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Estado de Minas PENSAR

Francisco José Viegas: 'Tento demonstrar que o romance policial não existe'

Português lança no Brasil mais um livro com o policial Jaime Ramos e aponta um dos problemas dos escritores contemporâneos: 'Somos prisioneiros da linguagem'


29/07/2022 04:00 - atualizado 28/07/2022 23:20

Ilustração: Francisco José Viegas
(foto: Quinho)
Autor de romances policiais, Francisco José Viegas tem uma missão: acabar com os romances policiais. “Uma das funções dos meus livros é demonstrar que o romance policial não existe, que toda a literatura é policial ou marcada pelo policial”, explica o escritor português, em entrevista ao Estado de Minas.

 

“Na verdade, não me interessa muito discutir o policial como uma espécie de gueto para as pessoas que se interessam pelo crime e pelo homicídio”, complementa o autor de mais de 30 obras, entre poesia, crônicas, perfis biográficos, livros de viagem e romances.

 

O mais recente, “A luz de Pequim”, acaba de chegar ao Brasil pela Editora Gryphus. Há um cadáver, um mistério, uma investigação conduzida por um personagem presente em outras obras do escritor. Mas há também uma aguda visão das transformações sociais ocorridas nas últimas décadas, dilemas íntimos, reflexões desencantadas (ocasionalmente ácidas) sobre a política, sobre Portugal, sobre o Brasil. Ou seja: é – e não é – um romance policial. “O que me move, sempre, muito mais do que uns crimes, são as biografias dos personagens”, conta Viegas.  

 

Ex-militante comunista (“derrotado pela própria História”, na definição de seu criador), o policial Jaime Ramos é personagem recorrente na obra de Viegas – como o comissário Salvo Montalbano do italiano Andrea Camilleri e o investigador-livreiro Mario Conde, do cubano Leonardo Padura Fuentes.

 

Ramos volta em “A luz de Pequim” para fazer um acerto de contas com as convicções ideológicas, com uma paixão indefinidamente correspondida e com o próprio ofício. Após uma abertura esplêndida, que vai do sexo à morte num pular de páginas, Viegas nos leva ao labirinto de Ramos, tratado pela chefia como uma “peça de mobília” e habitante de “um mundo que já não existe”.

 

“Já só tenho memória, é a única coisa de que dependo”, constata o oficial, ao ser comunicado de um iminente afastamento. Antes, porém, de sair de cena, o policial atenderá ao pedido de um velho amigo e fará uma última investigação, que o levará ao Brasil (com uma passagem decisiva por Belo Horizonte) e à China, e o deixará em paz com suas recordações e imperfeições.  

 

Leia: Sérgio Abranches: 'Escrever sobre o ódio foi quase uma imposição' 

 

Nascido em 1962, Francisco José Viegas tem mais de 30 livros publicados, entre romances, poesias e crônicas. Editor da Quetzal, é também diretor da revista “Ler”. Ele esteve no Brasil para participar da Bienal do Livro, em São Paulo, em mais uma visita ao país que conhece melhor do que muitos de nós. Gravou um programa para a tevê portuguesa que o levou a quase todos os estados brasileiros: “Só me falta Rondônia”, conta. 

 

Da mais recente incursão, ficaram duas constatações: “Os níveis de miséria aumentaram, isso é chocante, assim como a impossibilidade de cordialidade no debate em espaço público: a política e a guerra cultural chegaram num nível muito alto de ressentimento e sordidez.”

 

Depois de citar alguns escritores brasileiros que admira (“Erico Verissimo, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Milton Hatoum, Tabajara Ruas, todos eles me mostraram que não existe o Brasil, mas Brasis”), ele concedeu a seguinte entrevista ao Pensar, com algumas perguntas formuladas a partir de passagens de “A luz de Pequim”.

 

Como surge “A luz de Pequim”?

 

Em primeiro lugar, é uma homenagem ao Porto, à cidade. A vaga de turismo que a transformou numa cidade cosmopolita e moderna não conseguiu apagar a sua melancolia, o seu ar conservador e burguês.

 

E, depois, é uma espécie de balanço do Jaime Ramos, personagem de dez livros anteriores e cuja primeira aparição tem trinta anos. É um velho amigo que também precisava de uma homenagem.

 

Ao longo destes trinta anos, ele andou em Portugal, Angola, Guiné, Brasil, México, Cuba, Açores. Talvez precisasse de vir ao Brasil de novo e depois partir para uma espécie de terra distante, como Pequim, voltando ao Porto, onde começa o seu mundo. 

 

As transformações profundas ocorridas no Porto nos últimos anos e em outras localidades portuguesas são descritas em detalhes. O que mais o fascina, como escritor, nessas mudanças drásticas na cidade e no país?

 

A forma como as cidades resistem e conservam a sua identidade. A transformação dessas cidades era necessária. Há vinte anos, eram cidades mais ou menos arruinadas e hoje, sobretudo graças ao turismo, são lugares de peregrinação de gente de todo o mundo, especialmente Porto e Lisboa.

 

Foram reformadas, modernizadas, transformadas, vêm em todos os jornais e reportagens de viagem e lazer. No entanto, Jaime Ramos pertence ao passado e sente a nostalgia desse mundo que desapareceu e foi mais ou menos normalizado, cheio de restaurantes gourmet e de turistas a quem é preciso vender a sensação de que estão a viver uma vida maravilhosa. Ele é peregrino num mundo que já não lhe pertence.

 

Ou melhor: só lhe pertence o lado mais obscuro, o lado menos turístico, menos luminoso. E mais melancólico. Jaime Ramos é, um pouco, o instrumento da melancolia portuguesa. Sem fado, sem bacalhau, sem proprietários de padaria, sem império. Aliás, devo ser um dos poucos portugueses que não gosta de fado.

 

“Já não fazes parte desse mundo, Ramos.” E os romances policiais? Ainda fazem parte desse mundo?

 

Nabokov dizia que uma das funções dos seus romances era a de provar que o romance não existe. Eu acho que uma das funções dos meus livros é demonstrar que o romance policial não existe, que toda a literatura é policial ou marcada pelo policial.

 

Na verdade, não me interessa muito discutir o policial como uma espécie de gueto para as pessoas que se interessam pelo crime e pelo homicídio. Escrevo romances, ponto final. Incursões no paraíso para mostrar talvez o lado menos luminoso do paraíso.

 

E o mais melancólico, também. Crimes no paraíso, isso interessa-me muito, para mostrar que há sempre uma espécie de esconderijo para o horror.

 

“A luz de Pequim”, de certa forma, também permite um acerto de contas de Ramos com o próprio passado, em especial a parte da militância e da crença na revolução. Como as convicções de ideias e ideais são tratadas no livro e como você vê o atual momento do Brasil, marcado pela polarização do debate público? 

 

Acho que um dos problemas atuais da relação com os escritores é o dessa polarização. Hoje somos prisioneiros da linguagem, por exemplo, vigiamo-nos muito para não ofender, para não nos denunciarmos como seres humanos.

 

O ser humano não é perfeito, é uma soma de imperfeições maravilhosas. O problema é que a um escritor, hoje, não lhe basta exigir coisas bondosas, o que já é ruim, mas também que seja uma pessoa bondosa, acima de toda a suspeita, o que é desumano.

 

O Brasil está muito polarizado sim, e isso é visível a cada minuto que leio jornais e vejo debates. A “direita bolsonara” é muito abjeta, horrorosa. Mas também me irrita a esquerda que vive na ‘bolha’, muito militante nas questões de raça, gênero e linguagem, mas não na luta contra a pobreza. Passar nas ruas de São Paulo é um pesadelo, para mim.

 

Só que a luta de classes do marxismo migrou para uma espécie de luta de egos, uma luta de luxos morais. E então tenho saudade de um bom marxista, não porque concorde com ele, mas porque temos certos objetivos comuns: a justiça no presente e no futuro, livrar o ser humano da pobreza, da necessidade e do sofrimento.

 

Leia: O dia em que Gabriel García Márquez puxou a orelha dos europeus 

 

E da falta de empatia. Sou um social-democrata. Alguém que acredita na justiça, na igualdade de oportunidades, na educação liberal, no primado da beleza e do bem-estar, na liberdade e na proteção dos que nasceram menos favorecidos.

 

Jaime Ramos foi comunista e eu respeito isso no seu passado, nas suas desilusões. Gosto daquele folclore, daquela liturgia que ele recorda, daqueles debates. Ele ainda está discutindo a invasão da Tchecoslováquia em 1968. Conheci pessoas maravilhosas nesse campo. Não é o meu campo, porque já cresci em democracia, depois das purgas estalinistas, depois do Gulag, depois do fascismo. Não tenho de ficar preso a essa arqueologia, mas respeito muito as pessoas que sofreram essas desilusões.

 

"O Brasil está muito polarizado, e isso é visível a cada minuto que leio jornais e vejo debates. A 'direita bolsonara' é muito abjeta, horrorosa. Mas também me irrita a esquerda que vive na 'bolha', muito militante nas questões de raça, gênero e linguagem, mas não na luta contra a pobreza"

 

“O Brasil, país do futuro, não pode falar uma língua do passado”, pontua um dos personagens, ao afirmar: “Um dia, o português vai desaparecer e passaremos a falar brasileiro”. Concorda com a previsão de seu personagem que, além de falar mal dos ‘descobridores’ (“O Brasil teria sido muito melhor se os holandeses tivessem expulsado os portugueses definitivamente”), ainda revela que odeia bacalhau? Como criou o discurso desse personagem?

 

Ah, mas esse discurso é muito comum, embora os brasileiros não o assumam quase nunca. Eu o escutei muito, em debates na USP e em conversas de boteco, por pessoas de esquerda que lamentavam muito não terem sido colonizados por holandeses racistas e por negreiros ingleses supremacistas, muito pálidos e com falta de banho.

 

E também por pessoas de direita que acham Portugal um país subdesenvolvido. Uma história interessante, durante a Eurocopa de 2004, eu vi grande parte dos jogos no Brasil, e o treinador era o Felipão, um chato. Lembro-me de ouvir o Galvão Bueno na TV, gritando “Olha a torcedora portuguesa”, e eu ria, porque os comentadores vibravam com as imagens de mulheres portuguesas na bancada, como se tivessem descoberto que as portuguesas eram gostosas, mostrando a pele, dançando, e não eram matronas de bigode.

 

Nessa altura, de certa maneira, o Brasil descobria Portugal, um país moderno e mais atrevido. Mas eu compreendo o ressentimento contra o “português”. É uma necessidade. Só que esse personagem de “A luz de Pequim”, o Cledenor, que é operacional da Abin, é um fascista subtil, para quem o tempo é uma prisão. Os portugueses têm muitos defeitos, e ele os explora.

 

Os portugueses eram pobres, ligeiramente sujos, malvestidos, incivilizados, mulheres de bigode, o seu racismo era epidérmico, jesuítico, católico, não tinha fundamentação teórica, não era científico. Na Bienal do Livro, em São Paulo, várias pessoas vieram ter comigo e disseram “Olha, isso é verdade, nós não gostamos de assumir, mas é verdade, temos um certo antiportuguesismo.” Eu acho natural.

 

Funciona como as piadas de português. Eu gosto de piadas de português. Acho justas. E invento piada de brasileiro. Infelizmente, brasileiro não gosta muito de piada de brasileiro. Brasileiro tem uma certa ideia profética e religiosa do seu país, não gosta muito de crítica. 

 

E acho um pouco injusto o que a corrente dominante, hoje, diz de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque, até de Darcy Ribeiro, que tinham uma certa leitura de Portugal que não era tão negativa.

 

“Tudo começa pelo fim. Pela morte.” Essa sentença também descreve um dos recursos mais comuns aos romances policiais: um assassinato no início da narrativa. E, entre o início e o fim, o que cabe em um romance policial?  

 

Cabe tudo. Eu acho que quase toda a literatura é policial. O policial passeou de gênero minoritário e acabou devorando a “literatura séria”, porque o seu modelo narrativo é mais poderoso, mais fascinante, mais capaz de prender o leitor, menos autocentrado e menos chato, no fundo.

 

 Como leitor, o que mais o interessa em uma história? Poderia citar alguns autores brasileiros de que você mais gostou de ler?

 

Olha, os autores que mais me ensinaram a escrever, além do Eça de Queirós e do Camilo Castelo Branco, foram brasileiros.

 

A minha adolescência foi muito marcada por esses autores, Erico Verissimo, Graciliano, Jorge Amado, Euclydes, Drummond, Bandeira... E devo muito a dois escritores brasileiros de hoje, Rubem Fonseca (1925-2020), naturalmente, que é o maior criador da nossa língua no século 20, e Tabajara Ruas, um gaúcho fantástico, que conseguiu ligar a linguagem da prosa com a linguagem da poesia. Mas Rubem, Rubem é fantástico.

 

Aliás, há um livro meu, “Crime capital”, em que roubei um personagem de Rubem, o Mandrake, e me servi dele. O Rubem gostou. Foi um grande momento de felicidade.

 

"Eu gosto de piadas de português. Acho justas. E invento piada de brasileiro. Infelizmente, brasileiro não gosta muito de piada de brasileiro. Brasileiro tem uma certa ideia profética e religiosa do seu país, não gosta muito de crítica"

 

O que foi mais marcante no tempo em que você viveu no Brasil?

 

A descoberta de um país onde tudo era possível. Nós, europeus, temos um pouco a obsessão de Stefan Zweig com ‘o país do futuro’. Mas os portugueses querem encontrar um pouco do seu passado. É por isso que vamos a Ouro Preto, a Congonhas, a Porto Alegre, ao Rio, a certas zonas de Santa Catarina... Para encontrar o que nunca fomos realmente.

 

Não tenho ilusões: o Brasil também foi uma utopia nossa, como europeus, e gostávamos que o Brasil fizesse o que nós nunca soubemos fazer lá, na Europa. É uma responsabilidade muito grande para o Brasil. Nada a fazer. Mas também me marcaram a injustiça social, a pobreza extrema, tanto como a modernidade cultural, a capacidade criadora e criativa.

 

Leia: Em 'Outono', Karl Ove Knausgård derrapa no próprio cansaço provinciano 

 

Quando comecei a vir ao Brasil, na década de 1980, a Europa sabia muito pouco do Brasil, só conhecia praias, futebol e um pouco de música. Para mim foi importante descobrir os debates intelectuais dos anos 1960 e 70, gente como Nelson Rodrigues, Paulo Francis, Paulo Mendes Campos, Clarice Lispector, Arnaldo Jabor, Hilda Hilst. 

 

O que é possível fazer para reduzir a distância entre autores portugueses e leitores brasileiros e vice-versa?

 

Deixar que brasileiros e portugueses se encontrem em liberdade. Nunca houve uma verdadeira sinceridade entre nós. Fazer isso sem programa, sem muita liderança. Fazer isso em liberdade, deixar que nasça alguma empatia. Já existe alguma, mas era bom que os portugueses lessem melhor os brasileiros, e que os brasileiros não tivessem preconceito contra os portugueses. De parte a parte.

 

De onde vêm as suas histórias? De lembranças, da observação, da escuta ou da invenção?

 

Geralmente vêm de uma irritação súbita [risos]. Sobretudo são histórias que vêm das histórias dos outros. Incomoda-me muito a chamada auto-ficção, aquela coisa de boa parte dos escritores fazerem de si a personagem principal, o que os torna incapazes de empatia e de observação. Eu gosto das histórias dos outros, não por gostar dos outros, propriamente, mas porque as suas histórias são inspiradoras.

 

Às vezes vou para uma esplanada tomar nota de conversas, roubar vidas alheias. Escrever é isso, roubar vidas alheias, plagiar essas vidas. Não tenho paciência para o (Marcel) Proust, sabe? Aquela coisa de mastigar a ‘madalena’ até não sobrar mais nada, aquela madalena é infinita e chata. Nem para o (Karl Ove) Knåusgard, para aquele choro que irrompeu pela literatura e transformou os escritores em vítimas profissionais.

 

Como escritor gosto de tomar notas, tem sido a minha vida. Ver como os poderosos só fazem merda sempre que podem. Ver como as vidas ocultas são realmente as importantes. Ver como estamos sempre à beira do abismo, caminhando no precipício. Isso não se faz falando da nossa vida sem cessar, mas prestando atenção às vidas dos outros.

 

Costumo dizer: não me conte muitas coisas, tem cuidado que eu ponho tudo no próximo livro. De certo modo, sim, é uma herança do jornalismo, mas também do modo como o escritor do século 19 via o romance, um misto de revelação e de investigação. Sou um cara antigo, não é?

 

Trechos

(“A luz de Pequim”)

“Era voz comum que Jaime Ramos possuía, decididamente, uma personalidade recalcitrante. E dois dos seis últimos diretores tinham mesmo admitido, de forma mais ou menos velada, que se tratava de uma figura histórica da instituição, o que significava também ‘pitoresca’, e que, com o decorrer do tempo, teria de ser recolhida no museu da polícia para apreciação das gerações futuras, que olhariam com curiosidade para alguém que, à primeira vista, nada recomendaria – alguma obesidade depois dos 50, roupas de um homem que tinha preguiça para se vestir com outra coisa que não jeans, t-shirt e blusão, com o seu cabelo curto e grisalho, os dedos médio e indicador da mão direita manchados de nicotina e pouco mais de interessante. Não fazia jogging. Não tinha deixado de fumar. Não tinha morrido. Não acreditava na redenção de homicidas. Não tinha uma conta bancária confortável. Sinais particulares, nenhum em especial. Talvez uma ligeira surdez crônica. Mas isso não se notava – e ele disfarçava-a, admitindo que não ouvia o que lhe diziam porque geralmente não tinha interesse na conversa. Uma figura histórica. Eis o resumo.”

 

*

 

“Ele concordou. Estava habituado a concordar. Nunca se discorda de um brasileiro quando ele está embalado num discurso sobre a origem do mundo, explicando como Deus criou as espécies, os continentes, as línguas, os rios do paraíso – até chegar ao Brasil, uma espécie de objetivo final do trabalho divino. Como você sabe, Deus criou o mundo como pretexto para criar o Brasil. Na verdade, Deus apenas criou o Brasil – mas, para isso, teve de infestar o mundo de europeus, libaneses, africanos, árabes, chineses, bosquímanes, esquimós e portugueses. Dos portugueses, por lapsos, foram gerados todos os vícios e defeitos brasileiros. Os brasileiros, também por lapso (os portugueses não foram cuidadosos), misturaram-se com africanos e índios, apenas aqueles que os colonizadores tinham poupado ao massacre, e daí resultou o paraíso, de onde os portugueses teriam de ser expulsos para não contagiarem o mundo com tuberculose.”   

 

Nas palavras do autor

Francisco Viegas comenta outros livros protagonizados pelo policial Jaime Ramos e editados no Brasil

 

“As duas águas do mar” 
Record, 384 páginas 

 

“As duas águas do mar” é de 1992 e Jaime Ramos está ainda em dupla com Filipe Castanheira, o detetive que vive nas ilhas dos Açores. Juntos, investigam dois crimes cometidos em simultâneo, um na Galiza, Espanha, outro nos Açores. Jaime Ramos não entende o amor (ele começa por detestar cenários românticos, demasiado belos); prefere caminhar entre o processo da própria investigação, sorrindo sempre, cheio de cinismo, dúvidas – mas as grandes descobertas são dele, trabalhando no duro.

 

“Um céu demasiado azul” 
Record, 350 páginas

 

Lançado em 1995, é uma espécie de autonomização de Jaime Ramos, que parte para Cuba e para o México (onde comete adultério) em busca do passado de um ex-revolucionário que enriqueceu no mundo da publicidade e da televisão. É o início da obsessão de Ramos com as questões de poder e de classe que minam a sociedade portuguesa. Ao mesmo tempo, ele encontra personagens estranhas – como uma artista de striptease que estuda filosofia e foge para Venezuela. Mas também marca o início da sua descrença em relação ao trabalho da polícia, achando que há uma distinção clara entre “lei” 

e “justiça”. 

 

“Longe de Manaus” 
Record, 464 páginas

 

Sinto por “Longe de Manaus”, lançado em 2004, uma enorme ternura. Escrevi-o em duas ortografias – a portuguesa e a brasileira, consoante as personagens estão num e no outro lado do Atlântico. É a história de portugueses em fuga, que saem de Portugal e raramente querem regressar (e mantêm os seus laços antigos com Manaus, por exemplo, com a memória colonial ou libanesa – ou com Angola, onde tudo começa). No fundo, é um romance sobre a solidão e a melancolia portuguesas, que têm parte das suas raízes no Brasil, para onde Ramos viaja, encontrando o policial Omar, um espirituoso filósofo de Manaus; e um regresso de Ramos às histórias de amor sempre interrompidas.

 

“O mar em Casablanca” 
Gryphus, 254 páginas

 

“O mar em Casablanca” começa com um flashback que há de concluir-se com um ataque cardíaco de Ramos. É o começo das suas viagens ao passado: a África (onde é obrigado a revisitar o sangrento golpe de estado de 1977 em Luanda, bem como a guerra real na Guiné) e aos serviços secretos e às suas desilusões. Ainda hoje me comove muito o cenário inicial das florestas do Vidago, em Trás-os-Montes, onde ele revisita um hotel inaugurado em 1910, nas vésperas da República. Ramos tem uma crise cardíaca (premonitória da que eu próprio tive depois), mas sobrevive e conta os seus sonhos. É o livro em que há mais homicídios, de qualquer modo.

 

“A luz de Pequim”

De Francisco José Viegas

Editora Gryphus

350 páginas

R$ 59,90 


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