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O constante ensaio submersivo do que é ser professor


15/10/2022 04:00

Isabela Azevedo
Professora do colégio e pré-vestibular Bernoulli. Docente graduada em letras pela UFMG e pós-graduada em gestão escolar pela PUC Minas

Estive, nos últimos meses, refletindo sobre o próprio estar em uma sala de aula: um lugar tão igual em sua essência e, ao mesmo tempo, tão múltiplo. Pensei em cada turma como um rio único no qual não se é possível banhar duas vezes e cheguei à conclusão de que, assim como na alegoria de Heráclito, eu, figura em imersão – igualmente em constante mudança –, nunca teria ao meu redor as mesmas águas. E que delícia conseguir enxergar o meu local de trabalho dessa forma, assim como perceber-me em constante transição.
 
Fosse numa escola do século 17, a educação ainda estaria centrada na reprodutibilidade: na tentativa de forçar circunstâncias nas quais água e banhistas se mantivessem sempre os mesmos. Ainda que o pai da didática moderna, Jan Amos Comenius, tenha percebido diferença entre as aptidões dos estudantes, o foco na repetição, ainda tão presente na escola contemporânea, impede historicamente o desfruto que as situações inusitadas e diariamente distintas potencialmente entregam à educação.

Nesse exato ponto do raciocínio, comecei a me perguntar: o que, então, fazer de diferente na busca pela mudança em um jeito de fazer que há séculos tem se consolidado na docência? E a resposta me veio clara como um insight que se tem na hora do banho: permitir-se não somente boiar nas novas águas e seguir a correnteza, mas aprofundar-se, sentir o tato de cada molécula, ser um ser pertencente ao meio em que se está e deixar-se molhar.

Assim tenho visto o meu trabalho nos últimos tempos. Assim tenho percebido o trabalho de colegas que tanto admiro. Em uma época de constantes mudanças, supor os mesmos alunos, nas mesmas cadeiras, com o mesmo comportamento todos os dias é supor tudo, menos uma sala de aula. De igual maneira, supor um mesmo docente diariamente com a mesma energia e com o exato mesmo roteiro é supor tudo, menos um professor de verdade.

Por isso, talvez nunca tenha sido tão difícil ser docente. Não há script engessado que se encaixe no ensino atual, ou pelo menos não deveria haver. E isso traz suas barreiras porque é como se todos os dias nos entregassem peças de uma máquina a ser construída em conjunto sem que houvesse um manual de instruções. Ao mesmo tempo em que, por diversas vezes, o cansaço e o desgaste da profissão nos façam desejar profundamente o passo a passo descrito, no qual conseguiríamos encontrar descanso, a imprevisibilidade do cotidiano é o que nos encharca de versatilidade, de reinvenção: é o nosso principal e mais importante combustível criativo.

Concluí, então, como aquela que vive todos os dias pela primeira vez e sem preparação, como Milan Kundera diz em “A insustentável leveza do ser”, que, como professora, estou em constante ensaio da vida real. Estou sempre mergulhando em águas novas, sempre reaprendendo novas bordas. Frequentemente, tendo que subir à atmosfera em busca de um novo ar, constantemente voltando aos mestres educadores que me formaram em busca de um como fazer, mas inexoravelmente entendendo que o melhor de mim para os meus alunos vem do imprevisível. E assim fluímos juntos.

Feliz dia daqueles que se reinventam todos os dias. Feliz dia, meus queridos amigos professores.


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