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Estado de Minas

Pinochet e Allende, uma história de traição e sacrifício


postado em 11/09/2013 12:49

"Chamem Augusto, que é dos nossos!", gritou Salvador Allende quando o golpe de Estado já estava em andamento no dia 11 de setembro de 1973, convencido da lealdade do chefe do Exército, Augusto Pinochet.

Mas Pinochet se colocou rapidamente à frente das forças golpistas.

Vítima e agressor, as vidas de Allende e Pinochet tinham poucos pontos em comum antes daquele dia fatídico.

Com 58 anos, Pinochet havia assumido a chefia do Exército apenas três semanas antes, recomendado por seu antecessor, o general Carlos Prats, que seria assassinado junto com sua esposa poucos meses depois do golpe em Buenos Aires, pelos capangas do ditador. Allende, um médico socialista de 65 anos, o nomeou para o cargo acreditando em sua lealdade.

Ninguém suspeitava que seria Pinochet, considerado um general medíocre, quem derrotaria Allende, eleito presidente em sua quarta tentativa, no dia 4 de novembro de 1970, liderando a Unidade Popular, integrada por socialistas, comunistas, radicais e outras correntes de esquerda.

"Meu pai acreditou até o fim nele, porque havia sido recomendado pelo general Prats. Para ele deve ter sido terrível perceber sua traição", narra à AFP sua filha, a senadora Isabel Allende.

Pinochet passou a liderar as ações golpistas, embora "não tenha tido papel algum na gestação do golpe e tenha embarcado nele apenas 48 horas antes", afirma à AFP a jornalista Mónica González, autora do livro "La Conjura", que narra o complô para derrubar Allende.

Anos mais tarde, Pinochet afirmou, no entanto, a uma de suas biógrafas, a jornalista María Eugenia Oyarzún, que preparava o golpe em segredo há um ano: "Não havia espaço para erro (...) tínhamos que livrar a pátria do caos de Allende e do câncer marxista", argumentou.

--- O médico socialista e o astuto militar ---

Allende chegou ao governo com 36,3% dos votos, em sua quarta campanha presidencial, após uma vida dedicada à política.

Nascido no dia 26 de junho de 1908 na cidade de Valparaíso, 120 km a oeste de Santiago, Allende tornou-se um médico e foi eleito deputado aos 30 anos. Depois, foi ministro da Saúde e mais tarde chegou ao Senado, onde permaneceu por 25 anos.

Já Pinochet foi rejeitado duas vezes na academia militar e não gostava de estudar.

"Ele mesmo explicava que era alguém que tinha dificuldade para o estudo. Foi duas vezes rejeitado na Escola Militar, sofria com enxaquecas severas quando estudava em excesso e tinha notas regulares que estavam na média", conta à AFP o jornalista Juan Cristóbal Peña, autor do livro "La secreta vida literaria de Augusto Pinochet".

Allende proclamou uma via chilena ao socialismo apegada à democracia, nacionalizou o cobre e as telecomunicações, que estavam em mãos americanas, e impulsionou a reforma agrária, mas seu governo foi desestabilizado por uma campanha da direita apoiada por Washington.

Já Pinochet soube aproveitar esta oportunidade histórica e se instalou na linha de frente com uma astúcia e vontade de poder até então desconhecidas.

"Desde o primeiro minuto se sente um recém-chegado. Por seu caráter ressentido e sua grande astúcia, analisa desde o primeiro momento que não tem cumplicidade com ninguém e pode se impor", afirma Mónica González.

"O que faz então um convertido? É mais violento que os violentos", acrescenta a autora.

Nascido no dia 25 de novembro de 1915 também em Valparaíso, Pinochet demonstrou no mesmo dia do golpe a crueldade que seria o selo de sua ditadura, que terminou com mais de 3.200 vítimas.

"Permanece a oferta de tirá-lo do país... E o avião cai, velho, quando estiver voando", disse por rádio a outro militar que negociava a rendição de Allende.

Mas o presidente socialista iria concretizar sua promessa de se sacrificar em defesa da democracia, disparando no queixo com o fuzil dado de presente a ele por Fidel Castro.

"Tivemos uma reunião e ele nos disse: eu não sou homem de exílio, se houver um golpe militar eu vou direto para o cemitério", lembra à AFP Sergio Bitar, seu ministro da Mineração, que o acompanhava.

"Tinha a decisão absoluta de ficar, resistir e demonstrar que um presidente da República exerce seu mandato até o fim", afirmou sua filha Isabel.

--- Líder de uma ditadura sangrenta ---

Vitorioso, Pinochet impôs sua ferrenha ditadura e se vangloriava de controlar até o movimento das folhas no Chile.

"Pinochet sabia que era menosprezado por seus pares. Quando toma o poder se empenha em eliminar os que podiam ofuscá-lo", explica Cristóbal Peña.

Junto a um grupo de discípulos de Milton Friedman, impôs um modelo liberal ao extremo que levou ao lançamento da economia após a privatização de empresas e serviços do Estado.

No entanto, Pinochet perdeu um plebiscito em 1988, por meio do qual buscava estender sua ditadura até 1997. Em 1990, entrega o poder ao democrata cristão Patricio Aylwin, mas se mantém à frente do Exército por oito anos.

Depois de deixar o Exército, exerceu o cargo de senador vitalício. Coberto por esta imunidade viajou a Londres, onde foi detido em 16 de outubro de 1998 por ordem da justiça espanhola por crimes contra a humanidade. Permaneceu sob prisão domiciliar por 503 dias, até ser libertado por razões de saúde.

Ao retornar ao Chile perdeu influência e os tribunais começaram a cercá-lo.

Morreu em 10 de dezembro de 2006 de um infarto, sem ser condenado pelos crimes que nunca reconheceu: "Não me lembro, mas não é certo. Não é certo, e se for certo não me lembro", disse a um juiz um ano antes de morrer.


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