Esse é um exemplo de violência imperante, que o país luta para conter.
"Centenas de aldeões vieram de todos os lugares para nos atacar", Walinaye Mwanguphiri conta aos 36 anos à AFP. Ele escapou da morte, mas perdeu seu irmão e os pais.
A crença na bruxaria é generalizada no Malawi, um dos países mais pobres do mundo. Aproximadamente três a cada quatro pessoas vivem com menos de dois dólares por dia, segundo o Banco Mundial.
Desde 2019, ao menos 75 pessoas suspeitas de praticar magia foram assassinadas por multidões, informou a ONG local Centro dos Direitos Humanos e Reabilitação (CHRR).
Os jornais locais confirmaram na semana passada o assassinato do chefe de uma aldeia acusado de feitiçaria pelos habitantes de Dedza, no centro.
Em 2017, rumores de vampiros percorreram o sul do país, causando a morte de sete pessoas. As autoridades acionaram um toque de recolher noturno e os funcionários da ONU foram retirados da região.
No entanto, as ONGs e as autoridades não conseguem chegar em um acordo sobre o que deve ser feito.
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Em dezembro, uma comissão especial encarregada de formular propostas recomendou que a existência da feitiçaria fosse reconhecida. Atualmente, em Malawi, acusar alguém de ser um bruxo é crime.
A comissão considerou que a lei, elaborada sob regime colonial britânico, parte da não existência da bruxaria, indo contra as convicções da maioria dos malauianos.
"As crenças não podem ser negadas por lei", escreve o juiz aposentado do Supremo Tribunal, Robert Chinangwa. "Consequentemente, a comissão recomenda que a lei reconheça a existência da bruxaria, mas criminalize sua prática", detalha.
Criminalizar a prática poderia ajudar a acalmar os justiceiros que castigam os suspeitos, segundo o diretor do CHRR Michael Kaiyatsa. O aumento dos recursos para a polícia reduziria a sensação de impunidade, devido à falta de prisões e julgamentos, afirma ele.
Entretanto, conseguir condenações pode ser tão difícil quanto encontrar provas tangíveis de bruxaria.
Em Lupembe, a 560 quilômetros ao norte da capital Lilongwe, Walinaye Mwanguphiri não tem ilusões. Em uma casa com chão de terra e telhado de palha, ele conta dolorosamente a trágica sequência que o deixou orfão.
O filho de seu primo havia morrido de uma doença no dia anterior e a família se reuniu para enterrá-lo, quando a multidão os atacou. "Nos acusaram de tê-lo matado para bruxaria", explica ele.
"Sobrevivi por um fio", detalha Mwanguphiri. Os agressores agrediram seus pais, seu irmão e sua tia até a morte, além de destruir várias casas antes de se dispersarem.
A polícia, que não quis responder a AFP sobre o assunto, prendeu alguns moradores, que foram rapidamente libertados.
O sobrevivente ainda não entende o que provocou as acusações de bruxaria. Ele voltou para a aldeia, onde cuida dos cinco sobrinhos.
"É difícil viver aqui depois do ocorrido", comenta o rapaz. "Mas é nosso único lugar, não temos para onde ir", lamenta Mwanguphiri.
LUPEMBE