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Estado de Minas

Plenário do STF decide quinta sobre anulação das condenações de Lula; entenda

Ministros vão analisar decisão de Fachin que considerou Justiça do Paraná incompetente para julgar petista.


14/04/2021 23:25 - atualizado 14/04/2021 23:24


Lula em entrevista à BBC em Curitiba no ano de 2019; STF vai julgar se mantém ou não decisão de Fachin que considerou a Justiça do Paraná incompetente para julgar Lula(foto: BBC)
Lula em entrevista à BBC em Curitiba no ano de 2019; STF vai julgar se mantém ou não decisão de Fachin que considerou a Justiça do Paraná incompetente para julgar Lula (foto: BBC)

 

Após acalorado debate, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o plenário da Corte julgará nesta quinta-feira (15/04) se os processos da Operação Lava Jato contra do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que tramitaram na Justiça Federal do Paraná devem ser anulados e refeitos na Justiça do Distrito Federal.

 

A Corte analisará se mantém decisão do ministro Edson Fachin que, no início de março, entendeu que a 13ª Vara de Curitiba, comandada pelo ex-juiz Sergio Moro até novembro de 2018, é incompetente para julgar os processos do petista.

 

O tema gerou embate nesta quarta-feira entre os ministros porque Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello defenderam que a questão deveria ser julgada na Segunda Turma do STF, órgão responsável pela maioria dos processos da Lava Jato.

 

No entanto, a maioria da Corte entendeu que o relator do caso, Edson Fachin, tem o poder de remeter o recurso ao plenário, quando julgar que a questão é relevante e precisa ser apreciada pelos onze ministros.

  

Para críticos de Fachin, porém, sua decisão de remeter recursos de Lula ao plenário é uma manobra para evitar o julgamento na Segunda Turma, quando o balanço de forças é favorável ao petista.

 

Lewandowski lembrou que o mesmo foi feito em 2018, quando Fachin levou ao plenário o julgamento de uma habeas corpus de Lula que poderia ter evitado sua prisão no processo do Triplex do Guarujá. Aquele julgamento acabou em resultado apertado, de 6 a 5, levando o petista a ficar preso por 580 dias.

 

"Gostaria de veicular minha estranheza, que dos milhares de habeas corpus que a Primeira e a Segunda Turma julgam o ano todo, por que é justamente o caso do ex-presidente que é submetido ao plenário dessa Suprema Corte? Será que o processo tem nome e não tem apenas capa, como diz o eminente ministro Marco Aurélio?", questionou,


Sergio Moro comandou 13ª Vara de Curitiba até novembro de 2018(foto: Reuters)
Sergio Moro comandou 13ª Vara de Curitiba até novembro de 2018 (foto: Reuters)

Para Lewandowski, apenas questões constitucionais ou temas controvertidos na Corte deveriam ser levados ao plenário. Na sua avaliação, esse não é o caso da discussão sobre em que local os processos do ex-presidente devem ser julgados.

 

O ministro chegou a dizer que, se Lula não tivesse sido preso, o resultado da eleição de 2018, vencida pelo presidente Jair Bolsonaro, poderia ter sido diferente. O petista liderava as pesquisas de intenção de voto, mas foi impedido de disputar por causa da Lei da Ficha Limpa, já que estava condenado em segunda instância.

 

"Se essa inversão (levar em 2018 o habeas corpus da Segunda Turma ao plenário) não tivesse sido feita, a história do Brasil poderia ter sido diferente. E talvez os acontecimentos que estamos vivendo no Brasil pudessem ter um rumo distinto. Então, foi uma opção que o Supremo Tribunal Federal fez e que teve consequências muito sérias", criticou ainda.

 

Apenas Marco Aurélio Mello acompanhou o voto de Lewandowski. Gilmar Mendes, por sua vez, aceitou a análise do caso pelos onze ministros, mas criticou a "arbitrariedade" da decisão de Fachin de levar os recursos de Lula ao plenário. Os demais ministros consideraram que o regimento interno do STF permite ao relator fazer isso.

 

O presidente do STF, Luiz Fux, ressaltou que a decisão sobre o local competente para julgar os processos de Lula — se a Justiça do Paraná ou do Distrito Federal — pode ter impacto sobre outros casos da Lava Jato e "atingir, digamos assim, um grande trabalho feito pelo Supremo Tribunal Federal no combate à corrupção". Na sua visão, isso torna a matéria relevante para análise no plenário.

 

Barroso, por sua vez, disse que o regimento interno da Corte "é claríssimo" ao permitir que o relator leve o caso ao plenário, e afastou interferência política na sua decisão.

 

"Desde que eu me tornei juiz, eu abdiquei inteiramente de quaisquer preferências políticas. E não nutro qualquer paixão jurisdicional. Julgo com serenidade, à luz da Constituição, das leis e do regimento interno, nesse caso", ressaltou.

Entenda o julgamento que ocorre na quinta-feira

No início de março, Fachin deflagrou uma reviravolta na política brasileira ao decidir individualmente anular as condenações de Lula pela Justiça Federal do Paraná, o que devolveu ao petista o direito a se candidatar na eleição de 2022.

 

O plenário, agora, vai julgar se mantém ou não essa decisão. Depois, caso a maioria referende a posição de Fachin, a Corte analisará se isso derruba ou não o julgamento da Segunda Turma do STF que declarou Sergio Moro parcial ao condenar Lula no caso do Triplex do Guarujá.

 

Isso porque Fachin argumenta que o reconhecimento de que Moro não poderia ter julgado o petista por não ser o juiz competente da causa derrubaria a necessidade de decidir se ele foi parcial ou não.

 

Esse intrincado cenário torna improvável que o julgamento desta quinta reverta a atual situação de Lula, retirando do petista novamente seus direitos políticos, já que ao menos uma das decisões tende a ser mantida — a que anula as condenações pela incompetência de Moro ou a que o considerou parcial.

 

Há ainda a possibilidade que ambas continuem válidas, o que demandará que os processos contra o ex-presidente sejam refeitos, com possibilidade pequena de reaproveitamento de provas produzidas na Justiça do Paraná.

 

Nesse cenário, Lula só ficará impedido de disputar a eleição se for novamente condenado em segunda instância judicial antes de outubro de 2022.

Entenda melhor essas questões a seguir em três pontos.

1) Qual o debate sobre "incompetência" da Justiça do Paraná?

A decisão de Fachin, relator da Lava Jato no STF, foi tomada a partir de um recurso da defesa de Lula que argumentou que seus processos não deveriam ter sido julgados na 13ª Vara de Curitiba, comandada até novembro de 2018 por Moro.

 

Advogados de acusados na Lava Jato há muito questionavam por que processos que envolviam possíveis crimes em diversas partes do Brasil eram julgados na vara do Paraná.

 

Na visão desses defensores, isso contrariava o princípio do juiz natural, segundo o qual a vara para a qual um caso é remetido tem relação com o local dos crimes investigados.

 

Uma decisão do plenário do STF do início da Lava Jato, porém, permitiu que todos os casos envolvendo corrupção na Petrobras fossem mantidos em Curitiba, gerando uma "supercompetência" nas mãos de Moro.

 

Na decisão que anulou as condenações contra Lula, Fachin diz que hoje há novos entendimentos do Supremo que levaram diversos processos a serem distribuídos para outras varas do país. Nesse contexto, ele considerou que as acusações contra o ex-presidente devem ser julgadas pela Justiça do Distrito Federal.

 

"Com as recentes decisões proferidas no âmbito do Supremo Tribunal Federal, não há como sustentar que apenas o caso do ora paciente deva ter a jurisdição prestada pela 13ª Vara Federal de Curitiba. No contexto da macrocorrupção política, tão importante quanto ser imparcial é ser apartidário", disse Fachin.

 

Segundo a decisão de Fachin, os supostos atos ilícitos citados nos processos contra Lula iniciados em Curitiba "não envolviam diretamente apenas a Petrobras, mas ainda outros órgãos da Administração Pública".

 

Nota do gabinete do Fachin sobre a decisão diz que, "embora a questão da competência já tenha sido suscitada indiretamente, é a primeira vez que o argumento reúne condições processuais de ser examinado, diante do aprofundamento e aperfeiçoamento da matéria pelo Supremo Tribunal Federal".

 

O fato de haver precedentes — ou seja, outras decisões similares do STF — retirando de Curitiba processos da Lava Jato torna mais difícil que o plenário da Corte reverta a decisão de Fachin sobre Lula. Casos contra a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), o ex-ministro Paulo Bernardo e o ex-ministro Guido Mantega, por exemplo, já foram enviados para São Paulo ou Brasília.


'No contexto da macrocorrupção política, tão importante quanto ser imparcial é ser apartidário', afirmou Fachin(foto: Nelson Jr./SCO/STF)
'No contexto da macrocorrupção política, tão importante quanto ser imparcial é ser apartidário', afirmou Fachin (foto: Nelson Jr./SCO/STF)

"Inicialmente, retirou-se todos os casos que não se relacionavam com os desvios praticados contra a PETROBRAS. Em seguida, passou a distribuir por todo território nacional as investigações que tiveram início com as delações premiadas da Odebrecht, OAS e J&F. Finalmente, mais recentemente, os casos envolvendo a Transpetro (subsidiária da própria Petrobras) também foram retirados da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba", dizia a nota divulgada pelo gabinete de Fachin no início de março, ao listar ações do STF que restringiram o alcance da competência da 13ª Vara Federal.

 

A decisão de Fachin anulou todas as decisões processuais em quatro ações penais contra Lula. Duas delas já tinham gerado condenações (Triplex do Guarujá e Sítio de Atibaia) e duas ainda não tinham sido julgadas (ambas relacionadas a suposto recebimento de propina por meio do Instituto Lula).

 

Nos quatro casos, o petista é acusado de ter sido beneficiado ilegalmente por empreiteiras que receberam contratos superfaturados da Petrobras e de outras empresas ou obras públicas. Lula nega as acusações e se diz perseguido pela Lava Jato.

2) Quais os argumentos contra a decisão de Fachin?

A Procuradoria-Geral da República (PGR) recorreu da decisão de Fachin e pede ao plenário do STF que reconheça a competência da Justiça do Paraná para julgar Lula na Lava Jato.

 

A subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo, que assina o recurso, argumenta que sucessivas decisões de instâncias inferiores da Justiça ao longo de cinco anos reconheceram a vara de Moro como responsável pelos processos de Lula. Na sua visão, reverter esse entendimento agora vai contra a estabilidade processual e a segurança jurídica.

 

Enquanto a defesa do petista diz que o Ministério Público Federal não foi capaz de provar que Lula foi beneficiado por recursos desviados da petroleira, na medida em que os procuradores descrevem uma suposta conta geral de propinas abastecida por diversos contratos públicos superfaturados, Lindôra Araújo diz que os crimes descritos nos processos contra o petista "estão, a toda evidência, associados diretamente ao esquema criminoso de corrupção e de lavagem de dinheiro investigado no contexto da 'Operação Lava Jato' e que lesou diretamente os cofres da Petrobras"

 

Caso o STF não aceite os argumentos da PGR e mantenha a decisão de Fachin, a subprocuradora-geral pede ao menos que a incompetência da vara de Curitiba seja válida apenas para etapas futuras dos processos contra Lula, mantendo assim as duas condenações contra ele (casos Triplex do Guarujá e Sítio de Atibaia).

 

Se esse pedido for acatado, apenas os dois processos em estágio menos avançado seriam remetidos à Justiça do Distrito Federal.

3) Como o julgamento interfere na suspeição de Moro?


Um dos cenários possíveis é o STF manter a incompetência da Justiça do Paraná, mas derrubar o julgamento da parcialidade de Moro(foto: BBC)
Um dos cenários possíveis é o STF manter a incompetência da Justiça do Paraná, mas derrubar o julgamento da parcialidade de Moro (foto: BBC)

A Segunda Turma do STF decidiu em 23 de março que Moro foi parcial ao julgar Lula no caso do Triplex do Guarujá — decisão que tende a ser estendida aos outros processos do petista que tramitaram na 13ª Vara de Curitiba.

 

Para Fachin, o julgamento da suspeição não deveria ter ocorrido porque a decisão sobre a incompetência da Justiça do Paraná automaticamente derrubaria todos os outros recursos do petista nos processos da Lava Jato.

 

Esse argumento de Fachin, porém, foi rejeitado por quatro ministros da Segunda Turma — Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Nunes Marques. Com isso, o recurso foi julgado, e acabou aceito por três a dois (apenas Fachin e Nunes Marques votaram contra a suspeição do ex-juiz).

 

Se a maioria do plenário do STF manter a incompetência da Justiça do Paraná, mas derrubar o julgamento da parcialidade de Moro, os quatro processos terão que ser refeitos em Brasília, mas pode ser mais fácil que provas produzidas em Curitiba sejam reaproveitadas.

 

Já se a parcialidade do ex-juiz for mantida, esse reaproveitamento fica mais difícil, na medida em que as provas produzidas em processos conduzidos por Moro estariam "contaminadas" por sua conduta suspeita, ou seja, seriam consideradas ilegais.


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