Você mora sozinho e não consegue comer tudo que compra no sacolão. A família precisa viajar e a geladeira está cheia de frutas e legumes. Erra a mão no açougue e leva mais carne do que devia. Prejuízo no bolso e no prato? Alimentos estragados e jogados fora? Não mais. Um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) desenvolveu um novo tipo de plástico capaz de conservar alimentos por mais tempo. Elson Longo, pesquisador do Instituto de Química da Unesp de Araraquara e um dos integrantes do estudo, destaca que a descoberta é um exemplo da “tecnologia do futuro”, por garantir o transporte de alimentos com minimização das perdas e sem bactérias.
Em linhas gerais, Elson Longo explica como foi o estudo. “Numa primeira fase, em laboratório, obteve-se óxido de silício (areia nanométrica) com prata metálica em sua superfície. Esse material mostrou-se altamente bactericida. Como um dos problemas da sociedade é a eliminação de bactérias, pensou-se em fazer esse composto, que foi testado e mostrou-se altamente bactericida. Nessa etapa, uma empresa de nanotecnologia de São Carlos passou a desenvolvê-lo em alta escala esse composto. Como a segurança alimentar é fundamental para a população, procurou-se associar com a indústria de plástico para produzir um composto de óxido de silício com prata e plástico para ser utilizado como embalagem.”
O pesquisador conta que essa descoberta viabilizou a utilização de embalagens para proteção de alimentos e que “o principal ganho é a garantia de um alimento saudável e aumento da sua vida útil. E a preservação depende do tempo de vida médio dos alimentos. Aqueles que se degradam facilmente, têm sua vida útil aumentada de duas a três vezes. Por outro lado, alimentos menos perecíveis têm aumentado a sua vida de cinco a 10 vezes. Essa nova embalagem protege os alimentos dos fungos e bactérias do ambiente e das bactérias que já haviam se instalado no alimento”, complementa. Para se ter ideia, no caso do tomate, o tempo de prateleira passou de dois para 26 dias. Já a alface protegida pelo plástico bactericida teve seu tempo de conservação estendido de cinco para oito dias.
Elson assegura que a embalagem serve para todos os alimentos, frutas, legumes, carnes etc. “Com isso, diminui-se o aumento do desperdício, contribui-se para a economia da dona de casa e pode-se pressionar o mercado para a queda dos preços dos mantimentos”, cita. O pesquisador ressalta os cuidados que o consumidor deve ter com o plástico ao adquiri-lo, para que o resultado seja o esperado. “O plástico bactericida foi aprovado pelos órgãos reguladores do país, logo, não tem nenhuma contraindicação para o seu uso. Como qualquer tipo de plástico, ele protege da água, mas, caso seja danificado, isto é, se for rasgado ou furado, perde as suas propriedades.”
Aos interessados, Elson avisa que o produto já esta à disposição no mercado, podendo ser comprado pela internet (www.alpfilm.com.br). “É vendido pela AlpFilm, sendo apropriado para geladeiras, freezeres, fornos de micro-ondas. E o próximo passo deve ser o mercado internacional. Empresas norte-americanas já mantêm contato com a empresa para a exportação do produto”, conta. O filme de PVC esticável, transparente e semiprofissional, com 300 metros de comprimento e 28 centímetros de largura, custa R$ 38,61. Além de dar maior durabilidade para o alimento, o plástico elimina 99,96% das bactérias e fungos, que causam diarreia, cólera e intoxicações alimentares. Pode, ainda, ser útil na área odontológica e em embalagens de perecíveis e não perecíveis.
O diretor da Nanox, empresa responsável pela fabricação do produto, Luiz Gustavo Pagotto Simões, explica que o filme de PVC tem, em sua composição, silicato de prata, material que tem propriedade bactericida e fungicida. E conta que, como primeiro passo da pesquisa, foi feita a caracterização do composto. “Desenvolvemos, nos laboratórios do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o material básico e depois pensamos em suas aplicações. Em seguida, o composto foi introduzido no plástico de PVC. A propriedade bactericida presente no composto elimina grande parte dos micro-organismos, que podem estar no alimento embalado pelo filme.” Além das especificações exigidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Simões explica que é necessário seguir uma legislação internacional de segurança para garantir que não exista a migração dos aditivos do plástico para o alimento que será consumido. “O AlpFilm Protect cumpre todos os padrões exigidos pela Anvisa e pelas agências de legislação internacionais”, ressalta.
PASSOS
E o futuro do estudo? Elson Longo revela que estão sendo realizados estudos com a Nanox para a obtenção, em nível semi-industrial, de um novo tipo de agente bactericida à base de prata e tungstênio. Os estudos para o plástico, que tiveram início há seis anos, contaram com apoio de uma equipe de pesquisadores, entre eles, Luiz Gustavo P. Simões e Daniel T. Minozzi. Na época, Luiz Gustavo Simões, da Nanox, era aluno de Elson e defendeu tese de doutorado sobre nanopartículas bactericidas. Da união desses profissionais surgiu um produto com DNA nacional. “O que comprova o desenvolvimento da alta tecnologia no Brasil. E mais: esse trabalho mostrou que a parceria entre universidade e indústria é fundamental para gerar inovação tecnológica”, diz Longo.