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Estado de Minas

Ex-capitão do Exército da Coreia do Norte fala ao EM sobre o regime imposto no país

Regime dos Kim faz lavagem cerebral em crianças, impõe o medo, prioriza gastos militares e condena população à fome


postado em 14/02/2016 06:00 / atualizado em 14/02/2016 08:43

O líder norte-coreano (C) e sua tropa, em visita ao Kumsusan Palace of the Sun, em Pyongyang(foto: KCNA/AFP - 27/7/15)
O líder norte-coreano (C) e sua tropa, em visita ao Kumsusan Palace of the Sun, em Pyongyang (foto: KCNA/AFP - 27/7/15)
Brasília – Aos 3 anos, Kim Jong-Un atirou com a arma do avô, Kim Il-sung. Aos 6, aprendeu a andar a cavalo. Dois anos depois, dirigiu um carro a 200km/h. Com apenas 9 anos, ao praticar tiro, acertou o centro do alvo por 10 vezes em três segundos. Além de difundirem as absurdas supostas façanhas do ditador, os livros escolares da Coreia do Norte são estritamente adaptados às necessidades do regime comunista. A ideologia se faz presente até mesmo no ensino da matemática para crianças entre 7 e 8 anos, com enunciados direcionados a implantar o ódio ao imperialismo e uma obediência canina a Pyongyang. “Bastardos americanos têm cinco tanques. O Exército Popular esmaga três deles. Quantos tanques sobraram?” Para se perpetuar no poder, a terceira geração da família Kim impõe a 24,9 milhões de norte-coreanos um controle baseado no horror e na subserviência.

Não são tolerados desvios. No país mais hermético do planeta, qualquer sinal de contestação é punido com trabalho forçado, prisão e execução. Especialista em nacional-socialismo e na doutrinação implementada pelo Terceiro Reich de Adolf Hitler, o historiador e sociólogo Michael H. Kater – docente da York University, em Toronto, Canadá – explica ao Estado de Minas que os professores da Coreia do Norte são treinados para acreditar na omnisciência de Kim Jong-Un. “As crianças se veem compelidas a regurgitar o que lhes é dito. Quaisquer objeções são punidas pelo próprio mestre ou pela organização juvenil nacional. Fotografias do ditador estão penduradas em cada sala de aula. O Estado organiza eventos em que professores e jovens têm a obrigação entoar cantos, em honra ao líder.”

Kater explica que o regime usa dois instrumentos para se certificar de que os cidadãos fazem a linha do Partido Comunista: os campos de concentração, espalhados por todo o país e a ameaça de execução. “Os presos, incluindo crianças, podem ser mortos pelos guardas sem motivo aparente. Espiões vigiam toda a população”.

Capitão desertor do Exército da Coreia do Norte, Kim Joo-Il (Veja entrevista) conta ao EM que o regime começou a construir e a integrar os campos de prisão política em 1947, que mantêm 154 mil detidos. “Hoje, há seis dessas instalações, uma versão moderna dos campos de concentração nazistas, além de centenas de campos correcionais de trabalho e centros de detenção”, diz.

A vigilância sobre a sociedade é fortalecida por meio de agências de informação e de controle. “O regime adota um desumano sistema de crime por associação. As punições se estendem não apenas ao transgressor, mas ao primo de terceira geração. Em resumo, a Coreia do Norte perpetua um sistema político assassino que cria um medo psicológico desumano”, conclui Joo-Il. Os norte-coreanos seguem a máxima “Se eu aguentar, minha família pode viver” – uma forte influência do confucionismo.

Kater afirma que, ao contrário da ditadura militar no Brasil, Pyongyang “é um regime totalitário com ideologia comunista pós-stalinista”. “A face pública desta ideologia é a dinastia ditatorial da família Kim. Mas ela não passa de uma tirania pessoal apoiada pelos serviços policiais e pelo Exército”, lembra, ao frisar que o próprio Kim Jong-Un sofre de um medo letal dos militares e ordena execuções em altas patentes, a fim de afastar o risco de golpe.

ARMAS E MISÉRIA
O governo aplica 25% do Produto Interno Bruto (PIB), estimado em US$ 40 bilhões, nas Forças Armadas e no programa nuclear, e condena sua população à miséria e à fome. Como o sistema de racionamento da economia e a produção tiveram perdas de até 80% na década de 1990, o regime enviou 46 mil pessoas para 40 nações, a fim de captarem moedas estrangeiras.


Consideradas 'escravas no exterior', elas enviam até US$ 1,3 bilhão por ano a Pyongyang”, observa Kim Joo-Il. Ele relata que cada trabalhador do país tem direito a um salário mensal de US$ 120 (R$ 480, aproximadamente), mas recebe somente 10%. O restante costuma ser repassado ao chamado Escritório 39, uma espécie de verbas de suborno para o ditador.

ENTREVISTA

Kim Joo-Il, ex-capitão do Exército, desertor, asilado no Reino Unido

Um grito de liberdade

Com a patente de capitão, ele gozava de respeito e de admiração no Exército da Coreia do Norte. Em 1997, viu a irmã de 4 anos definhar, com fome, até a morte – em três anos, 3 milhões de pessoas sucumbiram à falta de alimentos. Até que, em 26 de agosto de 2005, desertou, abandonou o país e escapou rumo à China, ao atravessar a nado o Rio Dooman. Em 2007, com a ajuda de uma ONG, foi para o Reino Unido. Aos 43 anos, casado e pai de duas garotas, Kim Joo-Il vive como asilado nos arredores de Londres, onde dirige a Associação Internacional para Direitos Humanos e Democracia para os Norte-Coreanos (INKAHRD). Em entrevista exclusiva ao EM, Kim Joo-Il acusa o regime de Kim Jong-Un de violar direitos humanos básicos da população.


Como a Coreia do Norte costuma doutrinar as crianças para se tornarem obedientes ao regime?
Os norte-coreanos recebem uma lavagem cerebral do momento em que nascem até sua morte. A primeira expressão que as crianças do jardim de infância aprendem, aos 5 ou 6 anos, é “Obrigado, líder querido”. Desde então, até a entrada na universidade, a educação escolar se foca na idolatria e na divinização do ditador, temas presentes em 30% do currículo. A meta final é nutrir indivíduos que sejam capazes de se engajar em atentados suicidas, se for desejo do ditador.

O senhor poderia citar exemplos de desrespeito aos direitos humanos?
A liberdade de religião é gravemente violada na Coreia do Norte. O regime torturou, massacrou e prendeu religiosos em campos de trabalho forçado, sob as ordens de Kim Il-Sung, em 1962. Mulheres e crianças são vulneráveis às violações dos direitos humanos, experimentam aborto forçado, tráfico humano e outros tratamentos desumanos. O regime considera deficientes físicos como uma desgraça, algo que mancha a reputação do país. E eles são usados como cobaias em testes médicos. As violações dos direitos humanos atingem todos os aspectos da sociedade. Por não podermos ignorar tal realidade, criei no Reino Unido uma organização não governamental e editamos um jornal. São esforços para permitir que o mundo saiba sobre a situação de direitos humanos na Coreia do Norte.


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