Ao anunciar publicamente a intenção de não cumprir as decisões judiciais de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade, estando, por isso, sujeito a um processo de impeachment. É a opinião de José Alfredo de Baracho Júnior, professor de Direito Constitucional da PUC Minas. “Existe um elemento concreto, objetivo e real. A afirmativa do presidente compromete a estabilidade dos poderes e instituições e por si já tem conotação de crime de responsabilidade”, afirma Baracho Júnior.
Para o constitucionalista, ao cometer o novo crime de responsabilidade, o presidente da República está suscetível ao impeachment, acrescenta. O impeachment tem as sanções previstas no artigo 52 da Constituição Federal: os crimes de responsabilidade importam na perda do cargo e na inabilitação para o exercício da função pública por oito anos.
O presidente é recordista de pedidos de impeachment no Congresso. Há 136 requerimentos que aguardam apreciação do presidente da Casa, Arthur Lira, o mais volumoso dos quais, o chamado superpedido, apresentado em 1º de julho, que imputa a Bolsonaro 23 crimes previstos na lei 1.079/50, conhecida como Lei do Impeachment. Entre eles, estão cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, tentar dissolver o Congresso Nacional, atrapalhar investigações, violar o direito à vida dos cidadãos na pandemia, incitar militares à desobediência à lei e não agir contra subordinados que agem ilegalmente.
O professor de Direito Constitucional Alfredo Baracho esclarece que qualquer cidadão pode apresentar a nova denúncia de impeachment contra Bolsonaro, que, neste caso, deve ser por objeto específico – que se atenha aos recentes fatos, públicos e notórios. “O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, tem o juízo da justa causa, avalia se ela existe para iniciar o procedimento. Em caso afirmativo, constitui a comissão mista, que profere o parecer pela admissão ou não do processo”, explica Baracho.
O plenário vota o parecer que, para ser admitido, precisa ter a aprovação de dois terços dos deputados. Aprovado na Câmara, segue para o Senado, onde há uma segunda votação de admissibilidade. Nesta última casa, por maioria simples, se confirmada, o presidente da República é afastado por até 180 dias para o julgamento, que é presidido pelo presidente do STF, no Senado.
Duas situações
Ao mesmo tempo em que juristas reconhecem o mais recente crime de responsabilidade de Bolsonaro, cometido durante as manifestações antidemocráticas por ele convocadas, também assinalam que o ato em si, de descumprir a decisão judicial, ainda não se materializou. “São duas situações previstas na Constituição e na Lei do Impeachment. Há a afirmativa pública de que não cumprirá a decisão judicial, portanto, crime de responsabilidade; e também há o descumprimento efetivo, que ainda não ocorreu”, diz Baracho.
Segundo ele, a afirmativa do presidente configura desrespeito às instituições democráticas, que tem o dever de preservar e já traz conotação de crime de responsabilidade. “Mas não tem conotação de um crime comum. O descumprimento de ordem judicial, se de fato houver, ele estaria incorrendo não apenas em crime de responsabilidade, mas também em crime comum”, afirma Baracho.
Para José Luiz Quadros de Magalhães é obrigação do Poder Legislativo se debruçar sobre os crimes de responsabilidade de Bolsonaro. Caso venha a descumprir a decisão judicial, também a Câmara terá de aprovar, com dois terços do plenário, a denúncia por crime comum. Se admitida, ela será enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF), e, se aceita, será julgada. A partir daí, assim como no impeachment, o presidente da República também é suspenso por 180 dias.