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Estado de Minas

Homologação de acordo de preservação da mata atlântica

Minas Gerais está dando exemplo para todo o país, senão para o mundo, em uma questão extremamente sensível


22/09/2021 04:00

Gilson Soares Lemes
Desembargador, presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais
 
Está expresso no inciso 4º do artigo 225 da Constituição Federal de 1988: “A floresta amazônica brasileira, a mata atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a zona costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais”.
 
Nossa mata atlântica é, portanto, patrimônio nacional. De imensurável biodiversidade, é também declarada reserva da biosfera pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Um bioma que, de acordo com dados da organização não governamental Fundação SOS Mata Atlântica, abrange cerca de 15% do território brasileiro, em 17 estados, “é lar de 72% dos brasileiros e concentra 70% do PIB nacional”. Dele dependem aspectos fundamentais para a qualidade de vida de milhões de pessoas, diante dos seus impactos no abastecimento de água, na regulação do clima, na agricultura, na pesca e na geração de energia elétrica.
 
A mata atlântica é, contudo, o bioma mais ameaçado do Brasil, restando hoje, segundo estimativas de órgãos ambientalistas, apenas 12,4% da floresta que existia originalmente no país. Minas Gerais, infelizmente, desponta como um dos estados que têm as maiores áreas de destruição florestal, ao lado da Bahia e do Paraná.
 
Ocorre que chegamos a um ponto de encruzilhada. Estamos há quase um ano e meio mergulhados em uma pandemia que provocou crises econômicas e sociais de grande magnitude em várias partes do mundo e tem nos desafiado diariamente. Além de exigir de todos nós profunda capacidade de resiliência, o novo coronavírus nos mostrou quão urgente é a questão ambiental. Cientistas e ambientalistas de todo o planeta têm sido unânimes em alertar para o fato de que esta crise sanitária tem relação direta com a forma desequilibrada com que temos nos relacionado com o meio ambiente.
Sabemos que a pandemia é apenas um dos sintomas da destruição inconsequente da natureza, que marcou a história do nosso desenvolvimento. O aumento de áreas desertificadas, o derretimento de geleiras e a extinção de espécies, que resultam do aquecimento global, são apenas outras tristes consequências desse processo. Mas uma mudança de postura é urgente se não quisermos, em um futuro não muito distante, inviabilizar a vida neste planeta.
 
Cuidar dessa nossa casa comum é uma responsabilidade que cabe a todas as instituições públicas, dentro de suas respectivas atribuições, e a cada um de nós, individualmente. Como reza também nossa Carta Magna, ainda no artigo 225, “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Cumprir esse preceito constitucional não será possível se não acelerarmos as mudanças necessárias para garantir mais compatibilidade entre as atividades humanas e a sustentabilidade da Terra, espaço que compartilhamos.
 
Por isso, é com grande satisfação que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais homologou termo de acordo celebrado entre o MPMG e o Estado de Minas Gerais, colocando fim a um processo judicial em trâmite na 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.
 
Além de todas as vantagens que a autocomposição representa para a pacificação social, e que já temos amplamente alardeado, este acordo, em especial, é de imenso alcance, ao trazer a compatibilidade entre o ordenamento vigente e as obrigações de regularização ambiental de atos autorizativos de supressão de mata atlântica.
 
Destaco um ponto do acordo: “o Estado de Minas Gerais se obriga a observar todas as determinações constantes da Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/2006), seu decreto regulamentador (Decreto 6.660/2008), as especificações técnicas constantes das Resoluções 392/2007 e 423/2010 do Conselho Nacional do Meio Ambiente, da Deliberação Normativa 201/2014, do Conselho Estadual de Política Ambiental, e das normas legais mencionadas, bem como dos atos normativos que venham a complementá-las ou sucedê-las. Isso, sem prejuízo que o Estado de Minas Gerais expeça normas ainda mais protetivas ao meio ambiente, devendo observar aquela que se mostrar mais favorável à preservação ambiental e ao bioma mata atlântica.”
 
Minas Gerais, não tenho dúvidas, está dando neste momento um exemplo para todo o país, senão para o mundo, em uma questão extremamente sensível. Trata-se de uma composição de extrema relevância, pois visa contribuir para que se estabeleça uma relação de mais harmonia entre o meio ambiente na mata atlântica e as atividades humanas.
 
Esse acordo é também uma mostra clara de que a cultura do diálogo está mais e mais solidificada em Minas. Neste caso específico, as próprias partes, de maneira autônoma, sentaram-se à mesa para negociar, sem intermediários, assumindo assim total protagonismo para a solução de uma disputa judicial. Chegaram por fim a este termo, que agora será chancelado pelo Judiciário mineiro. Por meio da homologação, o acordo passa a ter natureza de título executivo judicial.
 
Não tenho dúvidas de que os acordos recentes celebrados aqui nesta Casa, com grande repercussão social, como o histórico acordo entre a Vale S.A. e instituições públicas, no caso do rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, inspirou o Ministério Público de Minas Gerais e o Estado de Minas Gerais a buscarem os métodos autocompositivos para chegar a uma solução para esse conflito.
 
Em nome do Poder Judiciário, levo as congratulações a todos aqueles que atuaram para que este acordo fosse celebrado, em especial ao governador de Minas, Romeu Zema, com quem temos mantido as mais republicanas relações e um diálogo estreito e permanente, e ao procurador-geral de Justiça, Jarbas Soares Júnior, que, em pouco mais de nove meses à frente do Ministério Público de Minas, tem dado mostras do seu grande espírito conciliador e da sua competência.
 
Em 27 de maio de 1560, o padre jesuíta José de Anchieta escreveu a Carta de São Vicente, narrando para seus superiores um pouco da geografia que encontrou nestas terras, e com isso nos legando um precioso documento sobre a mata atlântica, naquela remota época. A missiva histórica é considerada a primeira descrição detalhada do bioma, e gostaria de encerrar minha fala com a leitura de um trecho desse relato, que revela o olhar minucioso e ao mesmo tempo deslumbrado do religioso diante da exuberância da floresta com que se deparava:
 
"Todo o Brasil é um jardim em frescura e bosque e não se vê em todo o ano árvores nem erva seca. Os arvoredos se vão às nuvens de admirável altura e grossura e variedade de espécies. Muitos dão bons frutos e o que lhes dá graça é que há neles muitos passarinhos de grande formosura e variedade e em seu canto não dão vantagem aos rouxinóis, pintassilgos, colorinos, e canários de Portugal e fazem uma harmonia quando um homem vai por este caminho, que é para louvar ao Senhor, e os bosques são tão frescos que os lindos e artificiais de Portugal ficam muito abaixo. Ha muitas árvores de cedro, áquila, sândalos e outros paus de bom olor e várias cores e tantas diferenças de folhas e flores que para a vista é grande recreação e pela muita variedade não se cansa de ver". 
 
Que o termo homologado permita perenizar a diversidade da fauna e da flora que ainda resiste nesse imenso jardim que tanto encantou o padre José de Anchieta.

Muito obrigado! 


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