A tensão entre os militares e alguns grupos armados é cada vez mais intensa desde que o exército derrubou, em 1º de fevereiro, o governo civil liderado pela vencedora do Nobel da Paz Aung San Suu Kyi.
Na madrugada desta terça-feira, "nossas tropas tomaram a base" situada no estado de Karen (sudeste), declarou à AFP Padoh Saw Taw Nee, um dos líderes da União Nacional Karen (KNU). Ele não informou se a ação provocou vítimas.
O porta-voz da junta militar, Zaw Min Tun, confirmou o ataque e disse que "medidas serão adotadas" contra a brigada 5 da KNU, responsável pelo ataque.
"Ninguém se atreve a ficar por medo de possíveis represálias do exército birmanês", afirmou à AFP Hkara, que mora na localidade tailandesa de Mae Sam Laep, do outro lado da fronteira.
A KNU afirma abrigar no território que controla quase 2.000 opositores ai golpe de Estado que fugiram de outras cidades do país, após a violenta repressão das forças de segurança.
- Milhares de deslocados -
No fim de março, esta facção rebelde assumiu o controle de uma base militar e matou 10 soldados.
O exército respondeu com ataques aéreos contra redutos da KNU, pela primeira vez em 20 anos nesta região do país. Quase 24.000 civis abandonaram suas casas.
Desde a independência de Mianmar em 1948, muitas facções étnicas lutam contra o governo central para obter mais autonomia, acesso aos recursos naturais ou a uma parte do lucrativo tráfico de drogas.
A partir de 2015, o exército alcançou um acordo nacional de cessar-fogo com 10 grupos, incluindo a KNU. Mas com a repressão contra os manifestantes que não aceitam o golpe, algumas facções ameaçaram retomar as ações.
Mais de 750 civis morreram em operações das forças de segurança nos últimos dois meses, de acordo com a Associação de Ajuda aos Presos Políticos (AAPP).
Na segunda-feira à noite, um vendedor morreu ao ser atingido por um tiro no peito em Mandalay (centro).
A AAPP teme ainda o aumento dos abusos contra a comunidade LGBTIQ. A associação denunciou o caso de uma mulher transexual humilhada e agredida durante sua detenção.
- "Lei e ordem" -
A mobilização e campanha de desobediência civil continuam, apesar da repressão. Pequenos grupos de manifestantes saíram às ruas novamente nesta terça-feira.
Os ativistas também publicaram fotos nas redes sociais com os rostos pintados com mensagens contra a junta: "Libertem os detidos!", "Respeitem nossa votação".
O comandante do exército, general Min Aung Hlaing, justificou o golpe com a alegação de supostas fraudes nas eleições legislativas de novembro, vencidas pelo partido de Suu Kyi.
O general fez sua primeira viagem ao exterior desde o golpe. Ele compareceu no fim de semana a uma reunião de cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), que terminou com a divulgação de um documento de cinco pontos para tentar acabar com a violência e promover o diálogo.
As autoridades birmanesas indicaram nesta terça-feira que examinarão "cuidadosamente as sugestões construtivas" da Asean, mas que "sua prioridade no momento é manter a lei e a ordem".
Thomas Andrews, principal especialista independente com mandato da ONU, afirmou que o general Min Aung Hlaing, deve afirmar publicamente que vai cumprir o compromisso assumido na reunião da Asean.
"Escrevo para exigir seu compromisso público e que honre o direito fundamental do povo birmanês a expressar livremente seus pontos de vista, incluindo a oposição a suas ações, sem o medo de ser ferido, morto ou detido arbitrariamente", destacou Andrews em uma carta aberta.
"Exijo que liberte rapidamente e sem condições todos os presos políticos detidos desde 1 de fevereiro, como pedem os governantes da Asean", afirmou Andrews.
Ele também solicita que a junta militar aceite a visita de um enviado especial da Asean e que permita encontros com todas as partes, incluindo o presidente Win Myint e a ex-chefe de Governo de fato Aung San Suu Kyi.
A Asean afirmou que pretende nomear um emissário especial para "facilitar a mediação".
YANGON