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Estado de Minas Estados Unidos

Disputa pode ir das urnas para a Justiça

Atrás nas pesquisas, Trump planeja recorrer aos tribunais e Biden afirma que republicano não vai "roubar eleição"


03/11/2020 04:00 - atualizado 02/11/2020 22:52

O presidente Donald Trump afirma que vai vencer de qualquer maneira (foto: Rey Del Rio/Getty Images/AFP)
O presidente Donald Trump afirma que vai vencer de qualquer maneira (foto: Rey Del Rio/Getty Images/AFP)
Os norte-americanos que não anteciparam a escolha para a Presidência dos Estados Unidos votam hoje parar definir quem comandará a maior economia do planeta nos quatro anos seguintes. A apuração deve seguir nos próximos dias, criando suspense em todo o mundo, porque está em jogo a manutenção ou a mudança na política externa dos EUA, que interessa a todos os países, dos aliados, como o Brasil, a adversários, como a China. Na reta final da campanha, os candidatos concentram suas ações na Pensilvânia, estado que pode ser decisivo no pleito que pode parar na Justiça (leia abaixo).

Alguns estados já começaram a contar os votos, mas a lei impede a contagem na Pensilvânia até hoje, dia oficial da eleição, o que pode atrasar a apuração por dias. O presidente e candidato republicano Donald Trump afirma que o atraso na contagem pode dar margem a uma fraude, e anunciou que vai contestar o resultado na Pensilvânia antes de terminada a contagem dos votos.

“À noite, assim que terminar a eleição, iremos com nossos advogados” brigar pelo resultado na Pensilvânia, disse Trump no domingo a jornalistas, segundo o The New York Times. “O presidente não vai roubar esta eleição”, respondeu o democrata Joe Biden. De forma excepcional, a Suprema Corte americana permitiu à Pensilvânia contabilizar votos pelo correio que chegarem até três dias após a eleição, contra a vontade dos republicanos. Mas o tema poderia voltar à máxima corte depois do pleito.

Trump começou seu último dia de campanha, ontem, minimizando as pesquisas que apontam vantagem para o seu rival Joe Biden, que por sua vez pediu aos eleitores para darem um fim ao “caos” nos Estados Unidos. O republicano aparece em desvantagem nas pesquisas nacionais, que o apresentam com 44% dos votos, enquanto Biden aparece com 51%, mas no comício em Fayetteville, Trump minimizou os resultados. “Eu vejo estas pesquisas falsas”, disse para uma multidão em Fayetteville, na Carolina do Norte. “Nós vamos ganhar de qualquer maneira”, completou.

Trump se vangloriou de ser um presidente que não faz parte da classe política e, portanto, “coloca os Estados Unidos em primeiro lugar”.”Saiam e votem, é tudo o que lhes peço”, disse o magnata imobiliário, que depois repetiu para a plateia uma série de lapsos e erros que Biden teria cometido ao longo da campanha. A corrida eleitoral foi marcada pela pandemia da COVID-19, que deixou mais de 231 mil mortos no país, aumentou o desemprego, diminuiu a campanha de Biden e colocou em evidência as profundas diferenças da sociedade americana.
Joe Biden, à frente nas consultas de intenção de voto, pede fim do
Joe Biden, à frente nas consultas de intenção de voto, pede fim do "caos" (foto: Jim Watson/AFP )

Biden criticou fortemente a gestão da pandemia ontem, durante um comício em outro estado importante: Ohio. “Tivemos caos suficiente! Tivemos o bastante com os tuítes, a raiva, o ódio, o fracasso, a irresponsabilidade”, disse Biden, que prometeu manter a pandemia “sob control”, se eleito. Para chegar à Casa Branca é preciso obter pelo menos 270 votos no Colégio Eleitoral de 538 membros.

As eleições são hoje, mas a pandemia levou milhões de americanos a votarem antecipadamente, com um recorde de mais de 96 milhões de votos já registrados. Isso também abre espaço para um cenário de incerteza, pois, na noite da eleição, o percentual de votos a ser apurado nas urnas pode dar um resultado que pode ser revertido na contagem dos votos antecipados.

Pensilvânia 
Um dos estados pendulares é a Pensilvânia, que contribui com 20 votos para o Colégio Eleitoral. Quatro anos atrás, Trump venceu por pouco lá e neste ano as pesquisas mostram Biden com uma pequena vantagem, com 49,8% frente aos 45,5% de Trump. Mas em 2016 as pesquisas não anteciparam a vitória de Trump e, por isso, ontem os candidatos e seus colegas de chapa se voltaram para diferentes cantos da Pensilvânia para garantir até o último voto. Biden também compareceu ontem ao estado, que espera inclinar desta vez para o lado democrata e finalmente ser eleito para a Casa Branca.

O risco da judicialização

Bertha Maakaroun

Não fosse o cenário político e social de beligerância – e uma certa “milicialização” dos grupos da alt-right americana –  um eventual questionamento judicial dos resultados das eleições americanas poderia ser resolvido sem traumas nas instâncias legais e legislativas previstas para impasses. Inclusive, assim foi na última eleição presidencial decidida nos tribunais eleitorais americanos, em 2000, quando Bush e Al Gore se enfrentaram nas urnas. A crise, à época, se encerrou não quando a Suprema Corte ordenou o fim da contagem na Flórida; antes disso, ocorreu quando Al Gore concedeu a vitória a Bush, desistindo de abusar dos recursos previstos no jogo democrático, empurrando a disputa ao Congresso, que é o árbitro final das eleições presidenciais.

Mas agora é diferente. O contexto é outro. Todos os elementos para o explosivo coquetel estão dados – e os limites das instituições democráticas foram reiteradamente tensionados pela nova política de Donald Trump; a tal ponto de a judicialização estar sendo cuidadosamente planejada pelo republicano como forma de contornar eventuais cenários de derrota em  “batlleground states” que possam lhe tomar a reeleição. Para tanto,  inclusive contrariando a cultura política, Trump nomeou antes das eleições Amy Coney Barrett para a Suprema Corte, assim hegemonizando a presença republicana naquela instância crucial. Só que desta vez os democratas deixaram claro que vão para a guerra. Não repetirão Al Gore.

Variáveis múltiplas se misturam no coquetel da crise. As eleições presidenciais de 2020 encontram um eleitorado polarizado na América; os dois lados da disputa fazem alta aposta existencial em torno dos resultados; há ampla disseminação do discurso de ódio e de desinformação nas mídias sociais e em outras plataformas criadas para este fim; as tensões étnicas e raciais pré-existentes se aprofundam e se intensificam com o discurso supremacista branco não condenado e em certa medida incentivado por Trump; milícias armadas dispostas a atirar. Soma-se a tudo isso uma liderança política que alimenta as divisões em vez de neutralizá-las.

Votação 
Motes para a judicialização nesse anacrônico sistema eleitoral norte-americano não faltam. Nada que se compare, contudo, à disputa em torno da votação pelo correio. Segundo o US Election Project, da Universidade da Flórida, mais de 91 milhões de cidadãos requisitaram cédulas neste ano, o que corresponde a 66,7% do total de votos de 2016. Trump já vinha preparando os seus partidários para desqualificar o voto por correio e assim justificar a sua recusa em aceitar uma derrota.

A retórica de campanha que normalmente fica restrita aos palanques eleitorais desta vez salta das mega-plataformas de mídias digitais para as ruas, onde eleitores de Trump e de Biden estão se engalfinhando em confrontos físicos localizados por diversas capitais e grandes cidades dos EUA. Caso a judicialização se materialize, a violência pode se expandir até a solução institucional do confronto.

Incerteza 
O certo é que não há precedentes para tal cenário na história recente dos EUA. Os democratas já obtiveram a maioria de votos, – como ocorreu com Hillary Clinton – mas perderam no colégio eleitoral pelas particularidades do sistema americano. Contudo, nunca um resultado foi tão questionado previamente antes da primeira urna ser aberta. Com o imbróglio que se anuncia, para o Brasil só há uma certeza:  as bolsas vão cair e o dólar, subir, porque nesse provável cenário de incerteza –  com as suas múltiplas variáveis no contexto mundial –  as primeiras vítimas são o mercado financeiro e a economia.

O modo conservador de governar de Trump, em que o presidente brasileiro Jair Bolsonaro tão bem se espelhou, confirma aquilo que qualquer bom analista de economia sabe: se vieram para salvar o mercado, são os maiores responsáveis por sua ruína. A palavra “mercado” nunca rimou com incerteza. Nem aqui, nem em lugar algum, nem na terra da primeira república moderna do mundo. O hino dos Estados Unidos, aliás extraído de um texto de Francis Scott Key e denominado The Star-Spangled Banner, fala da terra dos “livres e lar dos bravos”. Remete a um episódio que resultou na contenção do avanço britânico na Guerra de Anglo-Americana na Batalha de Whetstone Fort. Pois essa “casa dos bravos” adentra em um de seus períodos mais obscuros e terá de ter mais do que coragem para sair dele. Sugere-se a sapiência...


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