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Estado de Minas

Oliver Sacks anuncia que tem câncer terminal e reflete sobre a proximidade da morte

Aos 81 anos, autor levou sua experiência como neurologista para a literatura


postado em 20/02/2015 08:36

Oliver Sacks, neurologista, no encerramento do artigo em que anuncia sua doença:
Oliver Sacks, neurologista, no encerramento do artigo em que anuncia sua doença: "Acima de tudo, tenho sido um ser senciente, um animal pensante neste belo planeta, o que em si é um enorme privilégio" (foto: Chris McGrath/Getty Images/AFP)

O neurologista e escritor inglês Oliver Sacks pegou emprestado do filósofo iluminista escocês David Hume (1711-1776) o título de sua autobiografia para anunciar publicamente que tem poucos meses de vida. Com o título de My own life (Minha própria vida), Sacks publicou na edição de ontem do The New York Times artigo em que fala da descoberta de câncer terminal.

“Um mês atrás senti que estava bem, até mesmo com a saúde robusta. Aos 81 anos, eu ainda nado uma milha por dia. Mas minha sorte acabou – algumas semanas atrás descobri que tenho múltiplas metástases no fígado. Há nove anos descobri que tinha um tumor raro do olho, um melanoma ocular. Embora a radiação e o laser para removê-lo tenham me deixado cego daquele olho, somente em casos muito raros ele gera metástase. Estou entre os azarados 2%”, escreveu.

Professor de neurologia da Universidade Columbia, em Nova York, Sacks é autor de inúmeros livros, entre eles, Tempo de despertar (1973), que deu origem ao filme homônimo estrelado por Robin Williams e Robert De Niro em 1990. Em 1966, trabalhando no Hospital Berth Abraham, no Bronx, Sacks conheceu grupo de pacientes que estavam há décadas em estado catatônico. Tratou-os com um novo medicamento, L-dopa, que fez com que retornassem à normalidade.

Ainda de acordo com o artigo, o câncer ocupa um terço do fígado de Sacks. “Embora o avanço seja lento, este tipo particular de câncer não pode ser interrompido.”

A despeito da tragédia, o tom de Sacks em todo o texto é otimista. Antes de falar sobre as próprias impressões diante da doença, ele cita Hume, que, ao descobrir que estava à beira da morte, aos 65, escreveu: “Eu sou... um homem de disposições leves, de temperamento controlado, de um humor aberto, social e alegre... e de grande moderação em todas as minhas paixões”.

Com a descoberta, Sacks escreveu, sua perspectiva mudou completamente. “Não há mais tempo para nada que não seja essencial. Tenho que ter foco em mim mesmo, no meu trabalho e nos amigos. Não posso mais ficar olhando o noticiário toda noite. Tampouco posso ficar prestando muita atenção à política ou aos argumentos sobre o aquecimento global. Não é indiferença, mas desapego – ainda me importo profundamente com o Oriente Médio, o aquecimento global, a crescente desigualdade, mas estes não são mais meus assuntos; eles pertencem ao futuro.”

Falando mais especificamente sobre a morte, Sacks diz que na última década a vem sentindo se aproximar, com o desaparecimento de muitos de seus contemporâneos. “Minha geração está a caminho, e senti cada morte como um descolamento, um rasgar de parte de mim.”

Admite que sente medo, mas que o sentimento que o domina desde a descoberta da doença é de gratidão. “Tenho amado e sido amado; tenho dado muito e também recebido em troca. Li, viajei, pensei, escrevi. Tive uma relação com o mundo, uma relação especial de escritores e leitores.” E ainda anuncia o lançamento, para maio, de seu autobiografia, On the move. “Tenho ainda outros livros próximos de serem finalizados.”

Nascido em Londres em 9 de julho de 1933, Oliver Sacks formou-se em medicina no Queen’s College. Em 1960, emigrou para os Estados Unidos, prosseguindo naquele país com seus estudos. Atuou em outras instituições de ensino além da Columbia. Em Nova York, foi professor da Universidade Yeshiva e NYU Langone Medical Center. No Reino Unido, foi professor visitante da Universidade de Warwick.

Oliver Sacks é o caçula dos quatro filhos de um casal de judeus que vivia ao norte de Londres – Samuel Sacks, médico, e Muriel Elsie Landay, uma das primeiras cirurgiãs da Inglaterra. No período em que o Reino Unido sofreu com os bombardeios alemães durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Sacks e seu irmão Michael se refugiaram para o interior do país, onde permaneceram até 1943. Com o fim do conflito, ele entrou, em 1951, para a Queen’s College.

Bibliografia
Os 12 livros escritos por Oliver Sacks foram publicados no Brasil pela Companhia das Letras. Seis títulos estão indisponíveis; três deles estão à venda somente em edição de bolso.

» 1970 – Enxaqueca: As origens e a natureza da enxaqueca (disponível em edição de bolso).

» 1973 – Tempo de despertar: Histórias de pacientes que conseguiram despertar da encefalite letárgica que os acometeu desde a Primeira Guerra Mundial (disponível).

» 1984 – Com uma perna só: Depois de uma cirurgia, Sacks sente sua perna “inexistente” e sendo ele o paciente, escreve sobre os mecanismos neurossensoriais responsáveis pela formação da imagem corporal (indisponível).

» 1985 – O homem que confundiu sua mulher com um chapéu: Relatos clínicos de pacientes com deficiências cerebrais são transformados em artefatos literários, desvelando novas realidades para a investigação científica (disponível).

» 1989 – Vendo vozes: Autor faz incursão pelo universo dos surdos e apresenta a condição daqueles que não conseguem ouvir (disponível em edição de bolso).

» 1995 – Um antropólogo em Marte: Indíviduos em situações-limite passam a conhecer melhor a si mesmos: como um pintor que passa a ver em preto-e-branco depois de um acidente e um cirurgião que é tomado por tiques (disponível em edição de bolso).

» 1997 – A ilha dos daltônicos: História de uma paralisia neurodegenerativa que vitima apenas ilhéus de um grupo social, os chamorros, nas Ilhas Marianas (disponível).

» 2001 – Tio Tunsgênio: Recordações da infância do autor misturadas com o comportamento misterioso dos materiais (disponível em edição de bolso).

» 2002 – Diário de Oaxaca: Diário de viagem de Sacks ao acompanhar grupo de botânicos e cientistas amadores no México (disponível).

» 2007 – Alucinações musicais: Autor discorre sobre o porquê de a música ser uma das experiências humanas mais assombrosas e inesquecíveis (indisponível).

» 2010 – O olhar da mente: Informações técnicas sobre distúrbios da memória, da fala e de outras funções cerebrais e as consequências no dia-a-dia dos pacientes e familiares (disponível).

» 2012 – A mente assombrada: Estudo sobre as alucinações e o que elas fazem com o corpo e o cérebro a partir de experiências de pacientes e do próprio autor (disponível).

AUTOBIOGRAFIA NO PRELO
Com previsão de lançamento para maio, On the move, que reúne as memórias de Oliver Sacks, já está em pré-venda pela Amazon e Barnes and Noble. A Companhia das Letras, editora de Sacks no Brasil, confirmou a edição em português da autobiografia, mas não há data prevista para o lançamentio. A capa do livro (foto) estampa uma imagem do autor sobre uma moto BMW no Greenwich Village, em 1961. Quando Sacks tinha 12 anos, um professor escreveu em seu relatório: “Sacks vai longe, se ele não for longe demais”. No início da narrativa, o autor apresenta sua obsessão por motocicletas e velocidade. Ainda na primeira parte, relata suas experiências como um jovem neurologista no início de 1960, pela primeira vez na Califórnia, onde lutou contra o vício de drogas. Com honestidade e humor, Sacks apresenta-se com a mesma paixão pelo halterofilismo, natação e as questões cerebrais. Ele ainda escreve sobre seus casos amorosos, tanto românticas e intelectuais, e seu vínculo com o irmão esquizofrênico.

 


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