O desmatamento na Amazônia continua em expansão, sem provocar qualquer reação do poder público. Os dados divulgados ontem pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelam que, em junho, 1.120 quilômetros quadrados (km²) de mata nativa foram destruídos, representando um aumento de 5,5% na comparação com igual mês de 2021. As perdas acumuladas no primeiro semestre deste ano chegam a 3.988km², número 10,6% maior que o do mesmo período do ano passado, quando chegou ao recorde da série temporal do sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter-B), iniciada em 2016.
Muitos são os impactos sociais, econômicos e climáticos decorrentes das ações predatórias – muitas encorajadas pelos projetos do Executivo e apoiados pelo Legislativo – para as demais regiões do país. O desflorestamento é desagregador dos grupos populacionais, como indígenas, ribeirinhos, povos tradicionais, reconhecidos como guardiões da floresta. O deslocamento dessas populações, oprimidas pelos predadores, para outros territórios implicará aumento da pobreza e miséria. Hoje, o país tem mais de 33,1 milhões de famintos e mais de 100 milhões em total insegurança alimentar. Essa tragédia socioeconômica tende a tomar dimensões incontornáveis, devido à inércia do poder público.
O avanço do desflorestamento terá reflexos negativos na agropecuária – tanto na agricultura familiar, responsável por cerca de 77% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros, quanto no agronegócio, voltado ao mercado externo. A derrubada da floresta reduz os serviços hidrológicos realizados pelas árvores. Segundo especialistas, parte do vapor d’água da floresta amazônica é levado pelos ventos – os rios voadores – até as regiões do Centro-Sul, onde estão concentradas as atividades do agronegócio. Sem chuva, não há produção de alimentos nem de grãos.
Apesar de os relatórios sobre o desmatamento serem elaborados pelos órgãos oficiais do Estado, o agravamento da situação não implica ações contra a destruição das florestas. Pelo contrário. São comuns trabalhos de formulação e aprovação de projetos que fortalecem atividades desse tipo em áreas preservadas, ou que assim deveriam estar, devido à sua relevância como patrimônio natural e pela essencialidade que representam ao equilíbrio climático.
O desmonte dos órgãos de fiscalização favorece a impunidade dos predadores ambientais, dos invasores dos territórios de povos originários e tradicionais e dos criminosos que abatem os ativistas e quaisquer defensores do meio ambiente. Não à toa, o descaso do Estado abriu larga brecha para que bandidos executassem o indigenista Bruno Araújo Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips, em 5 de junho passado. Eles atuavam para conter as invasões por narcotraficantes, pescadores, caçadores ilegais e garimpeiros na terra indígena Javari, no Oeste do Amazonas. Todos esses episódios prestam-se para ampliar a enorme mancha que afeta a credibilidade do país. É fundamental que as políticas públicas sigam em direção contrária ao percurso até agora tomado, evitando que o Brasil seja colocado como um pária em relação ao meio ambiente e aos direitos humanos.