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Estado de Minas Talentos mineiros

Conheça os quatro artistas que testemunharam o nascimento de Minas

Quatro grandes talentos são considerados os primeiros nomes de expressão das artes no estado, e teriam presenciado a prisão de Filipe dos Santos


Minas 300 Anos
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postado em 02/12/2020 09:46 / atualizado em 02/12/2020 12:14

O professor Alex Fernandes Bohrer na Matriz Nossa Senhora de Nazaré: expoentes das artes certamente trabalhavam no templo no ano da Sedição de Vila Rica(foto: GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A PRESS - 8/2/18)
O professor Alex Fernandes Bohrer na Matriz Nossa Senhora de Nazaré: expoentes das artes certamente trabalhavam no templo no ano da Sedição de Vila Rica (foto: GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A PRESS - 8/2/18)

 
Uma lenda – ou uma história?  – bem curiosa ultrapassa os séculos e desperta a atenção no distrito de Cachoeira do Campo, em Ouro Preto, na Região Central de Minas. O leão pintado no coro da Matriz Nossa Senhora de Nazaré pelo português Antônio Rodrigues Bello teria as feições desse artista, que chegou à região, provavelmente, vindo da cidade do Porto, e foi o primeiro aqui na pintura em perspectiva.
 
“Dizem que alguns pintores ‘se colocam’ nas figuras que criam, então podemos ter, no leão, o rosto de Bello, de quem não há qualquer registro físico”, conta o professor de história da arte Alex Fernandes Bohrer, do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), em Ouro Preto.

A partir da sua tese de doutorado, “O estilo nacional português em Minas”, defendida em 2015 na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Bohrer partiu para estudos sobre Bello e mais três artistas – Manuel de Mattos e Mestre Cachoeira, escultores, e Manuel Francisco Lisboa, arquiteto. Pioneiros gabaritados nos seus ofícios, podem ser considerados também testemunhas do nascimento de Minas.“ Em 1720, ano da criação da Capitania de Minas e da Sedição de Vila Rica, com a morte de Filipe dos Santos, preso no adro da Matriz Nossa Senhora de Nazaré, eles estavam certamente trabalhando no templo, datado do início do século 18.”
 
Reza a tradição que o leão pintado no coro da matriz pelo português Antônio Rodrigues Bello teria as feições do artista (foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)
Reza a tradição que o leão pintado no coro da matriz pelo português Antônio Rodrigues Bello teria as feições do artista (foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)
 
 
Com pesquisas em documentação existente na Matriz Nossa Senhora de Nazaré e na Arquidiocese de Mariana, principalmente recibos assinados pelos artistas, Bohrer destaca como fundamental no trabalho a transcrição dos manuscritos pela professora de cultura e arte barroca Maria do Carmo Pires, da Universidade Federal de Ouro Preto(Ufop). Com todo o material transcrito, foi possível cruzar os dados e estudar a vida e a obra de cada um.

As investigações mostram que o escultor português Manuel de Mattos nasceu provavelmente no Norte de Portugal, embora não haja informações mais detalhadas sobre sua trajetória após trabalhar em Cachoeira do Campo, no retábulo da igreja matriz, e no distrito de Fidalgo, em Pedro Leopoldo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, que tem como atração a casa do bandeirante Fernão Dias (1608-1681), o famoso“Caçador de esmeraldas”. Em Fidalgo, Mattos empregou sua arte no altar da Capela Nossa Senhora do Rosário.

Quarteto fantástico


Conheça características dos primeiros grandes artistas de origem portuguesa do estado, que testemunharam o nascimento de Minas:

Manuel de Mattos, escultor

Nasceu provavelmente no Norte de Portugal. Em Minas, trabalhou em Cachoeira do Campo, nos retábulos da nave da Matriz Nossa Senhora de Nazaré, e na Capela Nossa Senhora do Rosário, no distrito de Fidalgo, em Pedro Leopoldo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Antônio Rodrigues Bello, pintor

Chegou muito novo a Minas, vindo do Porto, e teve destaque, pois ocupou cargo importante na Irmandade do Santíssimo Sacramento. Foi o pioneiro, aqui, na pintura em perspectiva, que usa colunas e outros recursos para dar a impressão de arquitetura. Trabalhou em Cachoeira do Campo, São Bartolomeu e Glaura, além de ter feito obras no Centro Histórico de Ouro Preto, conforme defende o mestrando e arquiteto Tiago da Cunha Rosa.

Mestre Cachoeira, escultor

Não se sabe ainda se era um artista ou um grupo que atuava numa oficina. São da autoria dessa escola as talhas do altar-mor e dos dois altares do arco-cruzeiro da Matriz Nossa Senhora de Nazaré, assim como o altar da Capela Nossa Senhora do Ó, em Sabará.

Manuel Francisco Lisboa, arquiteto

Mais conhecido dos quatro, o português Manuel foi responsável pelo traçado de muitas igrejas mineiras. Em Cachoeira do Campo, trabalhou na estrutura e cobertura do Palácio dos Governadores, do qual restam paredes integradas ao Colégio Nossa Senhora Auxiliadora. Morreu em 1767.

Refinamento


Bohrer explica que os quatro foram os primeiros grandes artistas a chegar a Minas: “Outros vieram antes, mas eram mais simples, sem tal refinamento e especialização profissional”. Manuel Francisco Lisboa, por exemplo, era arquiteto, na época chamado de “riscador”, e é o pai de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738- 1814). Mattos, Bello, Mestre Cachoeira e Manuel trabalharam juntos na igreja matriz de Cachoeira do Campo, uma das maiores obras conduzidas na região das minas, contratados pelas irmandades locais, entre elas a do Santíssimo Sacramento.

Sobre o pintor Antônio Rodrigues Bello, o pesquisador encontrou mais informações. Natural do Porto, ele chegou muito novo a Minas e teve destaque, pois ocupou cargo importante na Irmandade do Santíssimo Sacramento. “Foi o pioneiro, aqui, na pintura em perspectiva, que usa colunas e outros recursos para dar a impressão de arquitetura. Foi ‘o pai artístico’ do Mestre Ataíde, que fez o forro da Igreja São Francisco, em Ouro Preto, nos moldes da pintura em perspectiva”, ressalta o professor,em referência ao pintor Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), nascido em Mariana. Eleita uma das sete maravilhas do mundo colonial português, a Igreja São Francisco, no Centro Histórico, atrai visitantes do mundo inteiro e encanta os olhos pelo esplendor da arte barroca.

Bello esteve também no distrito de Glaura, onde se encontra em restauro a Igreja Santo Antônio. “Com certeza, a policromia, de autoria dele, vai aparecer, sob camadas de tinta branca, durante a restauração”, acredita o especialista, observando que o aluno Tiago da Cunha Rosa, do IFMG e da UFMG, está fazendo a dissertação de mestrado sobre o artista. Mas vale lembrar que nem tudo são flores nessa trajetória. Em 1738, Bello foi preso no distrito de São Bartolomeu ao participar de uma “arruaça”.

Mistério 


No trabalho em andamento, ainda intriga os pesquisadores aquele que denominam Mestre Cachoeira – pelos estudos feitos, trata-se na verdade de um conjunto de artistas que atuavam numa oficina. “Chamamos de Mestre Cachoeira por não ter informações precisas sobre a identidade do artista responsável pelas talhas do altar-mor e dos dois altares do arco-cruzeiro da Matriz Nossa Senhora de Nazaré”, explica o professor.

Em Sabará, na Grande BH, foi obra dessa escola o altar da Capela Nossa Senhora do Ó, conhecida como Capelinha do Ó, e famosa pelas chinesices. Derivada da palavra francesa chinoiserie, chinesice é o conjunto de pinturas que recriaram, no século 18, em igrejas e capelas de Minas, os pagodes ou pagodas (tipo de torre com fins religiosos comum na China e em outros países da Ásia), animais e paisagens.

O “quarteto fantástico” das origens da arte mineira se completa como mais conhecido, Manuel Francisco Lisboa, arquiteto e pai de Aleijadinho, ambos sepultados no interior da Matriz Nossa Senhora da Conceição de Antônio Dias, no Centro Histórico de Ouro Preto. Aleijadinho era filho da escrava alforriada Isabel.

Falecido em 1767, o português Manuel foi responsável pelo traçado de muitas igrejas de Ouro Preto. Em Cachoeira do Campo, um dos mais antigos povoamentos do município, trabalhou na estrutura e cobertura do Palácio dos Governadores (de veraneio, conhecido como Palácio de Cachoeira ou Palácio de Campo), do qual restam paredes integradas ao Colégio Nossa Senhora Auxiliadora.

Frutos

 
Neste ano de celebração do tricentenário da Capitania de Minas, e a partir do próximo, Bohrer considera fundamental ir mais fundo nas pesquisas. “Ainda há muito para ser descoberto. Nossos estudos geram frutos, a exemplo da dissertação do aluno Tiago Rosa sobre um nome praticamente desconhecido. Os estudos e o conhecimento abrem caminhos para sabermos cada vez mais e valorizar nossa história.”

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