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Estado de Minas

Proteína da jaca é escudo contra parasitas

Brasileiros descobrem que substância extraída da semente da fruta reforça o sistema imunológico de ratos. Meta é testar a prevenção de doenças em humanos


postado em 19/04/2013 08:22 / atualizado em 19/04/2013 09:32

O sabor e os benefícios gerados para o intestino já são conhecidos. Agora, a jaca poderá beneficiar a saúde de outra maneira: no auxílio ao combate de doenças como a leishmaniose cutânea. Pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP/USP)encontraram uma substância da semente da fruta que ajuda o sistema imunológico a se defender de parasitas. A descoberta tem potencial para contribuir no avanço de estudos para a prevenção de doenças infecciosas e também de células cancerígenas.

Em busca de substâncias que pudessem beneficiar o sistema imunológico, os cientistas brasileiros analisaram a semente da jaca e encontraram uma lectina (proteína capaz de decodificar as informações contidas na camada de açúcares que reveste as células) promissora. “Desde os anos 1980, os estudos nessa área estão direcionados à análise de substâncias encontradas em plantas e frutas. Partimos desse princípio e, em uma primeira pesquisa, encontramos uma lectina que chamamos de jacalina. Ao aprofundar o trabalho em busca de outra variação que fosse mais eficiente, encontramos a proteína batizada de ArtinM. Ela tornou-se, então, o foco principal do nosso estudo”, explica Maria Cristina Roque Antunes Barreira, a responsável pela investigação.

Os pesquisadores testaram a ArtinM em uma linhagem de células do sistema imunológico humano, e descobriram que a substância estimulou citocinas, moléculas responsáveis pela proteção da célula. “Notamos que a lectina da jaca conseguiu reforçar as células de defesa. A substância estimulou a produção de interleucina 12, uma citocina capaz de ativar um tipo de célula de defesa chamado linfócito T helper 1 (TH1), que é a célula central do sistema imunológico”, conta Maria Cristina. Segundo a pesquisadora, o linfócito TH1 estimula os outros linfócitos, que secretam grandes concentrações da citocina a interferon-gamma (IFN-gama), aumentado, assim, a atividade microbicida dos macrófagos, as células que “engolem” elementos estranhos ao corpo. “Isso favorece o combate aos parasitas causadores das doenças”, explica.

Depois de comprovar a ação da lectina como estímulo do sistema imunológico, os pesquisadores resolveram testar a substância em animais. No primeiro experimento, infectaram camundongos com o protozoário Leishmania major, o parasita causador da leishmaniose cutânea. Nesses animais, a ArtinM induziu a produção da citocina interleucina 12, deixando-os mais resistentes à infecção. Em um segundo estudo, os ratos foram infectados com o fungo Paracoccidiodes brasiliensis, que é responsável pela paracoccidioidomicose, doença que pode levar à fibrose pulmonar. Também nesse modelo, a administração de ArtinM tornou os animais mais resistentes à infecção.

Outras aplicações
Um dos participantes do estudo, Ademilsom Panunto destaca a importância do experimento. “Utilizamos duas doenças infecciosas – uma causada por um parasita e outra por um fungo – e vimos que a resposta realmente é positiva, a lectina causou uma proteção aos animais”, conta o imunologista. De acordo com Panunto, outros benefícios da lectina da jaca foram descobertos desde de 2000, quando o grupo começou a estudar as propriedades da proteína. “Conseguimos também provar que a ArtinM auxilia a cicatrização de feridas causadas por queimaduras. Ao usarmos pomadas com a substância, notamos que elas eram mais eficientes do que outros tipos de pomadas”, conta.

Apesar dos resultados positivos, há ainda uma preocupação em relação à lectina. De acordo com os pesquisadores, a ArtinM só pode ser usada de maneira limitada, pois, se aplicada em excesso, pode desencadear efeitos colaterais indesejados. Na busca pela solução desse problema, os cientistas resolveram investigar se os agentes causadores das doenças também tinham lectinas capazes de estimular a interleucina 12. Eles encontraram as proteínas nos fungos Paracoccidiodes brasiliensis e Toxoplasma gondii (causador da toxoplasmose).

No primeiro, descobriram uma lectina que poderia ser manipulada. No segundo, proteínas de micronemas, que têm propriedades muito semelhantes às da ArtinM. “Manipulando essas estruturas nos dois parasitas, realizamos, em ratos, um tratamento semelhante ao quando usamos a proteína da jaca: as cobaias tratadas com as doenças responderam de melhor forma que as que não foram tratadas”, explica Maria Cristina Barreira.

Essa seria uma maneira de explorar características das próprias enfermidades contra elas. “Utilizar as substâncias encontradas na doença seria uma maneira de evitar uma resposta negativa do organismo e reforçar a resposta das células protetoras sem causar consequências maiores”, complementa a pesquisadora.

De acordo com ela, serão realizados testes com humanos para averiguar se os efeitos da proteína da jaca também são positivos em humanos. Estudos nos Estados Unidos já indicam o funcionamento da substância, mas no combate de outros problemas de saúde. “Há estudos publicados fora do país que mostram que a lectina dessa fruta tem ação direta em células causadoras da leucemia e também no câncer hepático, o que seria de vital importância, já que doenças como essas são muito difíceis de serem tratadas”, observa a pesquisadora.

Sinais de problema
A leishmaniose cutânea é a forma mais comum de leishmaniose, uma infecção da pele causada por um parasita unicelular e transmitida pela picada do mosquito-palha. A pessoa com a doença tem feridas na pele, doloridas ou não. Esses machucados podem mudar de tamanho e aparência com o tempo. Em alguns casos, as glândulas próximas às feridas ficam inchadas, dando a eles uma aparência de vulcão. Já a paracoccidioidomicose é uma infecção que afeta os pulmões, mas pode atacar outras partes do corpo, como a boca, a garganta e os gânglios linfáticos. Dificuldade de respirar e úlceras dolorosas na boca são alguns dos sintomas da doença.

Palavra de especialista
Izidro Bendet, imunologista


Uso promissor
“As lectinas são substâncias que se ligam a açúcares e auxiliam a defesa das células. As derivadas de plantas como o feijão são usadas há muito tempo para esse fim. Também são aplicadas na técnica in vitro. Quando queremos saber, por exemplo, como está o sistema imunológico de um paciente com HIV, tiramos células dele, as purificamos e colocamos em cultura. Assim, observamos se elas se multiplicam, sinal de que o organismo está se protegendo. No caso desse estudo da semente da jaca, ainda não foram feitos testes com os seres humanos, que podem ser diferentes dos testes com animais. Mas caso haja essa resposta do sistema imunológico e exista a capacidade de eliminar o agente infeccioso com a ajuda das lectinas em pessoas, isso será bem empolgante. Não só para o surgimento de drogas para a prevenção, mas também para o tratamento de quem já está infectado.”


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