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Estado de Minas

Novo ministro das relações exteriores deve comandar guinada radical na diplomacia do Brasil

Ernesto Araújo defende um patriotismo exacerbado e o repúdio virulento do multilateralismo e do "marxismo cultural"


postado em 20/11/2018 08:14

(foto: Valter Campanato/Agencia Brasil)
(foto: Valter Campanato/Agencia Brasil)

A diplomacia brasileira deve dar uma guinada radical sob o comando de Ernesto Araújo, um diplomata de carreira modesta, que ganhou a confiança de Jair Bolsonaro por compartilhar de uma ideologia que prioriza o alinhamento com Washington e a oposição severa ao multilateralismo.

O futuro ministro das Relações Exteriores chegou ao posto de embaixador em junho, embora em seus 29 anos de carreira nunca tenha chefiado uma embaixada. A partir de 1º de janeiro, no entanto, será o encarregado de "regenerar" o Itamaraty, sede da diplomacia brasileira, onde até agora era o chefe do Departamento de Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos.

"As ideias que defende marcam uma importante ruptura" para a diplomacia, afirmou Fernanda Magnotta, coordenadora do curso de Relações Internacionais da Fundação Armado Alvares Penteado (FAAP), em São Paulo.

"Desistimos de ser um grande país"

Ernesto Araújo, futuro ministro das Relações Exteriores

Após a indicação, na semana passada, deste diplomata quase desconhecido de 51 anos, os analistas se lançaram ao seu blog Metapolitica17, apresentado com um subtítulo que não deixa dúvidas: "contra o globalismo".

Ali, encontraram sérios motivos de preocupação.

Descrito como um "intelectual brilhante" por Jair Bolsonaro, e apoiado pelo filho deste, o deputado Eduardo Bolsonaro, para ocupar o posto, Araújo compartilha ali opiniões radicais que vão do patriotismo exacerbado ao repúdio virulento do multilateralismo e do "marxismo cultural", que "influenciou o dogma científico do aquecimento global".

No Brasil, "desistimos de ser um grande país" por "obediência à ordem global", lamentou o futuro chefe da diplomacia em seu blog, ao qual já não se podia acessar livremente na segunda-feira. Para ele, o "objetivo último [do globalismo] é romper a conexão entre Deus e o homem", escreveu.

Como Jair Bolsonaro, Araújo é um admirador fervoroso do presidente americano, Donald Trump, que, segundo ele, pode "salvar o Ocidente". Este nacionalista apaixonado adaptou o "América primeiro" de Trump ao "Brasil primeiro" e, com ele à frente do Itamaraty, Brasília poderia facilitar a Washington um maior isolamento de Cuba e Venezuela.

Araújo considera, também, que é preciso "resistir à China maoísta (sic) que dominará o mundo". Jair Bolsonaro já incomodou Pequim, acusando os chineses de "comprar o Brasil" e com sua visita a Taiwan no começo do ano.

 'Devastador'


"Vamos ver um alinhamento muito forte [do Brasil] com a administração americana", avaliou Mônica Herz, professora associada do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio.

"As relações com a América Latina podem sofrer e a preocupação mais evidente é a China, embora também a Europa" preocupe. Araújo qualificou o Velho Continente de "espaço culturalmente vazio".

"De fato, as relações [do Brasil] com várias partes do mundo vão sofrer", acrescentou Herz.

"Ignorar a importância da China ou do mundo árabe poderia ser devastador não só em termos diplomáticos, mas também para a economia brasileira", avaliou Fernanda Magnotta.

"Em 2017, a China foi o primeiro mercado de exportação do Brasil, com ingressos de 47 bilhões de dólares, da soja ao ferro", destacou a analista. Além disso, o país é o primeiro exportador mundial de carne Halal, que seguem regras de produção permitidas pelos muçulmanos.

Assim, tanto a transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, como uma possível saída do Acordo de Paris sobre o Clima - duas medidas muito polêmicas sugeridas por Bolsonaro - encontrariam "uma forte resistência, especialmente de sua equipe econômica e do agronegócio, do qual Bolsonaro precisa para governar", acrescentou.

Araújo se expõe também a uma "forte oposição" dentro do próprio Itamaraty, cuja "tradição repousa nos princípios do multilaterialismo", considerou Magnotta.

'Projeto totalitário'


(foto: Valter Campanato/Agencia Brasil)
(foto: Valter Campanato/Agencia Brasil)
O ódio do futuro chanceler ao Partido dos Trabalhadores (PT) do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), que governou o País durante 13 anos, só se iguala ao do próprio Bolsonaro. Com os olhos voltados agora para o norte, espera-se que a nova diplomacia dê as costas a antigos amigos e deixe para trás a cooperação sul-sul.

Em seu blog, Araújo renomeou o PT de "Projeto Totalitário", que criminalizou "tudo o que é bom e puro: a família, a propriedade privada, o sexo (...) heterossexual, a fé em Deus, o patriotismo".

Até mesmo "carne vermelha, o ar-condicionado, o petróleo, ou qualquer energia eficiente e barata", em nome das mudanças climáticas.

Ernesto Araújo foi escolhido, porque "expressa muito claramente a visão" de mundo de Bolsonaro, avaliou Mônica Herz. "Estavam procurando alguém que falasse às suas bases, com seus valores ultraconservadores, e uma forte interação entre religião e política", completou.

 

(Por Pascale TROUILLAUD)


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