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Estado de Minas

Coronavírus: o que é a dexametasona e por que não pode ser tomada sem indicação médica

Estudo da Universidade de Oxford indica que medicamento pode reduzir mortalidade em casos graves e moderados, mas médicos recomendam cautela.


18/06/2020 09:22 - atualizado 18/06/2020 09:31

Estudo de Oxford indicou redução de mortalidade com uso de droga em casos graves e moderados
Estudo de Oxford indicou redução de mortalidade com uso de droga em casos graves e moderados (foto: Getty Images)

Promessas de tratamentos podem trazer perigos, como o da automedicação.

Nesta terça (16), um grupo de pesquisadores da Universidade Oxford, no Reino Unido, anunciou que, segundo um estudo realizado por eles, o corticoide dexametasona reduziu a mortalidade de pacientes de covid-19 em ventilação mecânica.

A notícia trouxe esperança, mas é preciso esclarecer desde cedo: automedicar-se é perigoso e, no caso da dexametasona e a doença causada pelo coronavírus, o uso do remédio sem acompanhamento médico e sem necessidade ou indicação pode acabar fazendo o contrário do que se deseja: dificultar o combate do vírus pelo corpo. Também pode causar outros efeitos colaterais. A droga só pode ser usada com acompanhamento médico.

O anúncio dos pesquisadores não coloca o remédio como uma cura para a covid-19, mas como um medicamento positivo para pacientes com indicação para utilizá-lo, dentro de tratamentos hospitalares para casos graves e moderados.

Isso porque o medicamento não ataca diretamente o vírus, mas sim pode ajudar a controlar a forte reação inflamatória causada pela covid-19 em pacientes que estão em situação mais grave.

A covid-19 já matou quase 450 mil pessoas no mundo inteiro, e não há tratamentos ou vacinas aprovadas contra ela.

A pesquisa

Por meio de uma nota de duas páginas apresentada à imprensa - e ainda sem divulgação de dados completos ou avaliação de pares -, os pesquisadores de Oxford anunciaram que a dexametasona aumentou a sobrevida de pacientes de covid-19 que estavam hospitalizados.

Pesquisadores divulgaram resultados de ensaio clínico com medicamento, mas estudo ainda não foi publicado
Pesquisadores divulgaram resultados de ensaio clínico com medicamento, mas estudo ainda não foi publicado (foto: Getty Images)

No teste realizado pelos pesquisadores, 2.104 pessoas receberam doses de 6 mg do medicamento uma vez por dia durante 10 dias, enquanto 4.321 não tomaram a droga, e foram tratadas apenas com o cuidado habitual. Trata-se de um estudo clínico randomizado, metodologia das melhores para estudos científicos.

O resultado, segundo os cientistas, mostrou que as taxas de mortalidade dos pacientes graves e submetidos à ventilação mecânica que tomaram o medicamento foram reduzidas em um terço. A mortalidade dos que não estavam em respiradores, mas recebiam oxigêncio suplementar foi reduzida em um quinto. Por fim, não houve benefícios para pacientes que não precisavam de ajuda para respirar.

O ensaio faz parte do estudo clínico randômico Recovery, que investiga seis potenciais tratamentos contra a covid em mais de 11 mil pacientes.

Ação do medicamento

A droga, antiga e barata, é anti-inflamatória e, em doses mais altas, imunossupressora. Ela é usada para doenças como a asma e a artrite, ou seja, doenças alérgicas e reumatológicas.

A dose estudada pelos cientistas da Oxford não é uma em que o medicamento teria essa função imunossupressora, e o medicamento já está sendo usado em diversas UTIs como parte do tratamento contra a covid-19.

(foto: BBC)

Os cientistas de Oxford dizem que seu estudo mostrou que a dexametasona reduziu a mortalidade de quem estava hospitalizado em estado grave ou moderado, precisando de ventilação ou oxigênio.

Por isso, não deve ser usado em casos leves nem como prevenção. Não há comprovação da eficácia ou segurança dessa ou de nenhuma droga nesses casos.

Além disso, como a droga pode causar uma ação imunossupressora, diz Raquel Stucchi, infectologista da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, ela pode ser perigosa se tomada no início da infecção por coronavírus.

"No início da infecção, temos muito vírus se replicando no nosso corpo. O sistema de defesa vai tentar acabar com esse microorganismo. Quando tomamos dexametasona, nossas células de defesa não vão conseguir agir", afirma. "Vai inibir nossa ação de defesa e o vírus vai aumentar muito."

Mas, na evolução da doença, depois do sexto, sétimo ou oitavo dia, de acordo com ela, nosso organismo pode dar uma resposta inflamatória muito exacerbada para combater a infecção. É nessa fase da doença, moderada ou grave, que a dexametasona pode entrar para tirar a inflamação.

É a chamada "tempestade de citocinas", uma reação imune do corpo potencialmente fatal.

"Quando o vírus invade nosso corpo, temos uma resposta imune. Muitas vezes, essa resposta da imunidade, obviamente para destruir o vírus, acaba destruindo nossa estrutura celular. E a inibição dessa resposta não acontece, deixando o sistema imune desregulado", diz o infectologista Moacyr Silva Jr., do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar e da UTI do Hospital Israelita Albert Einstein.

A ideia do uso do corticoide, então, "é dar uma brecada nesse quadro inflamatório", explica ele.

Mas o que está acontecendo em relação à covid-19, diz o médico, é que as pessoas querem utilizar medicamentos de casa, sem critério, "de forma desenfreada".

Cuidados

Segundo o jornal Valor Econômico, considerando um pedido do infectologista David Uip, coordenador do centro de combate ao novo coronavírus do governo de São Paulo, líderes da Câmara avaliam restringir a compra de dexametasona apenas para quem tiver receita médica.

Sem indicação médica, pacientes que fizerem uso da dexametasona podem diminuir a defesa do organismo, deixando esse sistema exposto a mais infecções, e ter versões mais graves de qualquer coisa, como gripe, dengue, pneumonia comum, entre outros.

"O grande problema é que, se utilizar de forma desenfreada, sem critério, o medicamento pode coibir a imunidade do nosso corpo e o vírus pode se disseminar", diz Silva Jr.

Por isso, as pessoas que fazem uso crônico do medicamento, por exemplo, têm a orientação de que têm defesa mais baixa, e devem tomar cuidado a qualquer sinal de febre, não podem tomar vacina de vírus atenuado etc. "Sabem que são imunossuprimidos e que têm que tomar mais cuidado", observa Stucchi.

Silva Jr. lista alguns dos efeitos colaterais possíveis para quem faz o uso crônico do medicamento: o paciente pode engordar, aumentar o apetite, o medicamento pode dar insônia, estrias pelo corpo, aumentar a pressão, favorecer a diabetes e, por fim, como disse Stucchi, diminuir a imunidade, favorecendo outras infecções virais.

"É um medicamento que não é inócuo. Tem que ter indicação médica", afirma.

Além disso, uma corrida pelo medicamento pode ser perigosa, de acordo por Stucchi, porque pode eventualmente causar um déficit, se não houver produção suficiente para uso hospitalar.

De qualquer forma, pesquisadores alertam que é preciso esperar a publicação do estudo para analisar seus dados.

"Precisamos ver esse estudo para que ele tenha validação. Por enquanto, é uma verdade unilateral. Pesquisadores do mundo todo precisam avaliar", diz Silva Jr. "As pessoas têm que ter paciência, não pode querer utilizar algo sem ter ainda a comprovação científica. Caso contrário vira alquimia, não ciência médica."

(foto: BBC)
(foto: BBC)

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