço político, mas também estratégia. Vereadores falam em “virar a página”, “não incendiar a Casa” e “deixar o tempo trabalhar”. A prudência, neste momento, não é virtude moral. É método de autopreservação. Como resumiu um parlamentar, em conversa reservada, dezembro não é mês de heroísmo institucional.
No caso de Lucas Ganem, o isolamento se impôs rapidamente. Ele deixou de circular com frequência, perdeu interlocução e passou a ser tratado como um problema individual, sem defesa coletiva. A avaliação dominante é de que o volume e a consistência das provas reunidas pela Justiça Eleitoral encerraram qualquer margem de proteção política. A leitura interna é de que não se trata apenas de uma disputa partidária, mas de um caso que expôs uma fraude eleitoral capaz de constranger a própria cidade.
Há ainda um elemento pouco verbalizado, mas decisivo. Ganem não construiu trajetória política em Belo Horizonte. Chegou como outsider e, ao se eleger, ocupou um espaço disputado por quem construiu base local ao longo dos anos. Esse ressentimento silencioso ajudou a consolidar o afastamento. A comissão foi aberta porque, para a maioria, havia erro, provas e a sensação de que a cidade havia sido instrumentalizada eleitoralmente. A política apenas acompanhou um julgamento que já estava feito nos bastidores.
Com Leonardo Ângelo, o cenário é outro. Apesar da decisão judicial que reconheceu abuso de poder econômico, uso de recursos de fonte vedada, caixa dois e corrupção eleitoral, o vereador recebeu manifestações explícitas de apoio. Mensagens de solidariedade circularam no grupo de WhatsApp dos vereadores logo após a divulgação da sentença, em um gesto que evidenciou o contraste com o tratamento dispensado a Ganem.
A leitura interna é pragmática. Embora haja a percepção de que a Justiça Eleitoral dificilmente deixará o caso passar, a Câmara não demonstra disposição para assumir esse protagonismo político. Um vereador foi direto ao resumir o sentimento dominante: se depender da Casa, não haverá cassação. A Justiça que decida.
É nesse ponto que se instala o clima de fronteira. Dois casos semelhantes no papel, dois pesos na prática. A fronteira aqui não é jurídica, mas política. Entre quem pertence e quem é percebido como corpo estranho. Entre quem pode ser descartado sem custo coletivo e quem precisa ser preservado para evitar fissuras internas.
Nos corredores, há também uma avaliação crítica sobre o papel de Mauro Tramonte. Vereadores afirmam que, se ele tivesse vencido a eleição para prefeito, o cenário seria ainda mais explosivo. A associação entre campanhas é vista como um erro político elementar, incapaz de resistir a um escrutínio jurídico rigoroso. Um erro que, agora, contamina aliados e amplia o desgaste institucional.
O ano termina assim. Com uma Câmara tensionada, cautelosa e seletiva. Um Legislativo que reage de forma diferente conforme o grau de pertencimento do acusado. Ganem já foi politicamente condenado antes da Justiça. Ângelo ainda é protegido pela lógica interna do sistema, mesmo sob sentença.
BR-381
Técnicos da ANTT, PRF, concessionárias e entidades do setor, ouvidos pelo Movimento Pró-Vidas da BR-381, apontam que o aumento recente de acidentes na rodovia está ligado à falsa sensação de segurança após as melhorias no pavimento e na sinalização, o que elevou o tráfego e a velocidade média. A avaliação é de que, apesar do crescimento no número de ocorrências, a tendência é de redução na gravidade dos acidentes com o avanço das obras, como duplicações e faixas adicionais, além do reforço na fiscalização, instalação de radares, videomonitoramento e campanhas de conscientização.
Cautela
Chamou atenção nos bastidores a recente sinalização do presidente da Assembleia Legislativa, Tadeu Leite (MDB), sobre as eleições de 2026, após meses evitando o tema. Deputados avaliam que uma eventual aproximação com o presidente Lula seria um movimento ousado, mas de difícil sustentação política, sobretudo pela resistência da esquerda mineira ao nome de Tadeu, associado à condução da privatização da Copasa. Mesmo com eventual esforço de Lula para ampliar alianças e “empurrar” esse palanque, interlocutores avaliam que a aceitação não seria automática. Internamente, o diagnóstico é de cautela: Tadeu ainda pesa se vale a pena entrar na disputa pelo governo, mas o desejo mais recorrente nos bastidores seria uma candidatura ao Senado. Sem essa alternativa, a tendência seria seguir no mandato ou buscar uma vaga na Câmara dos Deputados.
Entre a lei e a rua
O documentário “Entre a Lei e a Rua”, dirigido por Guilherme Simões, foi lançado recentemente e passou a circular entre públicos ligados ao debate urbano e institucional em Belo Horizonte. A Câmara Municipal aparece como um dos cenários centrais da narrativa, apresentada como espaço de formulação de projetos de lei que incidem diretamente sobre a população em situação de rua. A partir do contraste entre o discurso formal e a vida concreta nas calçadas da capital, o filme acompanha personagens invisibilizados pela cidade e aborda temas como trabalho, drogas e sobrevivência urbana, sem recorrer a respostas simplificadoras. Ao apostar na escuta e na observação como método, a obra se insere no circuito de mostras e festivais nacionais previstos para 2026.
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Silêncio
Entre parlamentares do PL em Minas Gerais, a orientação diante da investigação que envolve o deputado Sóstenes Cavalcante é evitar declarações públicas. Procurados pela coluna, dirigentes e deputados do partido afirmam, em conversas reservadas, estar convictos de que o caso se insere em um contexto de perseguição política, mas avaliam que reagir agora seria precipitado. A leitura interna é que o episódio deve ser tratado com discrição no fechamento do ano legislativo e retomado apenas em 2026, quando o ambiente eleitoral estiver mais aquecido e o partido considerar mais vantajoso disputar a narrativa. Até lá, a estratégia é não ampliar o desgaste e deixar que o tempo opere a seu favor.
