Depois dos distúrbios que há dez anos resultaram 200 mortos, Shawudun Abdughupur e sua mulher se deram conta de que não tinham futuro na região chinesa de Xinjiang e se mudaram para a Nova Zelândia.
O cinegrafista uigure, então com 33 anos, escolheu fugir de sua pátria em busca de uma vida melhor a 12.500 quilômetros dali.
Depois do derramamento de sangue, "tinha a sensação de que as coisas eram diferentes", conta ele em Auckland. "Eu me sentia impotente", desabafou.
Na China, as relações entre a maioria han e as minorias étnicas muçulmanas com uma língua da mesma família que o turco, como os uigures, sempre foram tensas.
A maior parte da atual Xinjiang passou a fazer parte da China no final do século XIX. Após a guerra civil chinesa e diferentes lutas armadas, o Exército comunista assumiu o controle de todo território no início dos anos 1950.
O que o cinegrafista não imaginava, ao ir embora, é que os distúrbios de julho de 2009 em Urumqi, capital de Xinjiang, e os ataques sangrentos cometidos por ativistas uigures deflagrariam uma gigantesca campanha de repressão.
As autoridades impuseram medidas de vigilância drásticas: câmeras, dados biométricos, bloqueios policiais e detectores de metais.
As associações de defesa dos direitos humanos acusam a China de ter internado até um milhão de pessoas, sobretudo uigures, em "campos de reeducação". Pequim nega esse número e se refere a "centros de formação profissional", destinados a lutar contra a radicalização islamista.
- Perguntas estranhas -
Hoje, Shawudun Abdughupur trabalha como encanador. Tentou desesperadamente manter os vínculos, mas evitando ser prisioneiro deles. As autoridades chinesas o perseguem, assim como outros muitos uigures no exílio. O Estado policial chinês tenta intimidá-lo, apesar de seu passaporte neozelandês.
Ele garante que a polícia chinesa lhe ordenou, desde o início, que parasse de usar o Skype para falar com sua família e que entrasse em contato com eles por um número de telefone de Xinjiang, que pode ser facilmente grampeado.
Quando perguntava a sua mãe sobre seu irmão mais novo, ele a ouvia chorar, ou obtinha um silêncio em resposta.
"Perguntei muitas vezes a minha mãe. 'Onde ele está?' E ela chorava, mas não dizia nada", acrescentou.
De repente, sua mãe começou a lhe fazer perguntas estranhas sobre a comunidade uigure da Nova Zelândia.
- "Campo de concentração" -
"Alguém pediu a ela para fazer estas perguntas", concluiu Abdughupur.
Depois, essas perguntas chegaram de forma direta, por mensagens de texto, ou por telefonemas.
Sua família está segura, dizia-lhe um interlocutor, tentando obter detalhes sobre uma festa uigure recente.
Quando Shawudun Abdughupur desligou o telefone, começaram as ameaças, sempre de números de telefone neozelandeses - celulares, ou fixos: "Podemos achar você. Estamos na Nova Zelândia".
Depois, veio a punição. A última vez que teve notícias de sua mãe foi em 2016, quando a ligação foi interrompida: "Não volte a ligar". Bloquearam seu número de telefone, e ela desapareceu.
Em sua busca desesperada por notícias de sua família, ele decidiu pagar um chinês han para que viajasse até sua cidade natal e descobrisse o que havia acontecido com sua mãe e com sua sobrinha deficiente. "Eu a amo. É deficiente, mas forte. Lembro de sua cara de felicidade", diz, emocionado, ao lembrar da sobrinha.
Assim, descobriu que sua mãe e seus dois irmãos estão reclusos em acampamentos e que seu irmão mais velho está preso.
Shawudun Abdughupur está muito preocupado com a mãe. "Tem 78 anos e está em um campo de concentração", lamenta ele. "Era uma empregada doméstica, nada mais".
"Quero saber se está viva, ou morta", completou.