Um tribunal turco decidiu nesta quinta-feira (7) manter na prisão o líder pró-curdo Selahattin Demirtas, ferrenho opositor do presidente Recep Tayyip Erdogan, no primeiro dia de seu processo por atividades "terroristas", o que preocupa os defensores dos direitos humanos.
A audiência começou no complexo penitenciário de Sincan, na província de Ancara, sem a presença de Demirtas.
Além dos advogados, cerca de 100 pessoas assistiam a audiência na qual representantes de missões estrangeiras não foram autorizados a comparecer, segundo uma fonte diplomática.
Demirtas, de 44 anos, que codirige o Partido Democrático dos Povos (HDP), pode pegar até 142 anos de prisão neste julgamento qualificado de "político" por seus simpatizantes.
Foi detido com outros 10 deputados do HDP em 4 de novembro de 2016, quando ocorreram os expurgos iniciados depois do frustrado golpe de julho de 2016 e que depois se ampliaram aos meios pró-curdos.
O governo turco o acusa de ter laços com o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), uma organização considerada "terrorista" por Ancara e por seus aliados ocidentais.
Os advogados de Demirtas questionaram ante o tribunal as acusações contra seu cliente, ao afirmar que se dedicou a atividades políticas legais, segundo uma correspondente da AFP na sala de audiência.
Pediram que abandonasse o processo e libertasse Demirtas, mas o tribunal rejeitou esta ação e ordenou sua permanência na prisão.
A próxima audiência foi fixada para 14 de fevereiro.
"Foi preso sob o pretexto de que evitava a Justiça, mas há 13 meses é ela que me evade", reagiu Demirtas após a audiência, em uma mensagem enviada a sua conta do Twitter por pessoas próximas.
Na fachada "do Palácio de Justiça a palavra 'justiça' foi completamente apagada. Só resta o Palácio", acrescentou.
Centenas e pessoas se reuniram nesta quinta-feira em frente ao tribunal para manifestar seu apoio a Demirtas", constatou a AFP.
- O 'Obama curdo' -
"O único delito de Demirtas é ter sido opositor a Erdogan", disse uma manifestante, enquanto outras pessoas exibiam cartazes com mensagens como "as pressões não nos intimidam" ou "o HDP é a esperança e a esperança sempre está de pé".
O HDP é o segundo partido de oposição no Parlamento.
"É difícil não considerar o julgamento uma iniciativa politicamente motivada pelo governo turco para sabotar a oposição parlamentaria", afirmou Hugh Williamson, da ONG Human Rights Watch.
Demirtas, envolvido em mais de 100 processos judiciais, está em prisão preventiva há mais de 400 dias e ainda não compareceu a nenhum tribunal. A corte ordenou que comparecesse por videoconferência da prisão em Edirne (sudoeste), mas ele negou se dobrar à ordem.
O HDP denunciou a existência de uma carta que o Ministério da Justiça teria enviado a todos os tribunais que acusam Demirtas para pedir que impeçam a sua presença física nas audiências.
Com Demirtas na prisão, o HDP perde seu principal líder para as eleições municipais, legislativas e presidenciais de 2019.
Este advogado, chamado por alguns de "Obama curdo", conseguiu transformar o partido em um movimento de esquerda moderno e progressista, que atrai mais do que o eleitorado curdo.
O HDP surpreendeu nas legislativas de junho de 2015, quando conquistou 80 cadeiras no Parlamento e deixou o governista Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) sem maioria absoluta.
Mas nas eleições de novembro deste ano, o HDP perdeu 21 deputados.
De sua cela, Demirtas publicou um livro de contos, "Seher" ("Aurora"), cuja primeira tiragem de 20 mil exemplares se esgotou em três dias, indicou à AFP a editora Dipnot. Desde então já vendeu 155 mil exemplares.