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Jacyntho Lins Brandão lança tradução de poema épico babilônico

'Epopeia da criação' foi escrito há mais de três mil anos; versão foi transposta diretamente do idioma acádio para o português


21/10/2022 04:00 - atualizado 21/10/2022 00:27
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Jacyntho Brandão
Jacyntho Brandão e o desafio de recriar o contexto cultural e o significado das expressões e palavras empregadas em poema escrito há mais de 3.000 mil anos (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Bertha Maakaroun 

 

Três milênios depois, dois dos quais hibernando sob as areias de desertos do Iraque, o poema babilônico “Epopeia da criação” é transposto do acádio – língua do ramo semítico originária da Mesopotâmia – ao português pelo professor emérito de língua e literatura grega da UFMG Jacyntho Lins Brandão. Editado pela Autêntica, o lançamento será neste sábado (20/10), às 11h, na Crisálida Livraria, na Avenida Augusto de Lima, 233, Edifício Maletta, sobreloja 28, em Belo Horizonte. Um dos três textos acadêmicos que dominam a escrita cuneiforme no Brasil – uma das mais antigas do mundo, que caiu em desuso a partir da invenção do alfabeto, trata-se da terceira obra da Antiguidade traduzida por Jacyntho Lins Brandão para o português: “Epopeia de Gilgámesh” foi publicada pela Autêntica em 2017; e “Descida de Ishtar ao mundo dos mortos” foi obra lançada pela Editora Kotter, de Curitiba, em 2019. 

 

Identificada em meados do século 19, a língua acádio foi assim batizada pelos estudiosos que a decifraram, em referência à cidade de Akkad, capital do Império de Sargão, no século 24 a.C. O texto foi localizado em 1849 nas ruínas da biblioteca do rei Assurbanípal, em Nínive (próximo da atual Mossul, no Iraque). “Epopeia da criação” é um poema possivelmente composto depois da conquista de Elam pelo rei Nebucadnezar (1125-1104 a.C.) para celebrar a vitória e a glória de Marduk, deus da Babilônia.

Foi registrado em tabuinhas de argila, de procedência babilônica e assíria, em textos de duas colunas, distribuídos por sete tabuinhas que contêm entre 132 e 168 versos. “Entre as primeiras tabuinhas descobertas e as edições críticas há mais de 100 anos de trabalho, tanto na reconstituição desses manuscritos, ainda incompletos, como no resgate de novas tabuinhas encontradas em diferentes expedições arqueológicas”, explica Jacyntho Lins Brandão. A tradução envolve um tremendo desafio: reconstituir o contexto cultural e o significado das expressões e palavras empregadas no poema, escrito há mais de 3.000 anos. Jacyntho Lins Brandão trabalhou com quatro edições críticas do texto acádio publicadas entre 2005 e 2019.

 

“Epopeia da criação”, que no original se chama “Enuma eliš” – que significa “quando no alto” –, descreve a teogonia e a cosmologia dos babilônios: a criação do mundo, a luta entre os deuses pela supremacia, a criação da humanidade para servir a divindade. Diversas passagens de alto valor poético contêm episódios que foram aproveitados em literaturas posteriores, como as mitologias assírias e os escritos bíblicos do Gênesis.

“O grande interesse nesta literatura da Antiguidade, para além da alteridade, é entrar em contato com a origem de nossas concepções e ideias acerca da criação da humanidade. A 'Bíblia' trabalha com várias dessas concepções”, afirma, lembrando que no começo (gênese) há um abismo de águas, a partir do qual o deus hebraico começa a organizar o mundo, perspectiva muito similar à criação dessa obra. 

 

“Genealogia e transmissão do poder são dois motores da narrativa babilônica”, explica o professor. “Partindo de quando firmamento e solo não eram ainda nomeados, nem havia prados ou pântamos, o poema descreve como os deuses primordiais Apsu e Tiámat misturavam suas águas, para logo ter início a narrativa de como, em seu seio surgiram outros deuses”, explica. O primeiro par gerado de novos deuses do movimento das entidades primordiais foi Láhmu e Láhamu. Esses geraram Ánshar e Kíshar, que criaram como reflexo de si Ánu, que por seu turno gerou Ea, que tem preeminência entre todas as divindades.  

 

O conflito narrado no poema babilônico é geracional. Os novos deuses se associam e com a algazarra do movimento passam a perturbar os deuses primordiais.  Apsu reclama com Tiámat e propõe que sejam eliminados: “Silêncio se restabeleça e durmamos nós”. Ao tomar conhecimento desse plano, Ea encanta Apsu, fazendo-o dormir, retira-lhe o tendão e a coroa, o mata e faz nele a sua morada.

“Para sumérios, babilônios e assírios, Apsu é o lençol d’água subterrâneo donde procedem fontes e rios, morada de Ea. É nesse local que Ea e sua esposa Dámkina geram Marduk, deus da Babilônia”, afirma o professor. Tiámak, que em princípio fora contrária à proposta de eliminar a própria prole, muda de ideia quando Marduk ganha os quatro ventos, produzindo poeira e ondas. Assim, Tiámak prepara-se para a guerra, criando vários seres monstruosos para enfrentar Marduk, o mais jovem entre os novos deuses, designado para liderá-los. Vencida a deusa primordial, Marduk a parte ao meio, assim criando com as duas metades o céu e a terra.

 

“Epopeia da criação”

 

  • Autor desconhecido
  • Tradutor: Jacyntho Lins Brandão
  • Autêntica Editora
  • 432 páginas
  • R$ 84,90; e-book: R$ 59,90
  • Lançamento neste sábado (22/10), às 11h, na Crisálida Livraria (Av. Augusto de Lima, 233, Edifício Maletta, sobreloja 28) 

 

 

 

 


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