"Não sobrou nada neste país", lamenta o homem ao deixar a padaria, enquanto uma multidão atrás dele se aglomera à espera de sua vez.
Muitos libaneses correram para as padarias antes do amanhecer de sexta-feira em busca de pão, já que o país enfrenta uma escassez de remédios e combustível.
Isso aconteceu depois que o banco central anunciou na quarta-feira que não seria mais capaz de subsidiar o combustível.
O país, mergulhado em turbulências políticas desde 2019, enfrenta sua pior crise econômica desde 1850, de acordo com o Banco Mundial.
Pelo menos 78% da população de mais de 6 milhões de habitantes vive abaixo da linha da pobreza e as empresas mal conseguem sobreviver.
A moeda libanesa, a libra, perdeu mais de 90% de seu valor em relação ao dólar em dois anos no mercado paralelo.
Muitas padarias fecharam porque não conseguirem cobrir o custo do combustível de que precisavam para alimentar os geradores privados, porque os apagões se estendem por até 20 horas por dia.
As que permanecem abertas têm produção racionada para que a farinha subsidiada que recebem do Estado renda mais, causando escassez em lojas e supermercados.
Hamati chegou cedo a uma padaria de Beirute, temendo encontrar uma longa fila.
"É a primeira vez que venho a esta padaria, não há pão nas lojas", comentou à AFP. "O que resta neste país? Falta-nos tudo", lamenta.
- Filas de madrugada -
O Líbano enfrenta uma crise de combustível desde o início do verão, e os importadores atribuem a escassez ao atraso do governo em autorizar linhas de crédito que financiem as compras.
As autoridades acusam os distribuidores de acumular estoques para vender mais caro no mercado paralelo ou na vizinha Síria.
"As padarias não têm como conseguir combustível (...) e não sabemos se conseguiremos" do Estado, comenta Ali Ibrahim, líder do sindicato dos padeiros.
"Eles nos dão o suficiente para dois dias, mas as padarias e moinhos deveriam receber o suficiente para um mês", acrescentou.
No distrito de Nabaa, em Beirute, Jacques al-Khoury parecia nervoso ao tentar organizar uma fila de dezenas de pessoas esperando na frente de sua padaria.
A fila começava às 3h, quando começa a assar para o dia.
"As padarias dessa área fecharam, agora a pressão está sobre mim", afirmou.
Khoury, de 60 anos, disse que recebe 36 toneladas de farinha subsidiada por mês, mas com a crescente demanda por pão, dura uma semana.
Na cidade de Trípoli, a mais pobre do Líbano, muitas padarias foram fechadas e os supermercados pararam de vender pão.
- Pão velho -
As poucas padarias de Trípoli que ainda estão abertas também estão lutando para atender à demanda.
"Estamos racionando a quantidade de pão que distribuímos nas lojas", diz um funcionário de uma das maiores padarias da cidade.
"Damos a eles metade da quantia normal".
Em uma padaria na cidade de Sidon, no sul, os moradores só podem comprar um saco de pão branco.
Segundo a ONU, os preços dos alimentos aumentaram até 400%.
O custo de uma cesta básica para uma família é cinco vezes o salário mínimo nacional, segundo o Observatório de Crise da Universidade Americana de Beirute.
"Depois de pagar o aluguel, não temos mais dinheiro", confirma Mohammad Abdul Qader, balconista de padaria e pai de cinco filhos.
Ele comenta que a comida é tão cara que não pode mais comprar carne.
"Eu olho o açougue de longe e continuo meu caminho", conta. "Ontem comi pão velho com cebola e tomate".
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BEIRUTE
Líbano sofre grave escassez, inclusive de pão
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