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Estado de Minas Tragédia socioambiental

Nova chance no Reino Unido para atingidos de Mariana

Advogados conseguem cartada na esperança de reabrir ação na Justiça britânica contra controladora da Samarco, em busca de reparação por ruptura de barragem


18/06/2021 04:00

Ruínas de Bento Rodrigues, primeiro povoado destruído pela lama da Barragem do Fundão: após quase seis anos, muitas vítimas ainda aguardam reparação(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 22/10/20)
Ruínas de Bento Rodrigues, primeiro povoado destruído pela lama da Barragem do Fundão: após quase seis anos, muitas vítimas ainda aguardam reparação (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 22/10/20)

 

Está nas mãos de três magistrados ingleses a decisão de permitir apelação no Reino Unido dos advogados dos atingidos pelo desastre do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, em processo que requer 5 bilhões de libras (cerca de R$ 35 bilhões) em indenização. A audiência será na manhã de terça-feira, em Londres, na corte de apelação da Royal Court of Justice (RCJ). Após quase seis anos sem reparação no Brasil, vítimas buscam contestar a decisão de primeira instância que tirou do Reino Unido a competência para julgar as responsabilidades da tragédia (veja no quadro o histórico do processo).

 

Os advogados do escritório PGMBM representam no Reino Unido cerca de 200 mil atingidos contra a empresa anglo-australiana BHP Billiton. Ao lado da Vale, a BHP controla a Samarco, a mineradora responsável pelo rompimento que matou 19 pessoas e devastou a Bacia Hidrográfica do Rio Doce, entre Minas Gerais e Espírito Santo, em 2015.

 

Desde 2018, o escritório que reúne advogados brasileiros e do Reino Unido tenta processar a multinacional, que tem em Londres uma de suas sedes. “Só o fato de se ter conseguido a marcação dessa audiência já é algo muito positivo. Havia a possibilidade de a corte marcar ou não a audiência e a decisão é vista como positiva por nós”, afirma uma fonte ligada ao direito internacional, que prefere não se identificar.

 

Serão três juízes a julgar a possibilidade de apelação conseguida em 4 de maio de 2021. Seria primeiramente um juiz, mas a corte alocou três para  participar da audiência e decidir sobre a admissão do pedido de recurso, incluindo o vice-presidente da corte e outro juiz de instância superior.

 

Há possibilidade de que a decisão de admitir ou não a apelação seja tomada na própria audiência, que terá, a princípio, duas horas de duração, com a possibilidade de prorrogação. Os autores do pedido falarão primeiro, em seguida os advogados da BHP e se seguirão réplicas e tréplicas. “A tendência é de que a decisão saia na própria audiência, mas pode ser posteriormente”, avalia a fonte jurídica.

 

OUTRO LADO Consultada pelo Estado de Minas, a BHP Billiton afirmou que está ciente da tentativa de reabertura do caso no Reino Unido e da audiência designada para 22 de junho. Para a empresa, os julgamentos proferidos pela High Court e pela Corte de Apelação inglesas extinguiram o processo e confirmaram o entendimento da BHP de que a ação era desnecessária, por duplicar questões cobertas pelo trabalho em andamento da Fundação Renova e que são, ou foram, objeto de processos judiciais no Brasil.

 

“A BHP reitera que sempre esteve e continua totalmente comprometida a fazer o que é certo pelas vítimas do rompimento da Barragem do Fundão e continuará a apoiar os extensos e contínuos esforços de reparação da Fundação Renova no Brasil. Até 31 de março de 2021, foram investidos R$ 12,81 bilhões em ações de reparação e compensação, sendo R$ 3,95 bilhões pagos em indenizações e auxílio financeiro às pessoas atingidas”, afirmou, em nota.

 

A empresa também apoia o Sistema Indenizatório Simplificado, que é criticado por advogados e pelos promotores do caso e que já foi responsável pelo pagamento pela Renova de R$ 1,07 bilhão até abril deste ano a aproximadamente 12 mil pessoas.

 

MECANISMO

RARO ACEITO  

 

Uma última e rara cartada jurídica na Inglaterra foi o dispositivo legal 52:30, uma contingência do Código Civil para que grandes injustiças não sejam cometidas. Fontes jurídicas ouvidas pelo EM indicaram que a manobra em si pode ser considerada uma grande vitória, por ser extremamente rara a reavaliação de uma decisão da corte. Se aceito, o caso pode ser o que reunirá o maior número de clientes no Reino Unido.

 

Os argumentos usados para isso foram técnicos, mas também pesou o desenrolar lento e cercado de suspeitas do caso no Brasil. O primeiro motivo foi que o juiz de apelação tomou sua decisão com base em documentos diversos dos apresentados pelos advogados dos atingidos. Em segundo lugar, há precedentes jurídicos da Suprema Corte do Reino Unido que foram ignorados, segundo a sustentação do escritório PGMBM.

 

Pesaram, ainda, três fatos considerados graves no Brasil. Um deles é o pedido do Ministério Público de Minas Gerais para que a Fundação Renova, criada para a reparação das vítimas no Brasil, seja extinta, uma vez que suas contas não são aprovadas e há inúmeras denúncias de irregularidades e desvios, segundo os promotores.

 

Somado a isso, há requerimento do Ministério Público Federal para que a 12ª Vara Federal de Belo Horizonte seja considerada suspeita, por homologar acordos vistos pelos procuradores de Justiça como prejudiciais aos atingidos e benéficos às mineradoras, bem como o pedido de recuperação judicial da Samarco, que pode ter reflexos nas indenizações e reparações aos atingidos.

 

 

Batalha no exterior 

 

Da tragédia à tramitação do processo dos atingidos pelo desastre de Mariana no Reino Unido

 

» 5 de novembro de 2015

A Barragem do Fundão, operada pela mineradora Samarco em Mariana, se rompe, liberando 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro. Um contingente estimado em 700 mil pessoas é afetado na Bacia do Rio Doce. Dezenove morreram, sendo que uma das vítimas não teve o corpo recuperado

 

» 21 de setembro de 2018

Sob risco de as ações de indenização prescreverem após três anos do desastre, o escritório inglês SPG Law, atualmente PGMBM, anunciou que ingressaria com ação em cortes do Reino Unido contra a BHP Billiton SPL, controladora da Samarco ao lado da Vale. Na época o valor do processo era estimado em 5 bilhões de libras

 

» 3 de outubro de 2018

Acordo firmado entre o Ministério Público, a Samarco e suas controladoras (além da BHP, a Vale) previu a interrupção do prazo legal de prescrição

 

» 2 de novembro de 2018

O escritório PGMBM protocola na Justiça do Reino Unido pedidos de indenização contra a BHP Billiton SPL, representando mais de 200 mil atingidos pelo rompimento da barragem. Inicialmente, o processo tramitaria na corte de Liverpool

 

» 16 de novembro de 2018

A Fundação Renova pressiona prefeituras e atingidos a desistirem da ação internacional como condição para receber compensações acordadas. Advogados do escritório internacional reagem

 

» 18 de dezembro de 2018

A Justiça determina que a Fundação Renova pague o valor indenizatório por gastos extras com os prejuízos do rompimento ao município de Governador Valadares e em seguida uma série de outras decisões mantêm municípios na ação internacional

 

» 2 de abril de 2019

A BHP requer a transferência da ação de Liverpool para Londres. Depois de 15 dias, o juiz decide manter o processo em Liverpool, por ter sido escolhido como foro pelos advogados dos atingidos, que lá mantêm escritório

 

» 13 de março de 2020

A PGMBM apresenta à BHP um amplo conjunto de documentos sustentando que é legítima a intenção dos clientes de moverem uma ação perante a Justiça do Reino Unido. Há pareceres de juristas, depoimentos de vítimas e advogados brasileiros que atuaram no Brasil em favor dos atingidos e populações afetadas pelo rompimento da barragem de Fundão

 

» 22 a 31 de julho de 2020

Advogados dos atingidos e da BHP Billiton levam o caso internacional ao Centro de Justiça Cível, em Manchester, onde o juiz sir Mark Turner julga se as indenizações poderão ser processadas pelas cortes do Reino Unido

 

» 9 de novembro de 2020

O magistrado considera abusivo o pedido de indenização dos atingidos contra a empresa anglo-australiana BHP Billiton. Advogados das vítimas recorrem

 

» 23 de março de 2021

A Corte de Apelação em Londres nega o recurso e extingue o caso. Advogados apontam que a decisão foi tomada fora dos argumentos apresentados, desconsidera precedentes e ainda traz risco de grave injustiça, sobretudo por fatos em andamento no Brasil, como possível suspeição da Justiça Federal, pedidos do MP para extinção da Renova e recuperação judicial da Samarco

 

» 4 de maio de 2021

Juiz da Corte de Apelação em Londres se julga suspeito e transfere petição ao vice-presidente da instituição, que reabre a análise em processo que deverá ser decidido em julho de 2021, com possível novo julgamento sobre recurso dos atingidos 

 

» 22 de junho de 2021

Análise do pedido de reabertura da apelação no processo dos atingidos contra a BHP Billiton, com possível novo julgamento sobre recurso dos atingidos  


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