No passado, as pesquisas com telemetria tradicionais se limitavam a biologistas que levavam antenas para registrar a localização de alguns animais, uma abordagem trabalhosa e que só revelava alguns padrões gerais de deslocamento. Hoje, o rastreamento por satélite tornou esse processo automático e acessível até mesmo para equipamentos mais compactos, feitos para acompanhar espécies de menor porte.
A precisão dos dispositivos permite que espécimes escondidos na mata fechada sejam localizados com uma margem de menos de 1m. “Nos últimos cinco anos, temos visto uma explosão de pesquisas de rastreamento animal, possibilitadas tanto pelo aperfeiçoamento tecnológico quanto pela queda do custo da tecnologia GPS”, analisa Meg Crofoot, pesquisadora especializada em primatas do Smithsonian Tropical Research Institute, no Panamá.
“Outras considerações importantes são a forma do sensor e a maneira como ele é preso ao animal. Tomar boas decisões sobre esses aspectos requer um profundo conhecimento da espécie. Por exemplo, enquanto coleiras podem ser a melhor forma de colocar um GPS em alguns primatas, elas podem ser inapropriadas para um orangotango macho, já que ele tem bolsas que inflam em sua garganta, usadas para dar gritos”, exemplifica Meg.
Os pesquisadores têm hoje a opção de usar sensores GPS mais simples, do tipo que é vendido para o uso de animais domésticos, por menos de US$ 100. Já equipamentos especializados podem custar até alguns milhares de dólares por indivíduo estudado, mas são mais precisos e resistentes, além de durar anos. O investimento pode render frutos por ainda mais tempo se o dispositivo contar com células solares, que permitem o acompanhamento contínuo de algumas espécies por toda a vida.
O avanço da miniaturização, da duração das baterias e de softwares e hardwares foi fundamental para a telemetria aquática. Com os equipamentos modernos, pesquisadores podem mapear as rotas de populações inteiras, por dezenas de milhares de quilômetros. Dependendo do dispositivo, é possível obter informações de animais que nadam a três quilômetros de profundidade por mais de uma década.
Os bichos ainda ajudam os cientistas levando os equipamentos a ambientes muitas vezes inacessíveis aos humanos. Lá, os dispositivos colhem informações sobre temperatura, luz e condutividade que podem ser combinadas com os dados a respeito do próprio comportamento animal, gerando um relatório ambiental completo de uma região. Assim, é possível verificar como uma área é afetada pelo aquecimento global ou se o avanço da urbanização tem efeitos no hábitat de uma espécie.
“Os animais rastreados podem atuar como ‘oceanógrafos’, vivendo as suas vidas normalmente e compilando uma grande quantidade de dados sobre as variáveis ambientais com uma frequência e numa escala impossível para humanos”, explica Sara Iverson, coautora de um dos artigos e professora na Dalhousie University, no Canadá. “Por exemplo, os sensores que medem salinidade, temperatura, profundidade e localização podem coletar perfis oceanográficos completos como foi feito com focas no Mar de Bering no inverno, período em que navios de pesquisa não têm acesso.” O método também foi usado com baleias para traçar perfis do Oceano Ártico e em mamíferos marinhos no hemisfério sul.
Cooperação A precisão desses instrumentos possibilitou ainda o uso dos chamados biologgers, sensores que registram movimentos específicos do animal. Um dispositivo conectado à mandíbula, por exemplo, gera um diário detalhado dos hábitos alimentares. Depois de recuperado o equipamento, os pesquisadores podem acessar as informações e cruzá-las com o ambiente em que o animal vive. Esse é o princípio big data, um termo que tem se tornado comum entre biólogos interessados em como os animais se comportam e interagem entre si. Combinando os dados de instrumentos colocados em duas espécies, é possível traçar perfis de presas e predadores em uma dinâmica mais completa.
A Ocean Tracking Network é uma das iniciativas que pretendem usar o big data para investigar o oceano e sua biodiversidade. O grupo promove parcerias com entidades internacionais, que dividem custos e resultados para obter e combinar o maior número de informações por meio da telemetria animal. A iniciativa é aberta a comunidades e cientistas e oferece ferramentas para análises compartilhadas.
Com essa estratégia, os cientistas descobriram que tubarões viajam entre o Sul da África e a Austrália e que jovens salmões deixam sistemas de rios do Leste dos EUA em direção à Groenlândia. “Só se trabalharmos juntos poderemos alcançar o potencial da telemetria para produzir e disseminar conhecimento sobre os oceanos e seus recursos”, completa.